Amor e Psiquê (do latim Amor et Psyche[1]), também referidos como Cupido e Psiquê (do latim Cupido et Psyche[1]) ou Eros e Psique, é um par que aparece como antigo motivo iconográfico e literário. Tornou-se um título comum para se referir ao conto presente em Metamorfoses (ou O Asno de Ouro) de Apuleio, a mais antiga versão literária sobrevivente sobre a história do casal, escrita no século II d.C. O conto trata da superação de obstáculos ao amor entre Psiquê (em grego clássico: Ψυχή, literalmente "Alma" ou "Sopro da Vida") e Cupido (em latim: Cupido, literalmente "Desejo") ou Amor (romanização do deus grego Eros, Ἔρως), e sua união final em um casamento sagrado.

Amor e Psiquê (c. ano 150), estátua helenística de um modelo original do século I a.C. ou d.C. Psiquê possui asas de borboleta.

Embora a única narrativa extensa da antiguidade seja a de Apuleio, Eros e Psiquê aparecem na arte grega já no século IV a.C. Os elementos neoplatônicos da história e as alusões às religiões de mistério acomodam múltiplas interpretações,[2] e foram analisadas como uma alegoria e à luz do folclore, conto de fadas e mito.[3] Além de influências greco-romanas, também são apontadas semelhanças com contos nativos berberes do Norte da África, onde Apuleio residia, e existem diversas hipóteses sobre as possíveis origens folclóricas da narrativa.

É uma das histórias de amor do mundo greco-romano mais populares na cultura ocidental, tendo sido grandemente influente nos dois milênios, interpretada e reelaborada em diversos meios, como a literatura, artes plásticas, música, cinema e psicologia. Foi principalmente a partir da Renascença que se difundiu por toda Europa,[4] mas desde a Antiguidade já era um motivo comum em algumas localidades mediterrâneas, em pinturas, joalheria e relevos funerários.

Panorama geral

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Antiguidade

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Psiquê sentada com um arco à sua frente, aludindo a Eros. Escaravelho etrusco (século V a.C.)[5]

Apesar de a história contada por Apuleio não ser sobrevivente em nenhuma fonte literária anterior, há a presença de cenas figurativas de Eros e Psiquê anteriores ao escritor, com algumas semelhanças e variações em relação ao conto. Por exemplo, há um papiro de Oxirrinco contemporâneo ou anterior a Apuleio que retrata Psiquê segurando uma tocha e reconhecendo Cupido por sua luz: isso difere do conto de Metamorfoses, em que Cupido é despertado pelo óleo de uma lamparina, e não pela chama de uma tocha. A iconografia de Psiquê segurando uma tocha aparece em uma terracota do Egito helenizado e em outras do Líbano, de c. do século III a.C.[6]

Há extensa produção figurativa unindo Eros e Psiquê no mundo grego, romano e etrusco desde pelo menos o século IV a.C.;[6] em algumas delas, Psiquê (que, além de "alma", também pode significar em grego "borboleta") é retratada com asas de borboleta.[5][6] O exemplo mais antigo de Psiquê com asas de borboleta aparece em um escaravelho etrusco do século V a.C., de influência grega, em que ao chão se encontra também um arco, em referência a Eros. O mais antigo exemplo em que aparece o casal é um escaravelho grego do século IV ou III a.C.[5] Esses intaglios podiam ser utilizados também para a magia de amor no mundo greco-romano.[5][7] Por exemplo, no papiro "Espada de Dardano", entre os Papiros Gregos Mágicos, são dadas as instruções para se gravar sobre uma pedra magnética o seguinte desenho:[5]

"Afrodite sentada sobre Psiquê / e com a mão esquerda segurando seus cabelos presos em cachos (...) e abaixo / Afrodite e Psiquê, grave Eros em pé na abóbada do céu, segurando uma tocha ardente e queimando Psiquê"

Também há associação entre psique e eros em um encantamento de outro papiro mágico.[5] Há evidência de que o próprio Apuleio incorporou em sua narrativa esses elementos mágicos eróticos já difundidos em gemas e papiros.[8]

Porém, a maioria dessas representações anteriores não possui nenhuma ligação com a história apuleiana. Nem há relação entre esta e os epigramas helenísticos que indicam a alma atormentada por Cupido, ou o Cupido acorrentado. Há, no entanto, um grupo de gemas itálicas, datando do final da República Romana ao Primério Império, que os historiadores da arte frequentemente associaram ao conto de Apuleio. Apesar da posição contrária, adotada por exemplo por Carl Schlam, de que as representações monumentais e outras de Eros e Psiquê seriam independentes, há novos debates sobre a possibilidade de que o conto já fora retratado anteriormente à versão de Apuleio.[6]

Antigos intaglios romanos. Acima, Cupido queimando uma borboleta (século I), e maltratando Psiquê. Abaixo, Psiquê prendendo Cupido, e queimando um inseto.
 
Conjunto que representa as tarefas realizadas por Psiquê. Gravura em gema romana (século III-II a.C.)

Em uma sardônica do século I a.C., há um conjunto em que figura uma menina em uma paisagem rochosa; uma formiga; um vaso para recolher água; uma águia; um bastão e cereais. Essa cena pode ser identificada com as provas e castigos a que Vênus submete Psiquê no conto de Apuleio, no qual todos esses elementos estão presentes, associados a testes distintos. Em outras representações do século I a.C. ao primeiro século, também se repetem detalhes de testes que Psiquê realizou. Nem sempre ela aparece com asas de borboleta, o que pode dificultar sua identificação. Há figuras em que ela aparece em sua representação helenística com asas de pássaro, por exemplo em um mosaico de Antioquia, ou então uma borboleta se encontra à frente de sua cabeça.[6]

 
Baixo-relevo de Amor puxando Psiquê, no Mitreu de Cápua (século II)

Em algumas gemas helenísticas do ciclo de Eros-Psiquê, ambas figuras também aparecem empunhando uma enxada de duas pontas, em um motivo frequentemente combinado com grilhões, indicando alguma versão do mito que não aparece na narrativa de Apuleio. Isso pode ser uma das evidências que atrela o mito ao simbolismo dos mistérios; há frequentes alusões dionisíacas na iconografia, por exemplo em uma gema em que o casal aparece junto com uma figura que segura um liknon de iniciação a Dioniso.[9] Também ocorre no Mitreu de Capua Vetere (século II) um relevo em mármore no qual Eros conduz Psiquê, segurando o braço dela e uma tocha. Há possíveis interpretações de sincretismo em que o deus do Amor está no lugar do deus Mitra ou atua como um guia que serve à ascensão da alma, conforme a tradição grega.[10] Não está claro se ele expressa uma busca mitraica pela salvação ou se era simplesmente um assunto que atraía um indivíduo por outros motivos. Psiquê é invocada com a "Providência" (Pronoia) no início da chamada Liturgia de Mitra.[11]

 
Sarcófago romano antigo com Amor e Psiquê segurando o retrato da falecida

É plausível também que um conjunto de gemas retrate o casamento místico de Cupido e Psiquê, imortalizado no final feliz do conto em Metamorfoses. Esse conjunto de evidência iconográfica sobre trechos da história de Cupido e Psiquê que apareceram posteriormente na versão de Apuleio permite concluir que as narrativas em torno do casal já circulavam por todo o mundo greco-romano desde pelo menos o período helenístico, e que Apuleio teria retomado e elaborado partes dessas tradições em sua fábula, enquanto há iconografia que retrate Cupido e Psiquê em narrativas que não se encontram na versão apuleiana.[6]

Na antiguidade tardia, a figura do casal Cupido e Psiquê era recorrente como motivo decorativo, em estatuaria e também em contextos funerários, com o significado alegórico de reunião da alma com o deus do Amor. Por exemplo em Roma e Óstia, é muito comum encontrar a imagem de Cupido e Psiquê em sarcófagos de crianças. Tumbas de adultos também eram decoradas com cenas da história.[12]

 
Trono de Boston, provavelmente uma cópia romana de uma escultura grega antiga, associado ao Trono Ludovisi.[13] Nela ao centro, verifica-se uma figura alada de Eros, que segurava uma balança encaixada à parte no conjunto. Acima de cada um dos pratos da balança, encontram-se duas figurinhas humanas, que são pesadas quanto à vida e morte.[14][15]

Uma outra associação entre Eros e psique, como conceito para alma, poderia ser encontrado na psicostasia grego: segundo Karl Kérenyi, em alguns relatos sobre a "balança das almas", a pesagem poderia determinar tanto o momento da morte, quanto o do nascimento e vida, envolvendo a disputa entre Queres. Em sua interpretação, "Quer" também significava originalmente alma e Eros poderia atuar como um Quer da vida, que determina o destino da alma antes do nascimento e rodeia o momento da concepção.[15]

Folclorística

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Há quem afirme que a narrativa de Apuleio dependa inteiramente de fontes literárias, ao invés de contos do folclore; ela sem dúvida teria inspirado o surgimento de contos folclóricos posteriores, por exemplo até mesmo contos de fada modernos.[16] Apuleio é devedor do gênero da fábula milésia e as referências literárias de suas obras estão principalmente relacionadas à cultura greco-latina.[17][18] Mas é igualmente certo que alguns elementos norte-africanos também podem ser encontrados, principalmente de histórias de Cabília e Líbia.[19][20][21][22][23] Assim, diversos estudiosos acadêmicos levantam a hipótese da utilização de antigos motivos folclóricos por Apuleio a partir de tradições orais,[16][24][25] com possíveis origens berberes.[19]

Os folcloristas perceberam a existência de centenas de variantes orais do conto na Europa, Oriente Próximo, Índia, América do Norte e Caribe, e alguns deles levantaram a hipótese da existência de um protótipo antigo comum, no qual Apuleio teria se inspirado.[26] O folclorista sueco Jan-Öjvind Swahn, que escreveu um longo estudo sobre a história, o filólogo alemão Ludwig Friedländer e o folclorista russo Vladimir Propp defenderam a ideia de que ela se originou de uma fonte folclórica legítima.[27][28][29]

 
Sarcófago da criação do homem por Prometeu (século IV), em Nápoles. Nessa cena central, o corpo do primeiro homem, criado por Prometeu, está estendido e inanimado. Psiquê, solicitada por dois Eros acima dele, lhe dará a vida.

Stith Thompson afirmou que ninguém sabe onde e quando o conto teria surgido,[26] mas sugeriu uma origem italiana.[30] Lesky, Gédeon Huet[31] e Georgios A. Megas indicaram uma origem grega.[32] Reitzenstein propôs uma origem oriental-helênica, em que Psiquê poderia ter sido originalmente uma deusa iraniana,[26] levada à Grécia através do Egito.[33][34] Kérenyi afirma não haver evidência disso em textos religiosos iranianos, mas não nega a proposta, embora considere mais possível a presença de elementos egípcios, como do mito de Ísis. Para Merkelbach, a raiz central da história seriam os mistérios de Ísis.[26] Graham Anderson defende uma reformulação do material mítico da Ásia Menor (nomeadamente, Hitita: o Mito de Telipinu).[35] Num estudo publicado postumamente, o folclorista romeno Petru Caraman também defendeu uma origem folclórica, mas tinha a noção de que Apuleio sobrepôs a mitologia greco-romana a um mito pré-cristão sobre um marido serpentino ou dracônico, ou um "Rei das Cobras" que se torna humano à noite.[36]

É possível identificar uma narrativa similar de Amor e Psiquê em alguns contos folclóricos do Norte da África. Há a proposta de que existia uma antiga fonte oral berbere para o conto, possivelmente escutada por Apuleio em sua infância em Madauros, onde teria tido contato com a cultura líbia. A primeira sugestão de uma origem oral berbere foi feita por Henri Basset em 1920. Essa se tornou uma hipótese séria com os estudos de Otto Weinreich e Émile Dermenghem, seguida atualmente pelos pesquisadores Nedjima e Emmanuel Plantade.[37][38] Por outro lado, nas pesquisas, ainda predomina muito a visão dura e cética de Detlev Fehling (1977), que endossa a exclusividade da invenção por Apuleio e diz que, pelo contrário, a história de Apuleio que teria influenciado o folclore oral.[37][39] É legítimo afirmar que Apuleio possa ter sido influenciado tanto por fontes literárias helenísticas, quanto por fontes orais populares.[37]

Jan-Öjvind Swahn considera que na classificação de motivos folclóricos o tipo que melhor corresponde à narrativa de Cupido e Psiquê é ATU 425 ("Animal como Noivo"). Contos bérberes que correspondem a esse tipo é "O Filho da Ogra", "Broto Dourado" e "O Pássaro do Ar", que se estendem até o Marrocos e tornam improvável uma influência a partir de Apuleio. Há mais evidência para afirmar que as versões bérberes são autônomas, trazendo motivos etnográficos característicos do Norte da África, não tendo incorporado motivos gregos importantes à narrativa de Apuleio, como a tentativa feita por Psiquê de assassinar seu marido. Os três contos seguem a seguinte estrutura:[37]

  • Inicia-se com um pai de uma jovem mulher, que busca dar-lhe um presente, ou recebe presentes mágicos de um ser sobrenatural.
  • O ser sobrenatural faz um pedido ao pai de que quer se casar com sua filha mais nova.
  • Esse marido visita a esposa de noite, no escuro ou sem se revelar.
  • A jovem mulher quebra o tabu e olha para o esposo com a luz de uma lanterna ou vela. Ele a repudia e vai embora, em algumas versões se transformando em um pássaro. A mulher passa a buscar o marido perdido, para trazê-lo de volta.
  • Ela o encontra na casa da mãe dele, uma ogra, que lhe dá tarefas para cumprir.
  • Ao final, a esposa é salva da casa da ogra, e o casal vive junto em um final feliz.

A semelhança entre as três, abarcando extensa área territorial, indica que são variantes de uma antiga tradição oral de um mesmo conto, que possui grande quantidade de motivos correspondentes à narrativa de Apuleio, porém dificilmente encontrados em contos gregos. Há semelhanças com o conto de Apuleio em diversos detalhes específicos, por exemplo na lista de cereais separados e no papel das formigas como auxiliares, o que é tipicamente um elemento do folclore líbio. Principalmente o conto "Broto Dourado" traz mais elementos correspondentes e arcaicos.[37]

Já a história de amor de Sfar-Lahoua-Loundja ou Seffar lhwa, do Marrocos, é estruturalmente distinta, porém relacionada a esses três contos, apresentando motivos semelhantes ao conto de Apuleio.[37][40] Há, com isso, a hipótese de que ela é também uma possível raiz.[40]

Houve possível incorporação da história de Cupido e Psiquê também em duas fábulas náuatles, registradas no início do século XX pelo folclorista Pablo González Casanova. Isso pode ter ocorrido desde as primeiras interações entre missionários espanhóis e estudantes nativos no século XVI.[19]

Versão apuleiana

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Psiquê Revivida pelo Beijo do Amor (1788-1793), por Antonio Canova

O conto de Cupido e Psiquê (ou "Eros e Psique") está situado no ponto médio do romance de Apuleio e corresponde a cerca de um quinto de sua extensão total,[41] ocupando o final do livro IV, o livro V inteiro e a maior parte do livro VI.[16] Ele é o maior e mais famoso entre aqueles inseridos na narrativa de Metamorfoses, trazendo paralelos com a história do personagem principal da obra, Lúcio. Na trama, ele é narrado por uma velha mulher sem nome como uma ficção, com intuito de distrair o herói e uma jovem chamada Cárite, que se encontram prisioneiros.[16]

Como um espelho estrutural do enredo geral, o conto é um exemplo de mise en abyme. Ela ocorre dentro de um quadro narrativo complexo, com Lúcio contando a história como ela foi contada por uma velha para Cárite, uma noiva sequestrada por piratas no dia de seu casamento e mantida em cativeiro em uma caverna. O final feliz para Psiquê supostamente ameniza o medo de estupro de Cárite, em um dos vários exemplos da ironia de Apuleio.[42][43] A história de Psiquê tem algumas semelhanças com as peripécias sofridas por Lúcio, incluindo o tema da curiosidade perigosa, punições e testes, e redenção através do favor divino.[44]

Há discordância entre os estudiosos sobre qual seria o gênero literário da história: se um conto de fadas, um mito, uma lenda, alegoria ou uma combinação dessas formas.[26]

Fontes literárias

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O conjunto da fábula, conforme aparece em Metamorfoses, é geralmente considerado uma criação de Apuleio, porém há evidências iconográficas anteriores de uma versão anterior da história. Talvez Aristofonte de Atenas, mencionado por Fulgêncio, tenha sido um escritor anterior a Apuleio que escrevera um extenso relato do conto. Há diversos antecedentes e modelos literários nos quais Apuleio pode também ter se inspirado. A catábase de Psiquê é bastante similar à jornada de Eneias na Eneida de Virgílio, e as tribulações dela também evocam os Trabalhos de Hércules e As Argonáuticas.[16]

 
O "Barco de Psiquês", em que Eros veleja sobre as asas de duas Psiquês. Mural do século III de Antioquia.[45]

A história de Apuleio é frequentemente vinculada à filosofia platônica, adotada pelo escritor. Alguns apontaram que a passagem em que Psiquê agarra o pé de Cupido e se eleva às nuvens, conforme ele voa, espelharia a descrição da alma alada, que pode subir ou descer, no Fedro 248c; ou que há referência ao Banquete de Platão, no qual se afirma que o verdadeiro objeto do Amor é a alma, não o corpo, o que permite a elevação ao divino.[16] O Cupido, na narrativa, representa também um papel de psicopompo, também atribuído ao Eros platônico como um daimon, o que era um tema importante ao médio platonismo adotado por Apuleio.[46] Essas possíveis intertextualidades serviram de justificativa à alegorese filosófica da narrativa. No entanto, existem notórias diferenças e há autores como Stephen Harrison e Regine May que defendem não haver um simbolismo alegórico profundo em Apuleio.[16] Embora o conto resista à explicação como uma alegoria estrita de um argumento platônico particular, Apuleio baseou-se geralmente em imagens como a laboriosa ascensão da alma alada e a união com o divino alcançada pela Alma por meio da agência de Eros, conforme os diálogos filosóficos.[47]

Uma outra possível intertextualidade é com o diálogo platônico Górgias, no qual se afirma que as almas de filósofos que se dedicaram ao autocultivo e que não foram curiosos com o terreno chegariam a um pós-vida abençoado. O arco da narrativa de Apuleio traz momentos em que a curiosidade de Psiquê é punida, até o final em que há uma expiação. Há também um interesse pelo pós-vida no conto de Apuleio, e ambas narrativas aparecem em Platão e Apuleio afirmadas como belas fábulas e como um topos contado por velhas esposas.[46]

Recepção após Apuleio

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Psiquê prestes a roubar a aljava de flechas de Cupido enquanto ele dorme. Mural do século III da Casa do Concurso de Bebida, Antioquia

A obra de Apuleio continuou conhecida no Norte da África, sua terra natal, até pelo menos o final do século V. Agostinho de Hipona menciona as Metamorfoses. Marciano Capela e Fulgêncio, o Mitógrafo, relatam alegorias do conto de Cupido e Psiquê.[48]

A descrição do interior do palácio do Cupido feita por Apuleio teve influência sobre a Idade Média inicial em epitalâmios e foi incorporada no meio cristão, por exemplo a partir da adoção por Prudêncio em sua Psicomaquia. Nesse poema, o palácio do Amor tornou-se equivalente ao templo da Sabedoria. Possivelmente esse conto pode ter sido uma das fontes imagéticas para visões místicas do interior de mansões celestiais, como a de Santa Aldegunda de Maubeuge. Na antiguidade tardia, havia diversas interpretações alegóricas sobre o conto de Apuleio, tanto filosóficas quanto religiosas, conforme aponta por exemplo o mitógrafo cristão do século V Fulgêncio. Ele desaprovava as explicações filosóficas elaboradas, mas por sua vez realizou uma interpretação cristã, em que Psiquê representaria Adão, que não reconhecia a própria nudez e comeu da árvore da cobiça.[49]

Após esses autores, a obra de Apuleio passa por um quase esquecimento durante alguns séculos: há evidência somente de que havia acesso à obra no século VII ou VIII na Espanha, provavelmente a partir de alguma biblioteca monástica. A divulgação da obra irá ressurgir com a cópia do manuscrito F durante o século XI.[48]

No Império Bizantino, esculturas de Eros podiam ser encontradas até o século XII em prédios públicos, e o rei poderia ser representado segurando um arco, flechas e fogo, indicando a tocha com a qual Psiquê descobriu o deus do Amor. Na literatura da corte, também se retrata Cupido tornando-se vítima do amor ao ser picado com as próprias flechas, o que indica a preservação da memória do conto de Apuleio no Oriente.[49]

A próxima grande influência na recepção europeia da história foi a recontagem feita por Giovanni Boccaccio na Genealogia dos Deuses dos Pagãos (1360-1374), segundo uma cópia que ele fez do manuscrito de Metamorfoses após suas redescoberta em Florença.[4] Bocaccio reconta a história como uma interpretação moral cristã, em que o casamento se refere à união da alma com Deus.[48] A fábula de Griselda, no Decamerão, também é uma reescrita de Cupido e Psiquê, o que Petrarca também notara.[50] Petrarca também se inspira em imagens do conto apuleiano em alguns sonetos e no seu Liber sine nomine.[51]

 
Psiquê Recebida no Olimpo (1517), por Rafael, na Loggia di Amore e Psiche da Villa Farnesina

Depois, o conto integral foi impresso por Pannartz e Sweynheim para o editor Giovanni Andrea Bussi em 1469, o que tornou Cupido e Psiquê um texto importante na Renascença.[4] A partir dessa editio princeps, a recepção de Cupido e Psiquê na tradição clássica tem sido extensa. A história foi recontada em poesia, drama e ópera, e amplamente retratada em pinturas, esculturas e até mesmo em papéis de parede.[52][16] Ela recebeu diversas traduções em línguas vernáculas ao longo do século XVI.[4]

Ao final do século XV, era uma das obras lidas pelos humanistas de Ferrara.[53] A história lá começou a circular anonimamente pela corte de Isabel d'Este.[54] Outras obras influentes nesse período foram a Hypnerotomachia Poliphili, que contém passagens referentes ao conto, além das traduções de Boiardo e Firenzuola, e paráfrases poéticas e peças de teatro. O tema também se tornou moda em pinturas, por exemplo nas de Rafael e Giulio Romano,[53] com conotações neoplatônicas.[55]

Foi no século XVII que a história se tornou amplamente difundida, desde peças de teatro a outras formas literárias.[4]

Uma curta adaptação aparece no Faerie Queene (1590) de Edmund Spenser, dentre outros livros.[4] Os estudos literários modernos consideram Psiquê e suas irmãs como provável modelo às três irmãs no Rei Lear de Shakespeare.[56] Um importante marco foi a publicação de Os Amores de Psiquê e Cupido (1669) de La Fontaine. Ela impactou sobre o desenvolvimento moderno dos contos de fada, e também nas artes visuais e na música, por exemplo a partir de Lully.[4] A peça de Molière Psyché (1671) surgiu desse contexto.[4][57]

 
The Night of Enitharmon's Joy (1795), de William Blake, pode estar implicitamente retratando, além da Hécate tripla, a figura de Eros e Psiquê atrás de Enitharmon, junto a animais que remetem à obra Metamorfoses. Blake prezava a obra de Apuleio e também fizera uma gravura do casal do conto.[58]

O romantismo foi outro grande foco difusor, em que a história de amor servia também à contemplação da condição humana, bem como ao interesse na filosofia platônica e nos contos de fada. Durante o século XVIII e XIX, traduções em diversas línguas modernas se espalharam. Continua clássica a tradução de August von Rode, e a versão de Thomas Taylor serviu para tornar o platonismo acessível. Kierkegaard também se inspirou no conto em algumas de suas reflexões existencialistas.[4]

Os poetas românticos acessavam a personagem e o conceito de Psiquê sob o prisma do platonismo. Entre os poemas que a abordam, são notórios aqueles de Christoph Martin Wieland, Hudson Gurney, Mary Tighe e John Keats, que publicou Ode a Psiquê em 1819.[4]

 
Cupido Encontrando Psique Dormindo pela Fonte, por Edward Burne-Jones. Versão em mural do Palace Green.

No gênero de romance, que se popularizou também a partir do século XIX, a história serviu de inspiração a diversas obras. Um exemplo inicial se encontra em Psyche Cretica (1685) de Johann Ludwig Prasch, que enquadra sutilmente a alegoria da alma no contexto do protestantismo germânico. Depois, Walter Scott, o primeiro grande romancista histórico, utiliza o conto na trama de pelo menos um de seus romances. O modelo do conto de Apuleio aparece em Edward Bulwer-Lytton, William Makepeace Thackeray e Walter Pater. Adaptações poéticas do conto são compostas por Elizabeth Barrett Browning, William Morris, Robert Seymour Bridges.[4] Na era vitoriana, há também aumento de interesse pictórico, e é notório o conjunto de gravuras feitas à publicação de William Morris por Edward Burne-Jones, que produziu mais de 200 imagens da história.[4]

Uma importante releitura do mito foi feita em 1956 por C. S. Lewis. Também foi importante à narrativa de The Reivers (1962), por William Faulkner.[4] A história é adaptada com caracterizações feministas e para a análise do amor feminino na modernidade em Charlotte Mary Yonge, Sylvia Townsend Warner e Sylvia Plath, esta última se caracterizando como uma recepção feminista.[4] Atualmente, ela se difundiu em outras mídias, popularizada em livros infantis, filmes e na Internet.[4]

História (versão de Apuleio)

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Era uma vez um rei e uma rainha, governantes de uma cidade sem nome, que tinham três filhas de notável beleza. A mais jovem e bela era Psiquê, cujos admiradores, negligenciando a adoração adequada a Afrodite (deusa do amor, Vênus), rezavam e faziam oferendas a ela. Corria o boato de que ela era a segunda vinda de Vênus, ou filha de Vênus de uma união indecorosa entre a deusa e um mortal. Vênus fica ofendida e encarrega Cupido de se vingar. Cupido é enviado para atirar uma flecha em Psique para que ela se apaixone por algo hediondo. Em vez disso, ele se arranha com seu próprio dardo, que faz com que qualquer ser vivo se apaixone pela primeira coisa que vê. Consequentemente, ele se apaixona profundamente por Psiquê e desobedece à ordem de sua mãe.[59]

Embora suas duas irmãs humanamente lindas tenham se casado, a idolatrada Psique ainda não encontrou o amor. Seu pai suspeita que eles tenham incorrido na ira dos deuses e consulta o oráculo de Apolo. A resposta é inquietante: o rei não deve esperar um genro humano, mas sim uma criatura semelhante a um dragão que assedia o mundo com fogo e ferro e é temida até por Júpiter e pelos habitantes do submundo.[59]

Psiquê é vestida em trajes funerários, transportada em procissão até o topo de um penhasco rochoso e exposta. O casamento e a morte fundem-se num único rito de passagem, uma “transição para o desconhecido”.[60] Zéfiro, o Vento Oeste, carrega-a para encontrar seu par predestinado e a deposita em um lindo prado (locus amoenus), onde ela prontamente adormece.[59]

A menina transportada acorda e se encontra na beira de um bosque cultivado (lucus). Explorando, ela encontra uma casa maravilhosa com colunas douradas, um teto esculpido em madeira cítrica e marfim, paredes prateadas com relevos de animais selvagens e domesticados e pisos de mosaico com joias. Uma voz desencarnada diz para ela ficar confortável, e ela se diverte com um banquete que se serve sozinho e cantando para uma lira invisível.[59]

Embora temerosa e sem a devida experiência, ela se deixa guiar até um quarto onde, na escuridão, um ser que ela não vê faz sexo com ela. Ela gradualmente aprende a esperar ansiosamente por suas visitas, embora ele sempre vá embora antes do nascer do sol e a proíba de vê-lo. Logo ela engravida.[59]

Violação de confiança

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A família de Psiquê anseia por notícias dela e, depois de muita insistência, Cupido, ainda desconhecido de sua noiva, permite que Zéfiro leve suas irmãs para uma visita. Ao verem o esplendor em que Psiquê vive, eles ficam com inveja e minam sua felicidade, incitando-a a descobrir a verdadeira identidade de seu marido, pois certamente, como predito pelo oráculo, ela estava deitada com a vil serpente alada, que a devoraria, junto com seu filho.[59]

 
Psique Mostrando suas Joias para suas Irmãs ( Neoclássico, 1815–16), papel de parede com grisaille de Merry-Joseph Blondel

Uma noite, depois que Cupido adormece, Psiquê executa o plano que suas irmãs elaboraram: ela pega uma adaga e uma lâmpada que havia escondido no quarto, para ver e matar o monstro. Mas quando a luz revela a criatura mais linda que ela já viu, ela fica tão assustada que se fere em uma das flechas da aljava descartada de Cupido. Tomada por uma paixão febril, ela derrama óleo quente da lamparina e o acorda. Ele foge e, embora ela tente persegui-lo, ele voa para longe e a deixa na margem de um rio.[59]

Lá ela é descoberta pelo deus do deserto , que reconhece os sinais de paixão nela. Ela reconhece sua divindade (numen) e então começa a vagar pela terra em busca de seu amor perdido.[59]

 
Amore e Psiche (1707–09) de Giuseppe Crespi: O uso da lâmpada por Psique para ver o deus é às vezes considerado um reflexo da prática mágica da licnomancia, uma forma de adivinhação ou conjuração de espíritos.[61]

Psiquê visita primeiro uma irmã, depois a outra; ambas são tomadas por uma inveja renovada ao descobrir a identidade do marido secreto de Psiquê. Cada irmã tenta se oferecer como substituta escalando o penhasco rochoso e se lançando sobre Zéfiro para se transportar, mas, em vez disso, acabam caindo e morrendo brutalmente.[59]

Andanças e provações

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No decorrer de suas andanças, Psiquê chega a um templo de Ceres e lá dentro encontra uma desordem de oferendas de grãos, guirlandas e implementos agrícolas. Reconhecendo que o cultivo adequado dos deuses não deveria ser negligenciado, ela coloca tudo em ordem, provocando uma teofania da própria Ceres. Embora Psiquê reze por sua ajuda, e Ceres reconheça que ela a merece, a deusa é proibida de ajudá-la contra outra deusa. Um incidente semelhante ocorre no templo de Juno. Psiquê percebe que ela mesma deve servir Vênus.[59]

Vênus se deleita em ter a garota sob seu poder e entrega Psiquê às suas duas servas, Preocupação e Tristeza, para ser chicoteada e torturada. Vênus rasga suas roupas, bate sua cabeça no chão e zomba dela por conceber uma criança em um casamento falso. A deusa então joga diante dela um grande amontoado de trigo, cevada, semente de papoula, grão-de-bico, lentilhas e feijões misturados, exigindo que ela os separe até o amanhecer. Mas quando Vênus se retira para comparecer a uma festa de casamento, uma formiga gentil tem pena de Psiquê e reúne uma frota de insetos para realizar a tarefa. Vênus fica furiosa ao retornar bêbada do banquete e apenas joga um pedaço de pão para Psique. Neste ponto da história, é revelado que Cupido também está na casa de Vênus, sofrendo devido ao seu ferimento.[59]

 
A Segunda Tarefa de Psiquê (Maneirista, 1526-1528) por Giulio Romano, do Palazzo del Tè

Ao amanhecer, Vênus define uma segunda tarefa para Psiquê. Ela deve atravessar um rio e buscar lã dourada de ovelhas violentas que pastam do outro lado. Essas ovelhas são identificadas em outro lugar como pertencentes a Helios.[62] A única intenção de Psiquê é se afogar no caminho, mas em vez disso ela é salva por instruções de um junco divinamente inspirado, do tipo usado para fazer instrumentos musicais, e reúne a lã presa em sarças.[59]

Para a terceira tarefa de Psiquê, ela recebe um recipiente de cristal para coletar a água negra expelida pela fonte dos rios Estige e Cócito. Ao escalar o penhasco de onde ele sai, ela se sente intimidada pelo ar ameaçador do lugar e pelos dragões serpenteando pelas rochas, e cai em desespero. O próprio Júpiter tem pena dela e envia sua águia para lutar contra os dragões e recuperar a água para ela.[59]

Psiquê e o submundo

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O último teste que Vênus impõe a Psiquê é uma jornada ao submundo. Ela deve pegar uma caixa (pyxis) e obter nela uma dose da beleza de Prosérpina, rainha do submundo. Vênus afirma que sua própria beleza desapareceu por cuidar de seu filho doente, e ela precisa desse remédio para ir ao teatro dos deuses (theatrum deorum).[59]

 
Psyché aux enfers (1865) de Eugène Ernest Hillemacher: Caronte rema Psiquê passando por um homem morto na água e pelas velhas tecelãs na margem

Mais uma vez desesperada com sua tarefa, Psiquê sobe em uma torre, planejando se jogar de lá. A torre, no entanto, de repente começa a falar e a aconselha a viajar para Lacedemônia, na Grécia, e procurar o lugar chamado Tenaro, onde ela encontrará a entrada para o submundo. A torre oferece instruções para navegar no submundo:[59]

"A via aérea de Dis lá está, e através dos portões abertos a rota sem caminho é revelada. Ao cruzar o limiar, tu te comprometes a seguir o curso inabalável que te levará até a Régia de Orco. Mas não deves ir de mãos vazias pelas sombras além deste ponto, mas sim carregar bolos de cevada com mel em ambas as mãos,[63] e transportar duas moedas em tua boca."

A torre falante a avisa para manter silêncio enquanto ela passa por várias figuras ameaçadoras: um homem coxo conduzindo uma mula carregada de gravetos, um homem morto nadando no rio que separa o mundo dos vivos do mundo dos mortos, e velhas mulheres tecendo. A torre avisa que eles tentarão distraí-la implorando por sua ajuda: ela deve ignorá-los. Os bolos são guloseimas para distrair Cérbero, o cão de guarda de três cabeças de Orco, e as duas moedas para Caronte, o barqueiro, para que ela possa fazer uma viagem de volta.[59]

Tudo acontece conforme o planejado, e Prosérpina atende ao humilde pedido de Psiquê. No entanto, assim que reencontra a luz do dia, Psiquê é tomada por uma curiosidade ousada e não consegue resistir a abrir a caixa na esperança de realçar sua própria beleza. Ela não encontra nada lá dentro, exceto um "sono infernal e estigiano", que a envia a um torpor profundo e imóvel.[59]

Reencontro e amor imortal

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O Rapto de Psiquê, de William-Adolphe Bouguereau, 1895.

Enquanto isso, o ferimento de Cupido cicatriza e ele escapa da casa de sua mãe voando pela janela. Quando ele encontra Psiquê, ele tira o sono do rosto dela e o recoloca na caixa, então a espeta com uma flecha que não causa dano. Ele a levanta no ar e a leva para entregar a caixa a Vênus.[59]

Ele então leva seu caso a Zeus, que dá seu consentimento em troca da ajuda futura de Cupido sempre que uma donzela escolhida chama sua atenção. Zeus faz com que Hermes convoque uma assembleia dos deuses no teatro do céu, onde ele faz uma declaração pública de aprovação, avisa Vênus para recuar e dá a Psiquê ambrosia, a bebida da imortalidade,[64] para que o casal possa se unir em casamento como iguais. A união deles, diz ele, redimirá Cupido de sua história de provocar adultério e relações sórdidas.[65] A palavra de Zeus é solenemente celebrada com um banquete de casamento.[59]

Com seu casamento feliz e resolução de conflitos, o conto termina à maneira da comédia clássica[66] ou dos romances gregos como Dáfnis e Cloé.[67] O filho que nascerá do casal será Voluptas (grego Hedonê, ‘Ηδονή), "Prazer".[59]

O Casamento de Cupido e Psiquê

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O Banquete de Casamento de Cupido e Psique (1517) de Rafael e sua oficina, da Loggia di Psiche, Villa Farnesina

A assembleia dos deuses tem sido um tema popular tanto nas artes visuais quanto nas cênicas, sendo o banquete de casamento de Cupido e Psiquê uma ocasião particularmente rica. Com o casamento de Peleu e Tétis, este é o cenário mais comum para uma cena de "Festim dos Deuses" na arte. Apuleio descreve a cena em termos de um jantar festivo romano (cena). Cupido, agora marido, reclina-se no lugar de honra (o sofá "de cima") e abraça Psiquê em seu colo. Zeus e Hera se situam da mesma forma, e todos os outros deuses estão dispostos em ordem. O copeiro de Júpiter (outro nome romano de Zeus) serve-lhe néctar, o "vinho dos deuses"; Apuleio se refere ao copeiro apenas como ille rusticus puer, "aquele rapaz do campo", e não como Ganímedes. Liber, o deus romano do vinho, serve o resto da companhia. Vulcano, o deus do fogo, cozinha a comida; as Horas ("Estações" ou "Horas") adornam, ou mais literalmente "empurpuram" tudo com rosas e outras flores; as Graças impregnam o ambiente com o aroma do bálsamo, e as Musas com cantos melódicos. Apolo canta com sua lira, e Vênus assume o papel principal na dança do casamento, com as Musas como suas coristas, um sátiro tocando o aulos (tíbia em latim) e um jovem se expressando através da flauta de Pã (fistula).[59]

O casamento fornece um encerramento para a estrutura narrativa, bem como para a história de amor: os prazeres misteriosamente proporcionados que Psiquê desfrutou na domus de Cupido no início de sua odisseia, quando ela entrou em um falso casamento precedido por ritos fúnebres, são reinventados no salão dos deuses seguindo o procedimento ritual correto para um casamento real.[68] A disposição dos deuses na sua ordem adequada (in ordinem) evocaria para o público romano a cerimônia religiosa do lectisternium, um banquete público realizado para as principais divindades na forma de estátuas dispostas em sofás luxuosos, como se estivessem presentes e a participar na refeição.[69]

 
O casamento de Cupido e Psique (c. 1773), peça de jaspe da Wedgwood baseada na gema de Marlborough do século I, que provavelmente tinha a intenção de representar um rito de iniciação (Museu do Brooklyn)

O banquete de casamento era um tema favorito para a arte renascentista. Já em 1497, Giovanni Sabadino degli Arienti fez do banquete o centro de sua descrição de um ciclo de Cupido e Psiquê, agora perdido, na Villa Belriguardo, perto de Ferrara . Na Villa Farnesina em Roma, é uma das duas cenas principais para a Loggia di Psiche (ca. 1518) de Rafael e sua oficina, bem como para a Stanza di Psiche (1545–46) de Perino del Vaga no Castel Sant' Angelo. Hendrick Goltzius introduziu o assunto no norte da Europa com sua "enorme" gravura chamada O Casamento de Cupido e Psiquê (1587,43 por 85,4 cm),[70] que influenciou a forma como outros artistas do norte retratavam as assembleias dos deuses em geral.[71] A gravura, por sua vez, foi retirada do desenho de Bartholomaeus Spranger de 1585 com o mesmo título, considerado um "locus classicus do maneirismo holandês" e discutido por Karel Van Mander por sua composição exemplar envolvendo inúmeras figuras.[72]

No século XVIII, O Casamento de Cupido e Psiquê (1744), de François Boucher, afirmou os ideais do Iluminismo com a figura de autoridade Júpiter presidindo um casamento de iguais adoráveis. A pintura reflete o gosto rococó por pastéis, delicadeza fluida e cenários amorosos infundidos de juventude e beleza.[73]

Como alegoria

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Psiquê no bosque do cupido, ilustração de 1345 das Metamorfoses, Biblioteca Apostolica Vaticana[74]

A história de Cupido e Psiquê foi prontamente alegorizada. Na antiguidade tardia, Marciano Capela (século V) remodelou-o como uma alegoria sobre a queda da alma humana.[75] Marciano elabora uma outra narrativa alegórica em que ambas personagens aparece, em As Núpcias de Filologia e Mercúrio, na qual Psiquê é considerada por Mercúrio como uma candidata ao casamento, porém ela está aprisionada pelo Cupido.[48] Para Apuleio, a imortalidade é concedida à alma de Psiquê como recompensa pelo comprometimento com o amor sexual. Na versão de Marciano, o amor sexual atrai Psiquê para o mundo material sujeito à morte:[76] "Cupido tira Psiquê da Virtude e a acorrenta em correntes adamantinas".[77]

O conto, portanto, prestou-se à adaptação em um contexto cristão ou místico, muitas vezes como símbolo da alma.[78] No texto gnóstico Sobre a Origem do Mundo, a primeira rosa é criada a partir do sangue de Psiquê quando ela perde a virgindade com Cupido.[79] Para o mitógrafo cristão Fulgêncio (século VI), Psiquê era uma figura de Adão, movida pela curiosidade pecaminosa e pela luxúria do paraíso do domínio do Amor.[80] As irmãs de Psiquê são Carne e Livre Arbítrio, e seus pais são Deus e Matéria.[81] Para Boccaccio (século XIV), o casamento de Cupido e Psiquê simbolizava a união da alma e de Deus.[80]

Psicologia

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Eros e Psiquê por Gustav Vigeland

Na psicologia científica desde o início do século XX, o conto serviu também a diversas interpretações e análises, sob as perspectivas freudiana e junguiana. Ao lado da história de Édipo, talvez tenha sido o conto mais estudado na psicologia profunda. Surpreende que Freud tenha dado pouca atenção a ele, fazendo apenas breves comentários em O Tema dos Três Escrínios (1913), em que afirma que Psiquê representava a morte; enquanto, por outro lado, era evidente seu grande interesse pelas pulsões de Eros e Tânatos e pelo deus Eros, do qual tinha várias estátuas em sua coleção. Esse vácuo levou a tentativas de elaboração da história de Apuleio por psicólogos sucessores. Os classicistas tendem a priorizar a filologia e desconsiderar leituras psicológicas sobre o conto, considerando-as reducionistas e separadas do contexto literário original; porém abordagens sobre esses outros estratos estão recebendo mais atenção nos estudos literários.[82]

Os freudianos focam no sonho de Psiquê como produto de ansiedades sexuais da adolescência, dando várias interpretações diferentes. Já os junguianos em geral afirmam que Cupido e Psiquê representa o desenvolvimento psicológico, principalmente das mulheres, e também, segundo algumas opiniões, o desenvolvimento do feminino inconsciente, a anima.[82]

Franz Riklin, em Realização de Desejos e Contos de Fadas (1908), que escreveu quando ainda era freudiano, interpretou como realização de desejos de Psiquê, representando uma pessoa psicótica;[4][82] pode haver, de fato, algumas sugestões feitas por Apuleio de que Psiquê estaria passando por alguma loucura.[82] As outras interpretações freudianas em geral, feitas por J. Schroeder (1917), Jacques Barchilon (1959), Bruno Bettelheim (1975) e Fritz Hoevels (1979), consideram a história um retrato do desenvolvimento psicossexual, em que Eros representaria a libido e as fantasias da personagem estariam relacionadas ao complexo edípico.[26]

Em geral, há concordância de que a posição central do conto, dentro do conto total sobre Lúcio em Metamorfoses, simboliza o motivo de transformação psicológica e espiritual do personagem.[26]

A interpretação de Erich Neumann em Amor e Psiquê (1956) foi inaugural à análise do conto na vertente junguiana.[26] Para Neumann, a história de Psiquê é interpretada como "o desenvolvimento psíquico do feminino".[80] Neumann justifica a abordagem separatista de interpretação psicológica, afirmando que o conto não foi criado por Apuleio, mas que se originaria da Creta Minoana; porém essa visão não tem suporte dos estudos clássicos.[82] Em seguida surgiram as interpretações junguianas por Marie Louise von Franz (1970), Ann Ulanov (1971), James Hillman (1972), Robert Johnson (1976) e Jean Houston (1987). A maioria deles abre a possibilidade de um sentido espiritual da história e, dentre todos, apenas von Franz trata o mito no contexto da obra de Apuleio. Von Franz considera Eros como símbolo do arquétipo do Self, que promove a individuação.[26] Para Neumann e von Franz, o conto representa a tensão entre o humano e o divino (ou arquetípico).[83]

Visto em termos de psicologia e não de alegoria, o conto de Cupido e Psique pode mostrar também como “uma pessoa mutável … amadurece dentro das construções sociais da família e do casamento”.[84]

Amor e Psiquê foi analisado de uma perspectiva feminista como um paradigma de como a unidade de gênero das mulheres é desintegrada pela rivalidade e inveja, substituindo os laços de irmandade por um ideal de amor heterossexual.[85] Este tema foi explorado em Psyche's Sisters: Reimagining the Meaning of Sisterhood (1988) por Christine Downing, que usa o mito como um meio para a psicologia.[86]

Tradição clássica

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O romance de Apuleio estava entre os textos antigos que fizeram a transição crucial do formato de rolo para o formato de códice quando foi editado no final do século IV. Era conhecido por escritores latinos como Agostinho de Hipona, Macróbio, Sidônio Apolinário, Marciano Capela e Fulgêncio, mas no final do século VI caiu na obscuridade e sobreviveu ao que antes era conhecido como "Idade das Trevas " por meio de talvez um único manuscrito.[87] As Metamorfoses permaneceram desconhecidas no século XIII,[88] mas cópias começaram a circular em meados de 1300 entre os primeiros humanistas de Florença.[89] O texto e a interpretação de Cupido e Psiquê de Boccaccio em sua Genealogia deorum gentilium (escrita na década de 1370 e publicada em 1472) foram um grande impulso para a recepção do conto no Renascimento italiano e para sua disseminação por toda a Europa.[90]

Uma das imagens mais populares do conto foi a descoberta de Psiquê de um Cupido nu dormindo, encontrada em cerâmicas, vitrais e afrescos. Os pintores maneiristas foram intensamente atraídos pela cena.[91] Na Inglaterra, o tema Cupido e Psique teve seu "período mais brilhante" de 1566 a 1635, começando com a primeira tradução inglesa de William Adlington. Um ciclo de afrescos para Hill Hall, Essex, foi modelado indiretamente conforme o da Villa Farnesina por volta de 1570,[92] e a mascarada Love's Mistress de Thomas Heywood dramatizou o conto para celebrar o casamento de Carlos I e Henrietta Maria, que mais tarde teve seu salão decorado com um ciclo de 22 pinturas de Cupido e Psiquê de Jacob Jordaens. O ciclo tomou a divinização de Psiquê como peça central do teto e foi um veículo para o neoplatonismo que a rainha trouxe consigo da França.[93] O Cupido e Psiquê produzido por Orazio Gentileschi para o casal real mostra uma Psiquê completamente vestida cujo interesse atraente é psicológico, enquanto Cupido está quase todo nu.[94]

 
Orazio Gentileschi expôs a vulnerabilidade erótica da figura masculina em seu Cupido e Psiquê (1628-30)

Outro pico de interesse em Cupido e Psiquê ocorreu em Paris no final da década de 1790 e início de 1800, refletido na proliferação de ópera, balé, arte de salão, edições de livros de luxo, decoração de interiores, como relógios e painéis de parede, e até mesmo penteados. Após a Revolução Francesa, o mito tornou-se um veículo para a remodelação do eu.[95] Nos círculos intelectuais e artísticos ingleses, na virada dos séculos XVIII e XIX, a moda de Cupido e Psiquê acompanhava o fascínio pelas antigas religiões de mistério. Ao escrever sobre o Vaso de Portland, que foi obtido pelo Museu Britânico por volta de 1810, Erasmus Darwin especulou que o mito de Cupido e Psiquê fazia parte do ciclo de Elêusis. Com seu interesse pela filosofia natural, Darwin viu a borboleta como um emblema adequado da alma porque ela começava como uma lagarta terrestre, "morria" no estágio de pupa e então ressuscitava como uma bela criatura alada.[96]

Literatura

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Em 1491, o poeta Niccolò da Correggio recontou a história com Cupido como narrador. John Milton faz alusão à história na conclusão de Comus (1634), atribuindo não um, mas dois filhos ao casal: Youth e Joy. Shackerley Marmion escreveu uma versão em verso chamada Cupid and Psyche (1637), e La Fontaine adaptou a história em um romance misto de prosa e verso chamado Les Amours de Psiché et de Cupidon (Os Amores de Cupido e Psiquê; 1669).[97]

A mitologia de William Blake baseia-se em elementos do conto, particularmente nas figuras de Luvah e Vala. Luvah assume os vários disfarces do Cupido de Apuleio: belo e alado; voz desencarnada; e serpente. Blake, que menciona sua admiração por Apuleio em suas notas, combina o mito com a busca espiritual expressa através do erotismo do Cântico dos Cânticos, com Salomão e a Sulamita como um casal paralelo.[98]

 
Amor e Psiquê (1817) de Jacques-Louis David : a escolha do momento narrativo — um adolescente libertino, Cupido, que sai da cama de Psiquê com "alegria maligna"[99]—foi uma nova reviravolta no assunto desgastado[100]

Mary Tighe publicou seu poema Psique em 1805. Ela acrescentou alguns detalhes à história, como colocar duas fontes no jardim de Vênus, uma com água doce e outra com água amarga. Quando Cupido começa a obedecer ao comando de sua mãe, ele leva um pouco de ambos para uma Psiquê adormecida, mas coloca apenas a água amarga nos lábios de Psiquê. A Vênus de Tighe só pede uma tarefa a Psiquê: trazer-lhe a água proibida, mas ao executar essa tarefa, Psique vagueia por um país que faz fronteira com A Rainha das Fadas de Spenser, enquanto Psiquê é auxiliada por um misterioso cavaleiro de viseira e seu escudeiro Constance, e deve escapar de várias armadilhas preparadas por Vaidade, Bajulação, Ambição, Credulidade, Disfida (que vive em um "castelo gótico"), Varia e Geloso. A Besta Flagrante de Spenser também faz uma aparição. A obra de Tighe influenciou a poesia lírica inglesa sobre o tema, como a Ode a Psiquê (1820) de John Keats.[101] O poema Cupido e Psique (1826) de Letitia Elizabeth Landon ilustra uma gravura de uma pintura de W. E. West.

William Morris recontou a história de Cupido e Psique em versos em The Earthly Paradise (1868–70), e um capítulo de Marius the Epicurean (1885), de Walter Pater, foi uma tradução em prosa.[97] Na mesma época, Robert Bridges escreveu Eros e Psiquê: Um Poema Narrativo em Doze Medidas (1885; 1894).

Sylvia Townsend Warner transferiu a história para a Inglaterra vitoriana em seu romance The True Heart (1929), embora poucos leitores tenham feito a conexão até que ela mesma a apontou.[102] Outras adaptações literárias incluem The Robber Bridegroom (1942), uma novela de Eudora Welty; Till We Have Faces (1956), uma versão de C. S. Lewis narrada por uma irmã de Psiquê; e o poema "Psyche: 'Love driven her to Hell'" de H. D. (Hilda Doolittle).[97]

Fernando Pessoa publicou na revista Presença em 1934 um poema intitulado "Eros e Psique", considerado um de seus poemas esotéricos mais refinados.[103]

 
e Psique (1872–74) de Edward Burne-Jones

Legado folclórico

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Friedländer também listou vários contos europeus de casamento entre uma donzela humana e um príncipe amaldiçoado a ser um animal, relacionados ao ciclo de histórias "Cupido e Psique" (que mais tarde ficou conhecido como "A Busca pelo Marido Perdido" e "Animal como Noivo").[104][105]

Bruno Bettelheim observa em The Uses of Enchantment que o conto de fadas do século XVIII A Bela e a Fera é uma versão de Cupido e Psiquê. Motivos de Apuleio ocorrem em vários contos de fadas, incluindo Cinderela e Rumpelstiltskin, em versões coletadas por folcloristas treinados na tradição clássica, como Charles Perrault e os irmãos Grimm.[106] Na versão dos irmãos Grimm, Cinderela recebe a tarefa de separar lentilhas e ervilhas das cinzas, e é auxiliada por pássaros, assim como as formigas ajudam Psiquê na separação de grãos e legumes imposta a ela por Vênus. Assim como Cinderela, Psiquê tem duas irmãs invejosas que competem com ela pelo homem mais desejável. As irmãs de Cinderela mutilam os próprios pés para imitá-la, enquanto as de Psiquê são atirados à morte num penhasco rochoso.[107]

Artes cênicas

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Em 1634, Thomas Heywood transformou o conto de Cupido e Psiquê em uma mascarada para a corte de Carlos I.[97] Psyché de Lully (1678) é uma ópera barroca francesa (uma "tragédia lírica") baseada na peça de 1671 de Molière, que teve interlúdios musicais de Lully. A semi-ópera Psyche (1675), de Matthew Locke, é uma reformulação livre da produção de 1671. Em 1800, Ludwig Abeille estreou sua ópera alemã em quatro atos (singspiel) Amor und Psyche, com libreto de Franz Carl Hiemer baseado em Apuleio.

 
Psiquê e o Amor (1889) de Bouguereau

No século XIX, Cupido e Psiquê foi uma fonte de "transformações", interlúdios visuais envolvendo tableaux vivants, transparências e maquinário de palco que eram apresentados entre as cenas de uma pantomima, mas estranhos ao enredo.[108] Durante a década de 1890, quando tableaux vivants ou "quadros vivos" estavam na moda como parte do vaudeville, Psyché et l'Amour de Bouguereau, de 1889, estava entre as obras de arte encenadas. Para criar esses "quadros", artistas fantasiados "congelavam" em poses diante de um fundo copiado meticulosamente do original e ampliado dentro de uma moldura gigante. A nudez era simulada por meias-calças cor de carne que negociavam padrões de realismo, bom gosto e moralidade.[109] As alegações de valor educativo e artístico permitiram que os nus femininos—uma atração popular—escapassem à censura.[110] Psyché et l'Amour foi reproduzido pelo pintor cênico Edouard von Kilanyi, que fez uma turnê pela Europa e pelos Estados Unidos a partir de 1892,[111] e por George Gordon em uma produção australiana que começou sua exibição em dezembro de 1894.[112] A ilusão de voo era tão difícil de sustentar que este quadro foi necessariamente breve.[110] A artista anunciada como "A Milo Moderna" durante este período se especializou em recriar esculturas femininas, uma Psiquê além de sua homônima Vênus de Milo.[113]

Frederick Ashton coreografou o balé Cupido e Psiquê com música de Lord Berners e decoração de Sir Francis Rose, apresentado pela primeira vez em 27 de abril de 1939 pelo Sadler's Wells Ballet (hoje Royal Ballet). Frank Staff dançou como Cupido, Julia Farron como Psique, Michael Somes como Pan e June Brae como Vênus.[114]

Adaptações modernas

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Uma performance de vaudeville americana de 1897 como Cupido e Psique

Cupido e Psiquê continua sendo uma fonte de inspiração para dramaturgos e compositores modernos. Adaptações notáveis incluem:

 
Medalhão de gesso de Eros segurando Psiquê no formato de uma borboleta (século I d.C.),[131] uma forma de representação bastante popular em alto relevo e gemas.[132] Escavado em Begram, coleções do Museu Nacional do Afeganistão;[133] em exposição no Museu Britânico, Londres.[134]
 
Ilustração de papiro com Amor e Psiquê (século II)

Alguns exemplos existentes sugerem que na antiguidade Cupido e Psiquê poderiam ter um significado religioso ou místico. Anéis com sua imagem, vários dos quais vêm da Grã-Bretanha romana, podem ter servido a um propósito amuleto.[135] Gemas gravadas da Grã-Bretanha representam tormento espiritual com a imagem de Cupido queimando uma borboleta.[136] Os dois também são representados em alto relevo em peças de gesso domésticas romanas produzidas em massa, do século I ao século II d.C., encontradas em escavações em assentamentos mercantis greco-bactrianos na antiga Rota da Seda em Begram, no Afeganistão.[137]

Na antiguidade tardia, o casal é frequentemente representado com um inclinado sob o queixo do outro em abraço, um gesto de “comunhão erótica” com uma longa história.[138] Outras representações sobreviventes da antiguidade incluem uma ilustração em papiro do século II, possivelmente do conto,[139] e um afresco no teto de Trier executado durante o reinado de Constantino I.[2]

Era moderna

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Obras de arte proliferaram após a redescoberta do texto de Apuleio, em conjunto com a influência da escultura clássica. Em meados do século XV, Cupido e Psiquê tornaram-se um tema popular para os baús de casamento italianos (cassoni),[97] particularmente os dos Médici. A escolha foi provavelmente motivada pela alegoria cristianizada de Boccaccio. O mais antigo destes cassoni, datado de 1444 a 1470,[140] descreve a narrativa em duas partes: desde a concepção de Psiquê até seu abandono por Cupido; e suas andanças e o final feliz.[141] Com o casamento de Peleu e Tétis, o tema foi a escolha mais comum para especificar pinturas da Festa dos Deuses, que foram populares do Renascimento ao Maneirismo do Norte.[142]

Cupido e Psiquê é uma fonte rica de cenários, e vários artistas produziram ciclos de obras baseadas nele, incluindo os afrescos na Villa Farnesina (ca. 1518) de Rafael e sua oficina; afrescos no Palazzo del Tè (1527–28) de Giulio Romano; gravuras do "Mestre do Die" (meados do século XVI); e pinturas do pré-rafaelita Edward Burne-Jones (nas décadas de 1870–90).[97] Burne-Jones também executou uma série de 47 desenhos destinados a ilustrar o poema de Morris.[143] Cupido e Psiquê foi o tema do único ciclo de gravuras criado pelo simbolista alemão Max Klinger (1857–1920) para ilustrar uma história específica.[144]

O interesse especial no casamento como tema no Maneirismo do Norte parece surgir de uma grande gravura de 1587 feita por Hendrik Goltzius em Haarlem de um desenho de Bartholomeus Spranger (hoje Rijksmuseum) que Karel van Mander trouxe de Praga, onde Spranger era pintor da corte de Rodolfo II. A Festa dos Deuses no Casamento de Cupido e Psiquê era muito grande, com 43 x 85,4 cm, que foi impresso a partir de três placas diferentes. Mais de 80 figuras são mostradas, colocadas nas nuvens sobre uma paisagem mundial que pode ser vislumbrada abaixo. A composição toma emprestado versões de Rafael e Giulio Romano.[145]

 
Cupido e Psiquê (1867) de Alphonse Legros

Os temas mais populares para pinturas ou esculturas individuais são o casal sozinho ou explorações da figura de Psiquê, que às vezes é retratada em composições que lembram Ariadne adormecida, tal como foi encontrada por Dioniso.[146] O uso de nudez ou sexualidade na representação de Cupido e Psiquê às vezes ofendeu as sensibilidades contemporâneas. Na década de 1840, a Academia Nacional de Arte proibiu Cupido e Psiquê, de William Page, considerada talvez "a pintura mais erótica da América do século XIX".[147] O tema clássico pode ser apresentado em termos de nudez realista: em 1867, a figura feminina em Cupido e Psiquê de Alphonse Legros foi criticada como uma "jovem mulher nua comum".[148] Mas durante o mesmo período, Cupido e Psique também foram retratados castamente, como nas esculturas pastorais Psyche (1845) de Townsend e Cupido e Psiquê (1846) de Thomas Uwins, que foram compradas pela Rainha Vitória e seu consorte Alberto, de outra forma colecionadores ávidos de nus nas décadas de 1840 e 50.[149]

As representações de Psiquê muitas vezes não se limitam a ilustrar uma cena de Apuleio, mas podem se basear na tradição platônica mais ampla, na qual o Amor era uma força que moldava o eu. Psiquê Abandonada, de Jacques-Louis David, provavelmente baseado na versão do conto de La Fontaine, retrata o momento em que Psiquê, tendo violado o tabu de olhar para seu amante, é abandonada sozinha em uma rocha, sua nudez expressando despossessão e a paleta de cores um "desinvestimento" psicológico. A obra foi vista como um "substituto emocional" do isolamento e desespero do próprio artista durante sua prisão, resultante de sua participação na Revolução Francesa e associação com Robespierre.[150]

Escultura

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Pinturas

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Referências

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  59. a b c d e f g h i j k l m n o p q r s t u O seguinte sumário foi condensado a partir da tradução de Kenney (Cambridge University Press, 1990), e a tradução revisada de W. Adlington por S. Gaseless à Loeb Classical Library (Harvard University Press, 1915), com referência ao texto latino acompanhante.
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  63. Os bolos eram frequentemente oferendas aos deuses, especialmente nos mistérios eleusinos; bolos de farinha de cevada umedecidos com mel, chamados prokonia (προκώνια), eram oferecidos a Deméter e Coré na época da primeira colheita. Ver Allaire Brumfield, "Cakes in the liknon: Votives from the Sanctuary of Demeter and Kore on Acrocorinth", Hesperia 66 (1997) 147–172.
  64. Apuleio descreve-a como servida em uma xícara, embora a ambrosia seja geralmente considerada um alimento e o néctar, uma bebida.
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Bibligrafia

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  • Malcolm Bull, The Mirror of the Gods, How Renaissance Artists Rediscovered the Pagan Gods, pp. 342–343, Oxford UP, 2005, ISBN 978-0195219234
  • Anita Callaway, Visual Ephemera: Theatrical Art in Nineteenth-Century Australia (University of New South Wales Press, 2000)
  • Harrison, Stephen (2006). "Divine Authority in 'Cupid and Psyche': Apuleius Metamorphoses 6,23–24". In Schmeling, Gareth L. (ed.). Authors, Authority and Interpreters in the Ancient Novel: Essays in Honor of Gareth L. Schmeling. Barkhuis. pp. 172–185. ISBN 978-90-77922-13-2.

Leitura adicional

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  • Belmont, Nicole (1991). «La tâche de Psyché». Ethnologie française. 21 (4): 386–391. JSTOR 40989292 
  • Benson, Geoffrey C. (2018). «Cupid and Psyche and the Illumination of the Unseen». In: Cueva, Edmund; Harrison, Stephen; Mason, Hugh; Owens, William; Schwartz, Saundra. Re-Wiring The Ancient Novel, 2 Volume set: Volume 1: Greek Novels, Volume 2: Roman Novels and Other Important Texts. 24. [S.l.]: Barkhuis. pp. 85–116. ISBN 978-94-92444-56-1. JSTOR j.ctvggx289.30 
  • Bonilla y San Martin, Adolfo. El mito de Psyquis: un cuento de niños, una tradición simbólica y un estudio sobre el problema fundamental de la filosofía. Barcelona: Imprenta de Henrich y Cia. 1908.
  • Edwards, Lee R. (1979). «The Labors of Psyche: Toward a Theory of Female Heroism». Critical Inquiry. 6 (1): 33–49. JSTOR 1343084. doi:10.1086/448026 
  • Edwards, M. J. (1992). «The Tale of Cupid and Psyche». Zeitschrift für Papyrologie und Epigraphik. 94: 77–94. JSTOR 20188784 
  • Felton, D. (1 outubro de 2013). «Apuleius' Cupid Considered as a Lamia ( Metamorphoses 5.17-18)». Illinois Classical Studies. 38: 229–244. doi:10.5406/illiclasstud.38.0229 
  • Gaisser, Julia Haig (2017). «Cupid and Psyche». A Handbook to the Reception of Classical Mythology. [S.l.: s.n.] pp. 337–351. ISBN 9781119072034. doi:10.1002/9781119072034.ch23 
  • Gollnick, James (1992). «Origins and Nature of the Eros and Psyche Story». Love and the Soul: Psychological Interpretations of the Eros and Psyche Myth. Waterloo, ON: Wilfrid Laurier University Press. pp. 5–27. doi:10.51644/9780889208049-004 
  • E. J. Kenney (Ed.), Apuleius. Cupid and Psyche -Cambridge Greek and Latin Classics. Cambridge University Press. 1990. ISBN 0-521-26038-8.
  • Morwood, James (2010). «Cupid Grows Up». Greece & Rome. 57 (1): 107–116. JSTOR 40929430. doi:10.1017/S0017383509990301 
  • Purser, Louis Claude. The Story of Cupid and Psyche as related by Apuleius. London: George Bell and Sons. 1910. pp. xlvii-li.
  • Tommasi Moreschini, Chiara O.. "Gnostic Variations on the Tale of Cupid and Psyche". In: Intende, Lector - Echoes of Myth, Religion and Ritual in the Ancient Novel. Edited by Marília P. Futre Pinheiro, Anton Bierl and Roger Beck. Berlin, Boston: De Gruyter, 2013. pp. 123–144. https://doi.org/10.1515/9783110311907.123
  • Vertova, Luisa (1 de janeiro de 1979). «Cupid and Psyche in Renaissance Painting before Raphael». Journal of the Warburg and Courtauld Institutes. 42 (1): 104–121. JSTOR 751087. doi:10.2307/751087 
  • Zimmermann, Martin et al. (Ed.). Aspects of Apuleius' Golden Ass. Volume II. Cupid and Psyche. Groningen, Egbert Forsten. 1998. ISBN 90-6980-121-3.

Análise folclorística:

Ligações externas

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  • Contos semelhantes a A Bela e a Fera (textos de Cupido e Psiquê e monstros ou animais semelhantes como contos de noivos, principalmente no formato AT-425C, com comentários e hiperligações).