Biosfera oculta é uma hipotética biosfera microbiana existente na Terra que utilizaria processos bioquímicos e moleculares diferentes dos organismos vivos conhecidos atualmente.[1][2] Apesar da vida na Terra ser bem estudada, se uma biosfera oculta existisse, ela poderia se manter desconhecida, pois a exploração do mundo microbiano foca principalmente a bioquímica de macro-organismos. Essa discussão envolve especialistas em filosofia da ciência e astrobiologia.[2]

A hipótese

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Há hipóteses de que a Terra primitiva pode ter dado origem à vida de mais de uma maneira, algumas das quais teriam utilizado variações químicas diferentes das que conhecemos. Alguns cientistas defendem que, mesmo que essa origem alternativa tivesse ocorrido, esses seres vivos alternativos já teriam sido extintos por competição com a vida como conhecemos, ou se fundido na mesma linhagem por mecanismos como a transferência horizontal de genes. Outros cientistas, no entanto, levantam a hipótese de que esses organismos ainda possam existir em nosso planeta.[3][4]

Um grupo de bioquímicos da Universidade da Flórida argumentam que, se organismos baseados em RNA realmente existiram, eles podem ainda estar vivos hoje, sem serem notados, porque não contém os ribossomos normalmente utilizados para detectar organismos vivos. Eles sugerem que estes organismos hipotéticos poderiam ser encontrados ao buscar por ambientes com baixa quantidade de enxofre, em ambientes espacialmente limitados (como minerais com poros menores do que um micrômetro), e ambientes com grande amplitude térmica entre quente e frio extremos.[5]

Há outros candidatos propostos para uma biosfera oculta. Poderiam ser organismos utilizando outros tipos de aminoácidos em suas proteínas, ou diferentes unidades moleculares (ou seja, diferentes base nitrogenadas ou carboidratos) em seus ácidos nucleicos,[6] ou organismos com quiralidade oposta à nossa. Poderiam ser organismos usando aminoácidos incomuns.

Poderiam ser organismos utilizando arsênio em vez de fósforo.[7] Esses dois elementos são membros do grupo 15 da tabela periódica, portanto possuem algumas propriedades químicas semelhantes.

Poderiam ser organismos com código genético diferente, ou ainda utilizando outra substância química para ser material genético que não sejam cadeias de ácido nucleico. Ou seja, estes organismos armazenariam e transmitiriam informação na forma de outra molécula que não DNA ou RNA.[8]

Possíveis candidatos

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A procura pela biosfera oculta poderia começar em locais inóspitos para a vida como conhecemos. Paul Davies, físico da Arizona State University, sugere a busca em locais como desertos, lagos salgados, áreas com grande pressão, temperatura, e alta incidência de luz ultravioleta.[4]

A busca poderia ocorrer em locais com grande concentração de arsênio (tipicamente tóxico para a vida) e baixa concentração de fósforo (essencial para a vida comum).[4]

Há discussões sobre se o material conhecido como "verniz do deserto" [en] tem sua origem biológica ou não-biológica. Por isso, já sugeriu-se que ele fosse investigado como possível candidato para uma biosfera oculta. O "verniz do deserto" possui composição química distinta das rochas ao seu redor, com maior concentração de ferro e manganês do que o esperado, o que hipoteticamente poderia ser causado por microorganismos. Além disso, não foram encontradas bactérias em comum entre amostras de verniz do deserto coletados em locais diferentes, indicando que não há uma única cepa de bactéria responsável pela sua formação.[3][9]

Implicações

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Evidência de uma biosfera oculta poderia significar que a vida surgiu na Terra mais de uma vez, o que implica na existência de microorganismos que não possuem relação evolutiva com nenhuma outra forma conhecida de vida. Se essa forma de vida alternativa for descoberta na Terra, isso pode significar que a chance da vida ter surgido também em outros planetas é grande, aumentando as expectativas da existência de vida extraterrestre.[4] Por isso, a biosfera oculta é um tema de pesquisa da astrobiologia.

Referências

  1. Alabi, Letícia Paola; Morphy D. Santos, Charles (2015). «Elementos para uma filosofia universal da biologia: vida e a origem da ordem». Amazônia: Revista de Educação em Ciências e Matemáticas (Extra 22): 34–45. ISSN 2317-5125. Consultado em 16 de maio de 2023 
  2. a b Davies, Paul C.W.; Benner, Steven A.; Cleland, Carol E.; Lineweaver, Charles H.; McKay, Christopher P.; Wolfe-Simon, Felisa (março de 2009). «Signatures of a Shadow Biosphere». Astrobiology (2): 241–249. ISSN 1531-1074. doi:10.1089/ast.2008.0251. Consultado em 16 de maio de 2023 
  3. a b Cleland, Carol E. (1 de dezembro de 2007). «Epistemological issues in the study of microbial life: alternative terran biospheres?». Studies in History and Philosophy of Science Part C: Studies in History and Philosophy of Biological and Biomedical Sciences (em inglês) (4): 847–861. ISSN 1369-8486. doi:10.1016/j.shpsc.2007.09.007. Consultado em 11 de julho de 2023 
  4. a b c d Morgan, James (16 de fevereiro de 2009). «Alien life 'may exist among us'». BBC News (em inglês). Consultado em 11 de julho de 2023 
  5. Benner, S. A., Ricardo, A. and Carrigan, M. A. (2004) Is there a common chemical model for life in the universe? Arquivado em 2010-12-14 no Wayback Machine. Curr. Opin. Chem. Biol., 8, 672-689. doi:10.1016/j.cbpa.2004.10.003.
  6. Cleland, C. E. and Copley, S. D. (2005) The possibility of alternative microbial life on Earth. International Journal of Astrobiology 4(4), 165-173.
  7. Davies, P. C. W. , Benner, S.A., Cleland, C.E., Lineweaver,C.H., McKay,C.P. and Wolfe-Simon,F. Signatures of a Shadow Biosphere (2009) Astrobiology. 9(2): 241-249. doi:10.1089/ast.2008.0251.
  8. Callaway, Ewen (15 de fevereiro de 2009). «Short Sharp Science: How to hunt for shadow life». NewScientist. Consultado em 15 de maio de 2010. Arquivado do original em 20 de novembro de 2011 
  9. "Life on Earth… but not as we know it", Robin McKie, 14 April 2013, The Guardian
  • Este artigo foi inicialmente traduzido, total ou parcialmente, do artigo da Wikipédia em inglês cujo título é «Shadow biosphere».