Autoestrada da Morte
Autoestrada da Morte ou Rodovia da Morte é uma autoestrada de seis faixas que liga o Kuwait e o Iraque. Oficialmente, era chamada de Rodovia 80 ou Autoestrada 80. Sai de Cidade do Kuwait e atravessa as cidades fronteiriças de Abdali e Safwan, seguindo até Baçorá.
Estrada da Morte | |||
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Guerra do Golfo | |||
Destroços de veículos na Autoestrada 80 em 18 de abril de 1991 | |||
Data | 25–27 de fevereiro de 1991 | ||
Local | Rodovias da Cidade do Kuwait até o Iraque | ||
Desfecho | Vitória decisiva das Forças de Coalizão das Nações Unidas | ||
Beligerantes | |||
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Comandantes | |||
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Baixas | |||
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Algumas fontes estimam que o número de iraquianos mortos chegue a 10 000 (entre combatentes e civis)[1] |
Durante a ofensiva das Nações Unidas ocorrida na Primeira Guerra do Golfo, militares iraquianos em retirada foram atacados na Rodovia 80 por aviões e forças em terra na noite de 26-27 de fevereiro de 1991. O ataque causou a destruição de milhares de veículos, muitos ainda com ocupantes. As cenas chocantes da rodovia devastada tornaram-se as imagens mais conhecidas dessa Guerra e foram citadas como fator determinante que levou o presidente americano George H. W. Bush a declarar uma trégua nas hostilidades até o dia seguinte.[2] Muitos invasores iraquianos conseguiram de fato escapar atravessando o Rio Eufrates e a Inteligência americana estimou que entre 70 000 a 80 000 militares inimigos conseguiram chegar a Baçorá.[3]
A autoestrada foi reparada ao final da década de 1990 e foi usada nos movimentos iniciais da Invasão do Iraque em 2003 pelas forças americanas e britânicas.
Rodovias da Morte
editarOs ataques americanos contra as colunas iraquianas ocorreram na verdade em duas diferentes rodovias: entre 1 400-2 000 veículos foram abandonados na Rodovia principal ou Rodovia 80 ao norte de Al Jahra e entre 400-700 na menos conhecida rodovia até Baçorá, a principal fortaleza militar do sul do Iraque.
Rodovia 80
editarNesta estrada os fuzileiros navais norte-americanos haviam colocado minas anti-tanque e depois bombardearam a retaguarda de uma grande coluna de veículos do Exército Regular Iraquiano, causando um enorme congestionamento e tornando os fugitivos alvos fáceis para os ataques aéreos. Ao término de dez horas, aviões dos Fuzileiros, Marinha e Força Aérea haviam atacado o comboio usando uma variedade de armas e explosivos. Alguns sobreviventes dos ataques aéreos depois tiveram que enfrentar forças em terra. Os veículos que conseguiram sair do congestionamento e continuaram a seguir pelo norte, foram constantemente alvejados um a um. Os destroços encontrados ao longo da rodovia consistiam em poucos veículos militares (cerca de 28 tanques e outros blindados). A maior parte era de veículos civis como automóveis e ônibus. Dentro dos mesmos havia muitos produtos de saques no Kuwait.
O número total de mortos pelos ataques é desconhecido e permanecem controvérsias sobre isso. Algumas estimativas independentes chegaram a 10 000 ou dezenas de milhares de baixas, mas isso é altamente improvável. De acordo com levantamentos de 2003 do Projeto para Pesquisa de Defesas Alternativas, provavelmente entre 7 500-10 000 pessoas formavam a principal caravana mas após o início dos ataques, acredita-se que a maior parte abandonou os veículos em pânico e escapou pelo deserto ou pântanos circundantes (450-500 caíram prisioneiros). A estimativa mais baixa do número de mortos no ataque, em torno de 200 a 300, foi noticiada pelo jornalista Michael Kelly, mas o mais plausível é que o número mínimo de mortos nesse ataque tenha ficado entre 500-600.[4]
Rodovia 8
editarNa Rodovia 8 indo para o leste, as forças iraquianas tinham se concentrado tentando se organizarem para a luta ou simplesmente fugirem. Ali estava a elite da Primeira Divisão Blindada da Guarda Republicana do Iraque (Divisão Hamurabi),[3] que deveria se espalhar por uma grande área para lutar contra pequenos grupos de americanos em terra, oriundos do Nono Batalhão de Artilharia e um batalhão de helicópteros AH-64 Apache comandados pelo general Barry McCaffrey. Centenas de veículos iraquianos, a maioria militar, foram sistematicamente destruídos em pequenos confrontos ao longo de 80 km, tanto na pista como em pontos de travessia do deserto.
Esse confronto, conhecido pela Imprensa e público apenas duas semanas depois, ainda permanece obscuro e a maioria das imagens de devastação, atribuídas ao bombardeio da Rodovia 80, na verdade são da Rodovia 8.[5] O Projeto para Pesquisa de Defesas Alternativas estimou o número de mortos entre 300 a 400 ou mais, o que elevou o número total nas duas rodovias para 800 a 1 000 mortos.[4] Uma grande coluna remanescente da Divisão Hamurabi e que tentava recuar para Bagdá, também foi combatida e destruída poucos dias depois (2 de março), já dentro do território iraquiano, pelas forças do general McCaffrey, numa controversa ação pós-guerra conhecida como Batalha de Rumaila.[3]
Controvérsias
editarA ofensiva da Coalizão na Rodovia 80 é questionada e ponto de controvérsia, com alguns observadores afirmando que as forças foram desproporcionais e que os iraquianos se retiravam do Kuwait (em atenção tardia a Resolução 660 do Conselho de Segurança das Nações Unidas de 2 de agosto de 1990), além do que as colunas traziam kwaitianos capturados (aparentemente para serem usados como reféns[6]) bem como civis refugiados que incluíam mulheres e crianças (a maioria de famílias pró-Iraque, militantes da Organização para Libertação da Palestina e colaboracionistas kwaitianos que tinham saído do país quando da Expulsão dos Palestinos do Kuwait no início de março). O procurador geral americano Ramsey Clark alegou que os ataques violaram a Terceira Convenção de Genebra, que determinou a ilegalidade de assassínios de soldados que não estão em combate.[7] A lei internacional determina expressamente que forças militares em retirada são alvos na guerra para evitar que se reagrupem e contra-ataquem (apenas militares que se rendem são protegidos pela Convenções da Haia (1899 e 1907)). Ainda foi denunciado que os veículos de combate americanos abriram fogo contra um grupo de mais de 350 soldados iraquianos desarmados que tinham se rendido a um posto avançado após escaparem do ataque na Rodovia 8, em 27 de fevereiro; essas afirmações foram publicadas por Seymour Hersh.[2]
O general Norman Schwarzkopf Jr. comentou em 1995:[8]
“ | A primeira razão do porquê foi bombardeada a rodovia que saía do norte do Kuwait é que havia muitos equipamentos militares em deslocação por ali, e eu tinha ordens de meus superiores para destruir o maior número de material bélico iraquiano que pudesse. A segunda razão é que aquelas pessoas não eram um bando de inocentes atravessando a fronteira para o Iraque. Eram estupradores, assassinos e criminosos que saquearam e pilharam o centro da Cidade do Kuwait e tentavam voltar para seu país antes de serem pegos. | ” |
De acordo com Colin Powell, chefe da junta de comandantes e futuro Secretário de Estado americano, as cenas da carnificina do tipo "galeria de tiro" foram a razão da interrupção das hostilidades da Guerra do Golfo após a Campanha da Liberação do Kuwait. Ele escreveu mais tarde em sua autobiografia My American Journey que "a cobertura televisiva começava a nos mostrar como açougueiros em um matadouro".
De acordo com o Instituto de Pesquisa de Política Estrangeira, contudo, "aparências eram enganosas":[9]
“ | Estudos de pós-guerra determinaram que a maioria dos destroços na rodovia de Baçorá foi de abandono pelos iraquianos antes de serem alvejados e que na verdade os próprios inimigos os incendiaram. Além disso, as pesquisas de opinião mostraram que o apoio dos americanos não diminuíra em função das imagens mostradas. | ” |
O fotojornalista Peter Turnley publicou imagens de enterros em massa.[10] Turnley escreveu:
“ | Eu voei de minha casa em Paris até Riad quando a guerra em terra começou e cheguei na rodovia da morte na manhã do cessar fogo. Outros poucos jornalistas tinham chegado para verem essa cena incrível, que mostrava a carnificina ocorrida. Nesse trecho da rodovia onde carros e caminhões com as rodas para cima girando e com os rádios ainda funcionando, os corpos se enfileiravam ao longo da estrada. Muitos perguntaram quantos haviam morrido na guerra contra o Iraque e isso nunca foi bem respondido. Naquela primeira manhã, eu vi e fotografei militares americanos enterrando muitos corpos em várias covas. Eu não assisti imagens na televisão sobre isso. E não me lembro de ter visto muitas fotos publicadas sobre essas mortes. | ” |
Revista Time concluiu:[6]
“ | Após a guerra, correspondentes tinham encontrado carros e caminhões com corpos carbonizados, mas também muitos veículos abandonados. Seus ocupantes tinham fugido a pé, e os aviões americanos não os alvejaram. Alguns civis kuwaitianos que tinham sido raptados pelos iraquianos em fuga provavelmente pereceram, o que torna a Rodovia da Morte uma verdadeira tragédia. O que prova uma vez mais que, apesar da "Era das Armas de Precisão", a guerra continua um Inferno; mesmo que algumas regras tenham se tornado mais civilizadas, a melhor coisa humana a se fazer é terminar com isso o mais rápido possível. | ” |
Cultura popular
editar- Em 1991, o jornal britânico The Guardian encomendou ao poeta pacifista Tony Harrison uma obra sobre a guerra, em particular sobre a Rodovia da Morte.[11] O poema produzido, chamado A Cold Coming, começa com uma representação de uma fotografia gráfica tirada na Rodovia 8 pelo jornalista .
- Cenas de arquivo da destruição da Rodovia aparecem no vídeo da banda Iron Maiden para a canção "Afraid to Shoot Strangers" do álbum de 1992 Fear of the Dark.
- O filme de 2005 Jarhead, baseado em livro de 2003, apresenta cenas da Rodovia da Morte.
- O jogo eletrônico de 2010 Splinter Cell: Conviction, no flashback de uma missão, revela que Sam Fisher, o líder de uma equipe de quatro homens da Marinha, foi capturado enquanto patrulhava as operações da Rodovia da Morte, emboscado pelos iraquianos.
- No jogo eletrônico de 2019 Call of Duty: Modern Warfare, um ataque a militares e civis no país fictício de Urzikstan é inspirado nesse evento, também recebendo o nome de Rodovia da Morte. O jogo atribui o ataque à Rússia, o que gerou acusações de revisionismo histórico.[12][13]
Referências
- ↑ Holsti, Ole R. (7 de novembro de 2011). «The United States and Iraq before the Iraq War». American Public Opinion on the Iraq War. [S.l.]: University of Michigan Press. p. 20. ISBN 9780472034802
- ↑ a b Seymour Hersh, OVERWHELMING FORCE: What happened in the final days of the Gulf War?, The New Yorker, 22 de maio de 2000
- ↑ a b c Hammurabi Division, GlobalSecurity.org
- ↑ a b Conetta, Carl. «Wages of War -- Appendix 2: Iraqi Combatant and Noncombatant Fatalities in the 1991 Gulf War». www.comw.org. Project on Defense Alternatives. Consultado em 29 de janeiro de 2020
- ↑ Scoop Images: The Last Iraq War Looked Like This, Scoop, 27 de janeiro de 2003
- ↑ a b Death Highway, Revisited, TIME, 18 de março de 1991
- ↑ Elaine Sciolino (22 de fevereiro de 1998). «The World: Theater of War; The New Face of Battle Wears Greasepaint». The New York Times. Consultado em 21 de dezembro de 2008
- ↑ Giordono, Joseph (23 de fevereiro de 2003). «U.S. troops revisit scene of deadly Gulf War barrage». Jornal Stars e Stripes. Consultado em 27 de julho de 2009
- ↑ David D. Perlmutter, Photojournalism and Foreign Affairs, Foreign Policy Research Institute, 27 de janeiro de 2005
- ↑ The Unseen Gulf War. Peter Turnley, Digital Journalist, dezembro de 2002
- ↑ Harrison, Tony (14 de fevereiro de 2003). «A cold coming». The Guardian. Consultado em 27 de julho de 2009
- ↑ «Call of Duty: Modern Warfare rewrites a controversial U.S. attack to blame it on Russia». VG247. 28 de outubro de 2019. Consultado em 28 de outubro de 2019
- ↑ Andrew Whalen (28 de outubro de 2019). «"Call of Duty: Modern Warfare" rewrites the Highway of Death as a Russian attack, rather than American». Newsweek (em inglês). Consultado em 29 de janeiro de 2020