Bacurau (filme)
Bacurau é um filme franco-brasileiro de 2019, dos gêneros drama, faroeste, terror gore, fantasia e ficção científica, escrito e dirigido por Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles. Foi produzido por Emilie Lesclaux, Saïd Ben Saïd e Michel Merkt e estrelado por Sônia Braga, Udo Kier, Silvero Pereira e Bárbara Colen. O título do filme é o apelido do último ônibus da madrugada no Recife, referente a uma ave caprimulgídea de hábitos noturnos comum nos sertões brasileiros, o bacurau (Nyctidromus albicollis), que era chamado pelos povos tupis de wakura'wa.
Bacurau | |
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Brasil[1] · França[1] 2019 • cor • 131[1] min | |
Gênero | drama, faroeste, terror gore, fantasia, ficção científica |
Direção | Kleber Mendonça Filho Juliano Dornelles |
Produção | Emilie Lesclaux Saïd Ben Saïd Michel Merkt |
Roteiro | Kleber Mendonça Filho Juliano Dornelles |
Elenco | Sônia Braga Udo Kier Bárbara Colen Thomás Aquino Silvero Pereira Karine Teles |
Música | Mateus Alves Tomaz Alves Souza |
Cinematografia | Pedro Sotero |
Edição | Eduardo Serrano |
Companhia(s) produtora(s) | SBS Productions CinemaScópio Globo Filmes |
Distribuição | Vitrine Filmes (Brasil)[2] SBS Distribution (França)[3] |
Lançamento | |
Idioma | português brasileiro inglês |
Orçamento | R$ 7,7 milhões[7] |
Receita | US$ 3,6 milhões[8] |
A produção conquistou o Prêmio do Júri no Festival de Cannes de 2019, tornando-se o segundo filme brasileiro da história a ser laureado no certame geral, após O Pagador de Promessas (1962) de Anselmo Duarte.[9][10] O filme foi selecionado para mostras principais de festivais prestigiados mundialmente, como o Festival de Nova York (NYFF), Festival de Havana, Festival du Nouveau Cinéma de Montreal, Festival de Cinema de Munique, Festival de Cinema de Sitges e outros.[11] Além disso, o filme foi indicado a diversas categorias do Grande Prêmio do Cinema Brasileiro e do Prêmio Guarani de Cinema Brasileiro.
Sinopse
editarNum futuro próximo, Bacurau, uma pequena cidade brasileira no oeste de Pernambuco, lamenta a perda de sua matriarca, Carmelita (Lia de Itamaracá), que viveu até os 94 anos. Dias depois, seus habitantes aos poucos percebem algo estranho acontecer na região: enquanto drones passeiam pelos céus, estrangeiros chegam pela primeira vez na cidade com planos de exterminar toda a população ali residente, carros são atingidos por tiros e cadáveres começam a aparecer. Os habitantes chegam à conclusão de que estão sendo atacados. Resta identificar o inimigo e criar coletivamente um meio de defesa.
Elenco
editar- Sônia Braga como Domingas
- Udo Kier como Michael
- Bárbara Colen como Teresa
- Silvero Pereira como Lunga
- Thomás Aquino como Pacote / Acácio
- Karine Teles como A Forasteira
- Antonio Saboia como O Forasteiro
- Thardelly Lima como Tony Junior
- Rodger Rogério como Carranca
- Lia de Itamaracá como Carmelita
- Wilson Rabelo como Plínio
- Carlos Francisco como Damiano
- Luciana Souza como Isa
- Jonny Mars como Terry
- Allison Willow como Kate
- James Turpin como Jake
- Brian Townes como Joshua
- Charles Hodges como Chris
- Chris Doubek como Willy
Produção
editar- Filmagens e locações
As filmagens aconteceram na povoação de Barra no município de Parelhas e na zona rural do município de Acari, no Sertão do Seridó, Rio Grande do Norte, com cenas gravadas no Açude Gargalheiras.[12][13][14]
- Distribuição
Para a distribuição do filme, foram produzidos dois trailers, um para os cinemas independentes e outro para os mais comerciais.[15]
Trilha sonora
editarTrilha sonora[16] | ||||||||||
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N.º | Título | Intérprete(s) | Duração | |||||||
1. | "Night" | John Carpenter | 3:38 | |||||||
2. | "Não Identificado" | Gal Costa | 3:19 | |||||||
3. | "Bichos da noite" | Sérgio Ricardo | 3:15 | |||||||
4. | "Requiém para Matraga" | Geraldo Vandré | 2:11 |
Recepção da crítica
editarNo agregador de críticas Rotten Tomatoes, o filme detém 93% de aprovação com base em 170 avaliações, com uma classificação média de 7,76/10. O consenso crítico do site diz: "Formalmente empolgante e narrativamente ousado, Bacurau se baseia nas preocupações sociopolíticas brasileiras modernas para apresentar um drama contundente e que mistura o gênero".[17] No Metacritic, o filme tem uma pontuação média ponderada de 82 em 100, com base em 25 críticas, indicando "aclamação universal".[18]
A crítica de Peter Bradshaw, do The Guardian, elogia o filme atribuindo-lhe 4 de 5 estrelas. Para o crítico, Bacurau abandona os tons mais suaves dos trabalhos anteriores de Kleber Mendonça Filho, mergulhando em uma narrativa ultraviolenta e perturbadora, com uma forte crítica ao governo de Jair Bolsonaro. Bradshaw descreve o filme como uma experiência cinematográfica única, que começa com uma sensação de documentário etnográfico, evolui para uma parábola de resistência e culmina em um banho de sangue, destacando sua clareza, força e originalidade.[19] Steve Pond do TheWrap escreve que: "Bacurau é perturbador, um sonho febril sobre um período confuso no Brasil. E, ocasionalmente, é muito divertido também".[20]
David Ehrlich, do IndieWire, atribui a nota B+ a Bacurau e descreve o filme como uma continuação dos temas abordados pelos filmes anteriores de Kleber Mendonça Filho, mas com uma abordagem mais radical e imprevisível. Enquanto seus filmes anteriores, como O Som ao Redor e Aquarius, tratavam de comunidades resistindo à modernidade de maneira mais sutil, Bacurau adota um tom mais de faroeste psicodélico, misturando diversos gêneros e culminando em um banho de sangue. Ehrlich reconhece a habilidade de Filho e Dornelles em combinar esses elementos de forma eficaz, criando um filme que mistura passado e futuro de maneira única. E conclui dizendo que o filme é uma crítica poderosa ao mundo moderno e sua tendência de destruir o passado, destacando-o como uma obra que desafia as convenções e faz um comentário mordaz sobre as consequências de ignorar as raízes culturais.[21]
A crítica de Peter Debruge, da Variety, destaca Bacurau como um "riff brasileiro sangrento" do filme The Most Dangerous Game, que mistura elementos de thriller, ficção científica e faroeste. Embora o filme seja visualmente impressionante, Debruge observa que sua narrativa se perde em um ritmo irregular e subtexto excessivamente complexo, o que pode dificultar a apreciação do público. Ele ressalta que Bacurau se afasta das expectativas tradicionais de um filme de ação, com seus codiretores, Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles, focando mais em subtextos políticos e culturais do que na narrativa de ação pura. Apesar de algumas performances irregulares, os cineastas conseguem manter o interesse por meio de cenas que questionam estereótipos e trocam a dinâmica esperada entre heróis e vilões. No entanto, Debruge sugere que o filme teria se beneficiado de uma abordagem mais simples, em vez de se perder em uma sobrecarga de significados e referências. A falta de uma personagem central forte também é um ponto fraco, já que o filme nunca decide quem deve liderar a luta contra os 'caçadores'. Por fim, Bacurau é elogiado por sua ousadia e por suas críticas políticas, mas não chega a ser completamente satisfatório como um filme de gênero.[4]
A crítica de Stephen Dalton para The Hollywood Reporter descreve o filme como uma mistura ousada de gêneros, combinando elementos de comédia de cidade pequena, fábula e realismo mágico, mas ressalta que Bacurau, apesar de sua ambição, acaba sendo excessivamente complexo e irregular. A crítica observa que, embora o filme seja visualmente impressionante e tenha uma forte carga de críticas sociais, ele perde um pouco de impacto devido a uma execução errática e a uma sobrecarga de subtextos. Dalton elogia a habilidade de Mendonça Filho e Dornelles em capturar a atmosfera de uma comunidade unida, mas acredita que o foco no subtexto político e social — inspirado pela tradição cangaceira e o coronelismo — pode dificultar a compreensão para públicos não brasileiros. O filme mistura de forma ambiciosa referências a westerns, especialmente aos clássicos dos anos 70, e aos filmes de John Carpenter, mas o tom do filme acaba sendo inconsistente. Além disso, Dalton aponta que a representação dos vilões, como os caçadores americanos liderados por Udo Kier, é exagerada e caricatural, o que enfraquece a tensão e a credibilidade da ameaça. A crítica ao neocolonialismo e ao imperialismo, embora evidente, é apresentada de maneira um tanto desajeitada, com diálogos rasos e um tom que pode parecer forçado. Apesar de seus méritos visuais e ambição narrativa, Bacurau não consegue reunir todos os seus elementos de maneira satisfatória, segundo Dalton.[5]
A crítica de César Soto para o G1 destaca o equilíbrio impressionante que Bacurau alcança entre o realismo brasileiro e elementos típicos de filmes de gênero, como ação e suspense. A crítica destaca a importância do conjunto da comunidade, com um elenco diversificado de personagens, e salienta que o povoado é o verdadeiro protagonista. As atuações de Braga e de Silvero Pereira, como um cangaceiro moderno, são elogiadas, enquanto Udo Kier desempenha bem o papel de vilão excêntrico. Soto aponta que Bacurau se distingue ao usar recursos do cinema nacional, como a naturalidade nas mortes, que servem mais como uma catarse do que como espetáculo, ao contrário do que se espera em filmes de ação hollywoodianos. O filme é descrito como tenso, mas com humor, sem explicações explícitas sobre os vilões ou uma mensagem predefinida. Isso permite que o público tire suas próprias conclusões. O resultado é uma produção envolvente, que mistura gêneros pop com uma essência genuinamente brasileira, com potencial para ser acessível e extremamente divertida.[22]
A crítica de Inácio Araujo para a Folha de S.Paulo destaca Bacurau como uma guinada na filmografia de Kleber Mendonça Filho, especialmente pelo fato de o filme trazer uma abordagem mais direta e alegórica em relação ao Brasil contemporâneo. Araujo afirma que, em Bacurau, Mendonça Filho recorre a uma alegoria mais explícita da era Temer e Bolsonaro, abordando diretamente temas de invasão e resistência, sem as nuances que marcaram seus filmes anteriores. A crítica questiona se essa mudança representa uma evolução ou uma perda para a filmografia do cineasta. Embora os ganhos sejam evidentes, como o Prêmio do Júri em Cannes, Araujo sugere que o filme reflete um espírito de raiva e resistência diante de um país que se revela sanguinário, ao invés de refletir sobre as contradições de forma mais sutil. Bacurau, assim, é um filme mais claro e direto, onde o confronto moderno e primitivo é levado ao centro da trama, sem se preocupar com meios-tons. Apesar de ainda ser cedo para avaliar o impacto dessa mudança na carreira de Mendonça Filho, Araujo considera Bacurau uma obra obrigatória e relevante para os tempos atuais.[23]
Por outro lado, o geógrafo Demétrio Magnolli, em sua coluna para Folha de S.Paulo, criticou o filme. Para ele: "O filme de Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles deve ser visto como um testemunho de nossa miséria intelectual — ou, mais precisamente, da extinção de qualquer traço de vida inteligente na esquerda brasileira".[24]
Prêmios e indicações
editarAno | Prêmio/Festival | Categoria | Recipiente | Resultado |
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2019 | Festival de Cannes | Prêmio do Júri | Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles | Venceu |
Palma de Ouro | Indicado | |||
Festival de Sydney | Melhor Filme | — | Indicado | |
Festival de Munique | Melhor Filme | — | Venceu | |
Festival de Lima | Melhor Filme | — | Venceu | |
Melhor Direção | Kleber Mendonça Filho | Venceu | ||
Troféu APCA | Melhor Filme | Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles | Venceu | |
Melhor Direção | Venceu | |||
Neuchâtel International Fantastic Film Festival | Melhor Filme | Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles | Venceu | |
Montréal Festival of New Cinema | Melhor Filme | Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles | Venceu | |
2020 | Grande Prêmio do Cinema Brasileiro[25] | Melhor Filme | — | Venceu |
Melhor Ator | Silvero Pereira | Venceu | ||
Melhor Atriz | Bárbara Colen | Indicado | ||
Melhor Ator Coadjuvante | Antonio Saboia | Indicado | ||
Melhor Atriz Coadjuvante | Karine Teles | Indicado | ||
Sônia Braga | Indicado | |||
Melhor Diretor | Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles | Venceu | ||
Melhor Roteiro Original | Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles | Venceu | ||
Melhor Direção de Arte | Thales Junqueira | Indicado | ||
Melhor Montagem | Eduardo Serrano | Venceu | ||
Melhor Fotografia | Pedro Sotero | Indicado | ||
Melhores Efeitos Visuais | Mikael Tanguy e Thierry Delobel | Venceu | ||
Melhor Figurino | Rita Azevedo | Indicado | ||
Melhor Trilha Sonora | Mateus Alves e Tomaz Alves Souza | Indicado | ||
Melhor Maquiagem | Tayce Vale | Indicado | ||
Melhor Som | Nicolas Hallet, Ricardo Cutz e Cyril Holtz | Indicado | ||
Prêmio ABC de Cinematografia | Melhor Fotografia de Longa-metragem | Pedro Sotero | Venceu | |
Melhor Montagem | Eduardo Serrano | Venceu | ||
Melhor Direção de Arte | Thales Junqueira | Venceu | ||
Melhor Som | Nicolas Hallet, Ricardo Cutz e Cyril Holtz | Venceu | ||
Online Film Critics Society Awards | Melhor Filme Estrangeiro | — | Venceu |
Ver também
editarReferências
- ↑ a b c d «Bacurau». Vitrine Filmes. Consultado em 18 de outubro de 2022
- ↑ a b «Bacurau». Brasil: AdoroCinema. Consultado em 29 de março de 2024
- ↑ a b «Bacurau» (em francês). França: AlloCiné. Consultado em 29 de março de 2024
- ↑ a b Peter Debruge (15 de maio de 2019). «Cannes Film Review: 'Bacurau'». Variety. Consultado em 30 de agosto de 2019
- ↑ a b Stephen Dalton (15 de maio de 2019). «'Bacurau': Film Review - Cannes 2019». The Hollywood Reporter. Consultado em 30 de agosto de 2019
- ↑ «Bacurau». Portugal: SAPO Mag. Consultado em 29 de março de 2024
- ↑ «Emilie Lesclaux fala sobre 'Bacurau' e cinema nacional: 'É mais fácil destruir do que construir'». Mulher no Cinema. Consultado em 2 de setembro de 2019
- ↑ «Bacurau». Box Office Mojo. Consultado em 29 de março de 2024
- ↑ «Filme brasileiro 'Bacurau' vence Prêmio do Júri no Festival de Cannes.». G1. Consultado em 25 de maio de 2019
- ↑ «Cannes festival 2019: full list of films» (em inglês). The Guardian. Consultado em 17 de maio de 2019
- ↑ «Main Slate» (em inglês). 57th New York Film Festival. Consultado em 23 de agosto de 2019
- ↑ «Sessão especial de 'Bacurau' em Parelhas emociona moradores da cidade». G1. Consultado em 22 de agosto de 2019
- ↑ «Gargalheiras: Após 13 anos, açude onde foi filmado 'Bacurau' está a 5 cm de sangrar». G1. 3 de abril de 2024. Consultado em 14 de janeiro de 2025
- ↑ «Cenário de Bacurau, Açude Gargalheiras transborda pela 1ª vez em 13 anos no RN». CNN Brasil. 4 de abril de 2024. Consultado em 14 de janeiro de 2025
- ↑ Masterclass | O que é distribuição? (vídeo). Brasil: Vitrine Filmes (YouTube). Em cena em 34:54. Consultado em 9 de junho de 2021
- ↑ Bacurau, 15 de janeiro de 2020, consultado em 19 de junho de 2020
- ↑ «Nighthawk (Bacurau)». Rotten Tomatoes. Consultado em 30 de agosto de 2019
- ↑ «Bacurau Reviews». Metacritic. Consultado em 30 de agosto de 2019
- ↑ Peter Bradshaw (15 de maio de 2019). «Bacurau review: ultraviolent freakout in Brazil's outback». TheWrap. Consultado em 30 de agosto de 2019
- ↑ Steve Pond (15 de maio de 2019). «'Bacurau' Film Review: Bloody Brazilian Fever Dream Has More Than Gore on Its Mind». The Guardian. Consultado em 30 de agosto de 2019
- ↑ David Ehrlich. «'Bacurau' Review: 'Seven Samurai' Meets 'Hostel' in Delirious Brazilian Western». IndieWire. Consultado em 22 de janeiro de 2025
- ↑ Cesar Soto (22 de agosto de 2019). «'Bacurau' brinca com gêneros e expectativas em crônica violenta e sarcástica; G1 já viu». G1. Consultado em 30 de agosto de 2019
- ↑ Inácio Araujo (24 de agosto de 2019). «'Bacurau' é feito com raiva e troca a sutileza pelo ataque direto». Folha de S.Paulo. Consultado em 30 de agosto de 2019
- ↑ «Demétrio Magnoli: 'Bacurau' é testemunho da extinção de vida inteligente na esquerda brasileira». Folha de S.Paulo. 15 de setembro de 2019. Consultado em 7 de dezembro de 2019
- ↑ https://gauchazh.clicrbs.com.br/cultura-e-lazer/cinema/noticia/2020/10/bacurau-e-consagrado-na-19a-edicao-do-grande-premio-do-cinema-brasileiro-ckg5w6ozw000p015xdnmks1id.html