Charlie Hebdo
Charlie Hebdo é uma revista semanal satírica francesa. Ricamente ilustrada, publica crônicas e relatórios sobre a política, a economia e a sociedade francesas, mas também jornalismo investigativo com a publicação de reportagens sobre o estrangeiro ou em áreas como as seitas, a extrema-direita, o cristianismo, o islamismo, o judaísmo, a cultura, entre outros temas.[1] A publicação frequentemente satiriza o Partido Comunista Francês, o catolicismo conservador, a hierarquia judaica e o fundamentalismo islâmico.[2] Publica também ocasionalmente números especiais sem data fixa.
Charlie Hebdo | |
---|---|
Editor | Gérard Briard |
Categoria | humor gráfico |
Formato | Standard |
Fundação | 1970 (54 anos) |
Idioma | francês |
ISSN | 1240-0068 |
Orientação política | esquerda plural |
charliehebdo.fr |
O editorial se define como libertário anarquista, sendo um reduto muitíssimo diversificado do pensamento de esquerda não oficial.[2] De acordo com Charb, a redacção do jornal Charlie Hebdo "reflecte todos os componentes da esquerda plural, e mesmo os abstencionistas".[1] Para Ziraldo o jornal é corajoso na sua forma de fazer humor.[3]
A publicação foi descrita como antirracista,[4] cética,[5] secular, libertária[6] e dentro da tradição do radicalismo de esquerda,[7][8] publicando artigos sobre a extrema-direita (especialmente o partido nacionalista francês Frente Nacional),[9] religião (catolicismo, islamismo e judaísmo), política e cultura.
História
editarEm 1960, George Bernier (1929-2005), mais conhecido como o Professeur Choron[10] e François Cavanna (1923-2014) lançam uma revista mensal satírica intitulada Hara-Kiri de tendência cínica e licenciosa. O Professeur Choron exerce as funções de director de publicação enquanto Cavanna é o editor. Cavanna reuniu uma equipe que incluía Roland Topor, Fred, Reiser, Georges Wolinski, Gébé e Cabu, Sépia (pseudónimo de Cavanna), Siné, etc.
Após uma carta de um leitor acusando o jornal de ser "estúpido e mau" ("bête et méchant"), a frase tornou-se o lema oficial para o jornal: « Hara-Kiri, journal bête et méchant »; todos os mêses, o Professeur Choron apresenta até um jogo "bête et méchant" para os leitores.[11]
O jornal foi brevemente banido em 1961, e novamente por seis meses em 1966 sob a influência de Yvonne de Gaulle, esposa do Presidente da República.[12] Em 1969, a equipe de Hara-Kiri decide produzir uma publicação semanal que trata de acontecimentos actuais. Este é lançado em Fevereiro como Hara-Kiri Hebdo e renomeado L'Hebdo Hara-Kiri em Maio do mesmo ano ('Hebdo "é a abreviação de' hebdomadaire '-' semanal ').
Em Novembro de 1970, após a morte de Charles de Gaulle, Presidente da República francesa (1959-1969), militar e dirigente da Resistência durante a ocupação alemã na época da Segunda Guerra Mundial, L'hebdo Hara-Kiri publica na sua primeira página uma caricatura de um obituário com a seguinte manchete: « Bal tragique à Colombey: 1 mort » (Baile Trágico em Colombey: um morto) em referência a um outro acontecimento do mesmo mês: o incêndio de uma discoteca (Incendie du 5-7) em Saint-Laurent-du-Pont que resultou na morte de 146 pessoas.[2][13] Em nome do governo francês, o então ministro do Interior, o gaullista conservador Raymond Marcellin, com o aval do Presidente da República Georges Pompidou, também gaullista, proibiu a publicação. No entanto, os cartunistas contornaram a situação lançando um novo jornal: Charlie Hebdo, e nele publicando a tal manchete. Alguns contribuintes não retornaram para o jornal, como Gébé, Cabu, Topor, e Fred. Mas também houve novos membros que incluiu Delfeil de Ton, Pierre Fournier, e Willem.
O novo nome Charlie Hebdo foi derivado de uma revista de história em quadrinhos mensal chamada Charlie Mensuel [14] (Charlie Mensal), que havia sido iniciado por Bernier e Delfeil de Ton (1934-) em 1968. Charlie tomou o nome de Charlie Brown, o personagem principal de Peanuts (um dos quadrinhos publicados originalmente em Charlie Mensuel), e também foi uma piada interna sobre Charles de Gaulle.[2][15]
Controvérsias com o islamismo
editarAs controvérsias entre os fundamentalistas islâmicos e o jornal começaram em 2006, quando o último reproduziu charges do jornal dinamarquês Jyllands-Posten sobre Maomé, publicadas inicialmente em 2005, essas caricaturas provocaram actos de violência por parte de extremistas islâmicos contra as embaixadas Dinamarquesas. Por motivos de segurança, após a publicação a polícia francesa foi mobilizada para proteger a sede da redacção do Charlie Hebdo.[16] Várias organizações muçulmanas, entre elas o Conselho francês do culto muçulmano pediram a proibição da venda do jornal porque além de reproduziram as caricaturas do jornal dinamarquês, também presentava caricaturas dos jornalistas de Charlie Hebdo. A primeira página de Cabu mostra Maomé chorando e que diz: "c'est dur d'être aimé par des cons" (é duro ser amado por estúpidos). Também é o nome de um filme sobre esses acontecimentos realizado por Daniel Lecomte em 2008.[17] Esta solicitação falhou por causa de um vício processual.[18]
Este caso das caricaturas conduz a redacção do Manifesto: Juntos contra o Novo Totalitarismo em Março de 2006 publicado inicialmente por Charlie Hebdo.[19]
Em 2007, uma ação movida por entidades muçulmanas contra o jornal foi arquivada pelo tribunal francês.[16]
Em 2011, houve o primeiro atentado efetivo contra a sede do jornal.[16]
Em 2012 o jornal volta a publicar charges satirizando o profeta Maomé. O governo francês fecha diversas instituições francesas em 20 países, com objetivo de evitar ataques em retaliação as publicações do jornal.[16]
Em 2013 o site do jornal é atacado por hackers no mesmo dia em que uma publicação com história sobre Maomé é lançada em quadrinhos pelo jornal.[16]
Em 2015 um novo e mais violento atentado é novamente perpetrado contra a sede do jornal.[16]
Ataque de 2011
editarEm novembro de 2011,[20] após publicar uma charge com o profeta Maomé representado como redator chefe ameaçando os leitores,[3] intitulada Charia Hebdo, a publicação foi recebida como um insulto pelo mundo árabe, resultando em polêmica.[21][22]
Logo em seguida o jornal foi vítima de um atentado, uma bomba incendiária foi lançada contra o escritório do semanário, sem no entanto deixar vítimas.[20]
O semanário contra-atacou, em tom de humor claro, com uma nova publicação em manchete, estampado um muçulmano beijando um cartunista do Hebdo, com a seguinte mensagem junto ao desenho: "O amor é mais forte que o ódio".[3]
Massacre de 2015
editarNo dia 7 de janeiro de 2015, em Paris, o semanário foi alvo de um novo ataque, terroristas fundamentalistas atacaram a sede do Charlie Hebdo, no XI distrito de Paris, supostamente, como forma de protesto mais uma vez contra a edição Sharía Hebdo, que em 2011 (data da publicação) já havia causado tumulto.[22] O atentado resultou em - no mínimo - doze pessoas mortas, entre as quais Charb, Cabu, Honoré, Tignous, e Wolinski (cartunistas do jornal) e mais cinco feridas gravemente.[23]
Das doze vítimas, onze morreram dentro da sede da editora e um do lado de fora. 2 vítimas eram policiais que faziam a guarda do local (incluindo a que foi vitimada do lado de fora da sede).[24]
O presidente francês, François Hollande, descreveu o ocorrido como "ataque terrorista de grande covardia".
No dia seguinte ao ataque, os editores sobreviventes do Charlie Hebdo anunciaram que a publicação continuará, com a edição da semana seguinte do jornal a ser publicado de acordo com o horário habitual, e com uma tiragem de 1 milhão de cópias, significativamente superior ao seu habitual 60 000.[25][26]
O governo francês concedeu quase € 1 milhão para apoiar a revista.[27] O Fundo de Imprensa Inovação Digital (francês: Fonds Google-AIPG pour l'Innovation Numérique de la presse), parcialmente financiado pela Google, doou € 250 000.[28]
Referências
- ↑ a b Roderic Mounir (9 de abril de 2010). ««Charlie Hebdo, c'est la gauche plurielle»». Le Courrier.ch. Consultado em 7 de janeiro de 2015
- ↑ a b c d João Batista Natali (8 de janeiro de 2015). «Conheça a história do jornal 'Charlie Hebdo', alvo de ataque a tiros em Paris». mundo. Folha online. Consultado em 8 de janeiro de 2015
- ↑ a b c Renato Biazzi (8 de janeiro de 2015). «Jornal Charlie Hebdo sempre foi símbolo de crítica e irreverência: Hebdo era inspiração para caricaturistas e chargistas do mundo todo. Jornal foi criado em 1970 e em 2011 chegou a sofrer um atentado.». Hora Um da Notícia. G1. Consultado em 8 de janeiro de 2015
- ↑ Charb (Stéphane Charbonnier) (20 de novembro de 2013). «Non, "Charlie Hebdo" n'est pas raciste!». Le Monde
- ↑ Nuzzi, Olivia (14 de janeiro de 2015). «The Charlie Hebdo conspiracy too crazy, even for Alex Jones». The Daily Beast
- ↑ McGrogan, Manus (7 de janeiro de 2017). «Charlie Hebdo: The Poverty of Satire». Jacobin
- ↑ «Charlie Hebdo and its place in French journalism». BBC News. 8 de janeiro de 2015
- ↑ {{citar notícia|título=Charlie Hebdo: Gun attack on French magazine kills 12 |obra=BBC News |data=07/01/2015 |url=https://www.bbc.com/news/world-europe-30710883 }
- ↑ «Charlie Hebdo: They're not racist just because you're offended». HuffPost. 13 de janeiro de 2015
- ↑ «Questionnaire de Proust: Professeur Choron». Institut National de l'Audiovisuel. 14 de março de 1992. Consultado em 10 de janeiro de 2015
- ↑ «Hara-Kiri, journal bête et méchant». INA.fr. 2 de outubro de 2012. Consultado em 10 de janeiro de 2015
- ↑ GIRARD Quentin (20 de maio de 2013). «La censure, même pas morte !». Libération. Consultado em 10 de janeiro de 2015
- ↑ «De Hara-Kiri à Charlie : plus de 40 ans de provocations». La Dépêche du Midi. 3 de novembro de 2011. Consultado em 10 de janeiro de 2015
- ↑ Bernard Coulange. «La mémoire de Charlie Mensuel». BD oubliées. Consultado em 10 de janeiro de 2015
- ↑ Cavanna et "les cons", Le Monde, 14 February 2014
- ↑ a b c d e f «Veja cronologia com polêmicas da 'Charlie Hebdo' e ataques à publicação». mundo. Folha online. 8 de janeiro de 2015. Consultado em 8 de janeiro de 2015
- ↑ «C'est dur d'être aimé par des cons : un film douloureux». Radio-Canada. 9 de janeiro de 2015. Consultado em 10 de janeiro de 2015
- ↑ «Caricatures : Chirac réprouve les « provocations manifestes »». Le Figaro. 8 de fevereiro de 2006. Consultado em 10 de janeiro de 2015
- ↑ REMY Jacqueline (2 de março de 2006). «Le manifeste des douze : ensemble contre le nouveau totalitarisme». L'Express. Consultado em 10 de janeiro de 2015
- ↑ a b «Revista Charlie Hebdo já havia sido atacada por charge de Maomé: Semanário satirizava todas as religiões em charges. Ataque a sede da revista deixou 12 mortos nesta quarta-feira (7).». mundo. G1. 7 de janeiro de 2015. Consultado em 8 de janeiro de 2015
- ↑ «Charlie Hebdo, um jornal pronto a avançar contra todos os tabus». Público. 7 de janeiro de 2015. Consultado em 10 de janeiro de 2015
- ↑ a b Once muertos en un tiroteo en la sede del semanario que publicó las viñetas de Mahoma ABC.es - 7 de enero de 2015
- ↑ Ataque armado contra sede de una revista satírica deja al menos 11 muertos en París 7 ene 2015 - RT
- ↑ Graciliano Rocha (8 de janeiro de 2015). «Ataque terrorista mata 12 em Paris: Criminosos invadiram redação de semanário; cartunistas mais influentes da França estão entre as vítimas». Folha mundo. Folha web. Consultado em 8 de janeiro de 2015
- ↑ The Times of India, ed. (8 de janeiro de 2015). «Charlie Hebdo will come out next week, despite bloodbath»
- ↑ BBC News, ed. (8 de janeiro de 2015). «Charlie Hebdo Attack: Magazine to publish next week». Consultado em 9 de janeiro de 2015
- ↑ «Charlie Hebdo: Pellerin veut débloquer un million d'euros». Le Figaro (em francês). 8 de janeiro de 2015. Consultado em 9 de janeiro de 2015
- ↑ Russell Brandom (8 de janeiro de 2015). The Verge, ed. «Charlie Hebdo will publish one million copies next week»
Ligações externas
editar- Charlie Hebdo
- Charlie Hebdo no Facebook
- «Entendendo Charlie Hebdo» (em inglês). Blog colaborativo com análise individual das charges