Bacharel de Cananeia

degredado, intérprete e traficante de escravos português radicado no Brasil (?-?)

O Bacharel de Cananeia ou Cosme Fernandes (Portugal, 14?? — Capitania de São Vicente, 15??) foi um degredado português e posteriormente traficante de escravos, intérprete e guia de navegação. Foi levado para o Brasil, no litoral sul do atual estado de São Paulo em algum momento no começo do século XVI, onde passou a viver entre os indígenas carijós da área.[1] É possível também datar a sua chegada no ano de 1498, em certa expedição organizada por Bartolomeu Dias e relatada no Esmeraldo Situ Orbis, de Duarte Pacheco.[2]

Bacharel de Cananeia
Nome completo Desconhecido
Outros nomes
  • Cosme Persona Fernandes (possível)
  • Duarte Peres (possível)
  • Gonçalo da Costa (possível)
Nascimento 14??
Portugal
Morte 15??
Capitania de São Vicente, (Possivelmente Iguape)
Residência Cananeia
Nacionalidade português
Profissão traficante de escravos, intérprete, guia de navegação

Biografia

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Primeiros anos de Degredo

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Muito pouco se sabe sobre a vida pregressa do Bacharel. O que se sabe é que provavelmente desembarcou na América do Sul em algum momento do início do século XVI, possivelmente nas primeiras viagens de Américo Vespúcio.[3] Depois disso passou alguns anos vivendo sozinho entre os indígenas antes de se juntar a Francisco de Chaves, possível sobrevivente da expedição de Aleixo Garcia ao Império Inca, e mais alguns castelhanos também possíveis sobreviventes dessa expedição.[3][4] A primeira menção ao bacharel depois disso data de por volta de 1526 ou 1527, quando foi abordado por Diogo Garcia, a quem o ele forneceu mantimentos e um genro para servir de intérprete aos navegadores.[3]

Encontro com Martim Afonso de Sousa

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No dia 12 de agosto de 1531, Pero Lopes e Martim Afonso de Sousa atracam perto do arquipélago de Cananéia e enviam Pedro Annes, o piloto da expedição, terra adentro. Cinco dias depois, o piloto retorna com Francisco de Chaves, 5 ou 6 castelhanos e o Bacharel. Os degredados conversaram, então, com o capitão-mor e esse ordena que Pero Lobo Pinheiro, parta com Chaves e mais 80 homens para o interior do continente, visto que ele havia prometido que, em dez meses, retornaria com quatrocentos escravizados carregados de prata e ouro. Essa expedição, que partiu no dia 1 de setembro daquele ano, nunca mais retornou a São Vicente, tendo, supostamente, sido dizimado pelos indígenas.[5][6][7]

Participação na Guerra de Iguape

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Outeiro do Bacharel visto da barra de Icapara. Segundo Ernesto Guilherme Young, teria sido ao pé desse monte onde a primeira povoação conhecida como Iguape foi construída.[4]

Algum tempo depois - dois anos, segundo Ruy Dias de Guzmán, que o identifica como sendo Duarte Perez - o bacharel passou a viver com sua família e criados junto de alguns refugiados espanhóis que tinham se assentado na região de Iguape, liderados por Ruy Garcia Mosquera. O capitão-mor da capitania de São Vicente, Pero de Góis, exige que os espanhóis se apresentem em São Vicente para jurar lealdade a Portugal, ao seu rei, e a Martim Afonso de Sousa.[8] O Bacharel acata essa intimação, mas Mosquera não, que começa a se preparar para um confronto contra os portugueses em São Vicente.[9] Os vicentinos acabam sendo emboscados pelos espanhóis, que, subsequentemente, saqueiam a vila portuguesa antes de se retirarem rumo ao sul, primeiro para a Ilha de Santa Catarina e depois para o Rio da Prata.[3][8][9][10]

Final de Vida

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Depois disso as fontes a respeito do Bacharel começam a rarear. Possivelmente passou certo tempo em São Vicente antes de retornar para Cananéia, onde foi requerido pela rainha da Espanha para que ajudasse o navegador Gregorio de Pesquera Rosa em carta traduzida por Afonso d'Escragnolle Taunay. Essa viagem, entretanto, nunca chegou a ser realizada.[11]

De acordo com escritura pública, o Bacharel tomou propriedade por intermédio do padre Gonçalo Monteiro das instalações de estaleiros, arsenais e arredores do Porto das Naus (atual região de São Vicente),[12] recebendo uma das primeiras sesmarias da colônia.[13][carece de fontes?]

Porém, segundo o historiador Ernesto Young, o bacharel teria falecido em Iguape.[14]

Possíveis identidades

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Cosme Fernandes

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Alguns historiadores, como Ernesto Young,[4] acreditam que o verdadeiro nome do bacharel era Cosme Fernandes, ou Cosme Fernandes Pessoa - por vezes chamado de Mestre Cosme - um degredado que teria sido deixado por aquelas terras por volta do ano de 1501 e que, após a sua morte, teria dado de herança as suas terras aos seus descendentes, Na escritura lavrada por segundo capitão-mor de São Vicente, em 25 de maio de 1542 em favor de Perro Correia, nota-se a menção a um "Mestre Cosme, bacharel" como proprietário de terras defronte ao Tumiaru, onde estavam instalados os estaleiros ou arsenais e o Porto das Naus.[15][14]. Segundo o historiador, ainda, Cosme Fernandes teria falecido em Iguape alguns anos depois de ter se retirado de São Vicente.

Duarte Peres

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No entanto, Ruy Díaz de Guzmán, em La Argentina de 1612 afirma que o nome do bacharel teria sido Duarte Perez.[8] Essa hipótese é corroborada pelo historiador português Jaime Cortesão, que afirma em seu livro Descobrimentos Portugueses, com base em um documento de 24 de abril de 1498, que cita um degredado de alcunha "Bacharel" que a personagem teria sido trazido em uma expedição não oficial de Duarte Pacheco Pereira em 1498. Segundo o historiador português, a ilha de Cananeia serviria como "um verdadeiro depósito de degredados" e esse homem seria a mesma pessoa que foi referenciada mais de trinta anos depois pelos primeiros colonizadores da capitania de São Vicente.[16] Ernesto Young, no entanto, argumenta que esse seria outra pessoa devido a falta de evidências.[17]

Outras identidades

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Segundo Theodoro Sampaio, em artigo publicado no volume 7 da revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, alguns autores estariam hipotetizando que o bacharel seria o português João Ramalho, fundador da Vila de Santo André da Borda do Campo, e genro do chefe tupiniquim, Tibiriçá. Sampaio, no entanto, afasta essa possibilidade, atestando que Ramalho era analfabeto.[15]

Além disso, se aventou, erroneamente, a ideia de que o bacharel seria judeu devido ao nome que deu a sua povoação, o que, atualmente, é uma noção desconsiderada pela falta de evidência e, provavelmente, advinda de uma compreensão rasa da religião judaica.[18]

Ver também

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Referências

  1. São Vicente Primeiros Tempos, Carlos Fabra, edição 2010
  2. Cortesão, Jaime; Garcia, José Manuel (1990). Os descobrimentos portugueses. Col: Obras completas / Jaime Cortes̃ao. Lisboa: Imprensa nacional-Casa da Moeda 
  3. a b c d Young, Ernesto Guilherme. «Esboço histórico da fundação da cidade de Iguape». Typographia Aurora. Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo (v. 2): 49 - 151 
  4. a b c Young, Ernesto Guilherme (1903). «História de Iguape». Typographia do "Diário Oficial". Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo (v. 8): 222 - 235. Consultado em 2 de outubro de 2023 
  5. Sousa, Pero Lopes (1927). Diario da navegação de Pero Lopes de Sousa, 1530-1532 : Documentos e mapas : Vol. II. Rio de Janeiro: Typographia Leuzinger. pp. 203 – 206 
  6. Vilar, Leandro (17 de março de 2013). «Seguindo os passos da História». Consultado em 14 de outubro de 2020 
  7. Cervantes, Biblioteca Virtual Miguel de. «Historia general y natural de las Indias, islas y tierra-firme del mar océano. Tomo primero de la segunda parte, segundo de la obra». Biblioteca Virtual Miguel de Cervantes (em espanhol). p. 188. Consultado em 30 de setembro de 2023 
  8. a b c Tieffemberg, Silvia (2012). Argentina : historia del descubrimiento y conquista del Río de la Plata de Ruy Díaz de Guzmán. Buenos Aires: Editorial de la Facultad de Filosofia y Letras Universidad de Buenos Aires. p. 118. ISBN 9789871785551 
  9. a b J. J. Machado d'. Oliveira (1864). Quadro historico da provincia de São Paulo. unknown library. [S.l.]: Typographia Imparcial de J.R.A. Marques 
  10. Varhagen, Francisco Adolfo de (1877). História Geral do Brasil. Rio de Janeiro: Em casa de E. e H. Laemmert. pp. 165 – 166 
  11. Almeida, Antônio Paulino de (29 de março de 1962). «Memória histórica de Cananéia (IV)». Revista de História (49): 205–243. ISSN 2316-9141. doi:10.11606/issn.2316-9141.rh.1962.121600. Consultado em 1 de outubro de 2023 
  12. «PORTO DAS NAUS: 1º SÍTIO HISTÓRICO DA COLONIZAÇÃO BRASILEIRA - São Vicente Alternativa». www.saovicentealternativa.com.br. Consultado em 1 de outubro de 2021 
  13. Fabra, Carlos (2010). 1. São Vicente - Primeiros Tempos. São Paulo: Edição 2010 
  14. a b São Vicente Primeiros Tempos Texto – Grupo de coordenação do trabalho; saovicente.sp.gov.br (PDF)
  15. a b Sampaio, Theodoro (1902). «Quem era o bacharel degradado em Cananéa?». Typographia do "Diario Oficial". Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo (v. 7): 280 - 285. Consultado em 16 de outubro de 2023 
  16. Cortesão, Jaime (1990). Os descobrimentos portugueses, Volume 3. [S.l.]: Imprensa Nacional-Casa da Moeda. pp. 717–723. ISBN 9722704222 
  17. Young, Ernesto Guilherme (2 de outubro de 2023). «Subsídios para a história de Iguape: Seus fundadores». Typographia do "Diário Oficial". Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo (v. 7): 286 - 297 
  18. Falbel, Nachman (1999). «Sobre a presença dos cristãos-novos na Capitania de São Vicente e a formação da etnia paulista». Universidade de São Paulo. Revista USP (41): 112 - 119. Consultado em 16 de outubro de 2023 

Bibliografia

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  • Arquivo do Estado de São Paulo (AESP), Ofícios Diversos de Iguape.
  • VILAR, Leandro. Seguindo os Passos da História: As entradas de Martim Afonso de Sousa, quarto e quinto parágrafos.
  • Cartório da Cidade de Iguape (Prefeitura Municipal) - http://www.cartorioiguape.com.br/conheca-nossa-cidade/
  • BARRETO, Aníbal (Cel.). Fortificações no Brasil (Resumo Histórico). Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército Editora, 1958. p. 368.
  • BUENO, Eduardo. Capitães do Brasil: a saga dos primeiros colonizadores. Rio de Janeiro: Objetiva, 1999. p. 288 il. ISBN 8573022523
  • DONATO, Hernâni. Dicionário das batalhas brasileiras. São Paulo: Ibrasa, 1987.
  • FORTES, Roberto. Iguape… Nossa história. Vol. I. Iguape: edição do autor, 2000.
  • Luz Soriano, Simão José da. Historia da Guerra Civil e do estabelecimento do governo parlamentar em Portugal, comprehedendo a historia diplomatica, militar e politica d'este reino desde 1777 até 1834. Lisboa, Impr. Nacional, vol IV, 1870 p. 497.
  • PEREIRA JUNIOR, Carlos Alberto. IGUAPE: Conto, canto e encanto com a minha história. São Paulo: Noovha America, 2005. 128 p. il. color. ISBN 85-7673-044-8
  • YOUNG, Ernesto G. Apontamentos Genealógicos de Famílias Iguapenses. Revista do IHGSP, vol X, São Paulo, 1905 pp. 3–28.
  • YOUNG, Ernesto G. Esboço Histórico da Fundação da cidade de Iguape. Revista do IHGSP, vol II, São Paulo, 1896 pp. 49–151.
  • YOUNG, Ernesto G. História de Iguape. Revista do IHGSP, vol VIII, São Paulo, 1903 pp. 222–375.
  • YOUNG, Ernesto G. História de Iguape. Revista do IHGSP, vol IX, São Paulo, 1904 pp. 108–326.
  • YOUNG, Ernesto G. Subsídios para a História de Iguape e seus Fundadores. Revista do IHGSP, vol VII, São Paulo, 1902 pp. 286–298.
  • YOUNG, Ernesto G. Subsídios para a Historia de Iguape - Mineração de Ouro. Revista do IHGSP, vol VI, São Paulo, 1902 pp. 400–435.
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