Convento de Nossa Senhora do Desterro (Monchique)
O Convento de Nossa Senhora do Desterro é um antigo convento dos frades da Terceira Ordem Regular de São Francisco, localizado no Município de Monchique, no Distrito de Faro, em Portugal. Foi fundado em 1631, por Pero da Silva.[1] A O edifício foi gravemente danificado pelo Sismo de 1755, tendo depois sido reconstruído.[2] Posteriormente foi expropriado e dividido em várias parcelas,[2] tendo sido algum tempo depois abandonado, chegando a um avançado estado de ruína.[1] Apresenta uma arquitectura no estilo Manuelino.[3] No interior destaca-se um painel de azulejos no antigo refeitório, baseado na pintura A Última Ceia, de Leonardo da Vinci.[4] O complexo do Convento incluía igualmente uma magnólia monumental, que foi classificada em 1947,[5] mas que acabou por morrer em 2016.[6]
Convento de Nossa Senhora do Desterro | |
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Vista aérea do Convento de Nossa Senhora do Desterro, em 2023. | |
Informações gerais | |
Tipo | mosteiro, património cultural |
Estilo dominante | Manuelino |
Religião | Igreja Católica |
Diocese | Diocese do Algarve |
Ano de consagração | Nossa Senhora do Desterro |
Património de Portugal | |
Classificação | Imóvel de Interesse Público (Despacho de Julho de 1981) |
DGPC | 70937 |
SIPA | 2826 |
Geografia | |
País | Portugal |
Localização | Monchique |
Coordenadas | 37° 19′ 10,67″ N, 8° 33′ 35,47″ O |
Localização do sítio em mapa dinâmico |
Descrição
editarLocalização e acessos
editarO convento está situado na encosta da Serra de Monchique,[7] num local arborizado,[1] de onde se desfruta de um amplo panorama sobre a vila de Monchique.[2]
Arquitectura e composição
editarO edifício do convento foi construído no estilo Manuelino.[1] Tem uma forma de quadrilátero, cuja zona oriental era ocupada pelo primeiro átrio, onde foi instalado um brasão de armas da família Silva, e pela nave da igreja e capela-mor.[1] No lado direito da capela-mor encontrava-se a sepultura do fundador do convento.[4] O átrio era denominado de portaria, sendo utilizado, segundo uma tradição local, para oferecer alimento aos pobres da vila.[1] A face Norte era composta por uma antiga sacristia e uma capela, enquanto que a área Sul era formada por outras celas, e a fachada da igreja com a sua torre.[1] O lado poente consistia na frente da mesma capela e por diversas celas, sendo também aí situado o refeitório e outra entrada do convento.[1] Junto aos lados do refeitório situavam-se as mesas para os frades, enquanto que ao fundo existia uma mesa mais pequena, provavelmente para o superior do convento e outros membros importantes.[1] A parede por detrás desta mesa estava decorada com um painel de azulejos, representando o quadro A Última Ceia, de Leonardo da Vinci.[1] No canto esquerdo da sala, junto à entrada, estava situado um púlpito para a leitura, enquanto que no lado direito localizava-se a cozinha.[1] No espaço central do edifício situava-se o claustro, rodeado por uma arcada com corredor, decorado como painéis de azulejos representando cruzes da Via Sacra.[1] Na face Sul do claustro estava a entrada para a casa mortuária.[1] O convento estava dedicado a Nossa Senhora do Desterro,[1] cuja imagem, de origem seiscentista, foi preservada na Ermida de São Sebastião, em Monchique.[8]
O complexo do convento incluía igualmente uma quinta, onde se situa a Fonte dos Passarinhos, que já esteve decorada com azulejos representando aves.[1] Nesta quinta também estava situada uma magnólia, que de acordo com a tradição, foi levada da Índia pelo fundador do convento, e que foi classificada como de Interesse Público em 1947.[9][1] A árvore, que chegou a ser a maior magnólia da Europa, foi considerada um dos ex-Libris do concelho de Monchique.[10] Aquando do seu falecimento, tinha um tronco com 5,58 m de perímetro à altura de 1,30 m, uma copa com cerca de 30 m de diâmetro, e uma altura de 27 m, tendo a sua idade sido calculada em mais de 200 anos.[11]
História
editarO convento foi fundado no ano de 1631 por Pero da Silva, que posteriormente ocupou a função de Vice-Rei da Índia.[1] A casa pertencia à ordem dos Franciscanos Terceiros,[12] que, segundo a obra Santuário Mariano, de frei Agostinho de Santa Maria, tomaram posse do convento em 20 de Março de 1632.[7] A sua fundação está ligada a uma lenda, na qual dois mareantes que estavam em perigo no oceano fizeram uma promessa de construir uma igreja na primeira povoação em território português que vissem à chegada.[1] Segundo a mesma lenda, um dos navegantes trazia consigo uma pequena imagem de Nossa Senhora em marfim, oriunda da Índia, que após o seu falecimento foi venerada como relíquia pelos frades do convento.[1] Segundo a tradição, durante uma tempestade em 1834, um dos frades teria levado a imagem dentro do hábito, que foi depois entregue a uma senhora para a guardar.[1] Segundo uma série de artigos publicados no jornal O Monchiquense em 1926, um dos primeiros capelães foi «Frei Agostinho da Esperança, varão de grandes virtudes, que depois foi para um convento do Bispado de Lamego, onde veiu a falecer».[4] Nestes artigos refere-se igualmente que durante os primeiros anos, os frades procuraram criar uma escola de primeiras letras no convento, no sentido de combater o forte analfabetismo na povoação.[13] Porém, só em 6 de Outubro de 1779 é que obtiveram autorização para instalar a escola, por concessão da rainha D. Maria I a Frei João da Conceição Barca.[13] Esta foi a primeira escola primária em Monchique, tendo o próprio Frei João sido o professor.[13]
O edifício foi destruído pelo Sismo de 1755, tendo sido depois reconstruído.[2] Foi encerrado em 1834, no âmbito do processo de extinção das ordens religiosas em Portugal, tendo sido nacionalizado e vendido em hasta pública em 1842.[12] Foi vendido em fracções a vários proprietários,[2] passando a ter um utilização residencial.[12] Posteriormente o complexo foi abandonado, tendo chegado a um avançado estado de ruína.[1][12] Ao longo deste período, grande parte do recheio do antigo convento foi roubado ou perdeu-se devido à degradação, como a maioria dos azulejos no refeitório,[14] embora algumas peças tenham sido conservadas na Ermida de São Sebastião, como a imagem de Nossa Senhora do Desterro, e o baldaquino e as colunas decoradas que foram integradas no retábulo da ermida.[8]
Em 1911, João Ribeiro Cristino da Silva relatou, num artigo da revista O Occidente, que a igreja do convento já se encontrava parcialmente arruinada.[15] Em 1915 terá sido feita a primeira referência à magnólia, no Boletim Trimestral da Associação Protetora da Árvore, onde foi relatado que «a soberba Magnólia de Monchique que representa a melhor árvore, do género, de que por enquanto temos conhecimento.».[6] Em 1947, a magnólia foi classificada como de Interesse Público pelo Diário do Governo n.º 105, Série II, de 8 de Maio.[9][1] Nos artigos de 1926 refere-se que o edifício do convento já estava em ruínas, embora ainda restasse algum recheio original de interesse, como uma mesa e um púlpito no refeitório, onde também se encontrava o quadro de azulejos representando a Última Ceia.[4]
Durante a década de 1970, o convento foi ocupado por várias pessoas de baixos recursos, incluindo um casal que assinou um contrato com os proprietários para o arrendamento do edifício.[16] Em 1983, a autarquia iniciou o processo para a aquisição dos terrenos do convento, tendo dois anos depois conseguido já obter várias partes do edifício.[17] Em 2003, foi aberto o concurso público internacional para a realização de obras de recuperação no edifício do convento,[17] e em 2004 o projecto foi autorizado pelo Instituto Português do Património Arquitectónico, no valor de cerca de cinco milhões de Euros.[17] Em 2007, as antigas instalações do convento estavam ocupadas por uma família de sete indivíduos, que tinham montado estruturas para animais domésticos no claustro.[17]
A magnólia morreu em 2016, após um período de doença de cerca de dez anos.[6] Em Março de 2017, a autarquia organizou uma iniciativa em sua memória, no âmbito do Dia da Árvore, que incluiu a plantação de dez magnólias por crianças, seis no local da antiga árvore, duas na Escola EB 23 Manuel do Nascimento e outras duas na Quinta da Vila, junto às Piscinas Municipais.[10] Em 29 de Abril desse ano, a Vicentina - Associação para o Desenvolvimento do Sudoeste organizou uma peça teatral no convento, no âmbito do programa Momentos Fantásticos com o Património – Sítios com história.[18] Também em 2017, a autarquia de Monchique estava a preparar a aquisição do convento, devido ao seu valor histórico e ao estado de ruína em que se encontrava.[2] Este processo foi complicado devido ao grande número de proprietários, tendo o presidente da Câmara Municipal, Rui André, explicado que a autarquia estava a propor a compra das partes cujos donos eram conhecidos, enquanto que as restantes porções seriam expropriadas.[2] O fim destas obras seria reabilitar o edifício, de forma a garantir a segurança dos visitantes, e a possibilitar a organização de eventos culturais ou religiosos na antiga igreja.[2] O passo seguinte seria a instalação de um ou hotel ou pousada de luxo que aproveitaria parcialmente o convento e os terrenos em redor.[19] O projecto aprovado em 2004 incluía a instalação de 28 camas em 24 quartos, dois dos quais em suite e outros dois preparados para mobilidade reduzida.[17] No piso térreo seriam instaladas uma recepção, um espaço para o culto religioso e outro para a sacristia, duas salas de estar de dimensões diferentes, sendo a maior ligada à sala para refeições para hóspedes, uma cozinha, instalações sanitárias e uma sala de refeições para funcionários.[17] No primeiro andar estaria a entrada principal, uma recepção com sala de estar, um escritório para a administração, treze quartos duplos, uma suite e um quarto para deficientes, e um espaço para vários serviços.[17] O segundo andar seria ocupado por sete quartos, uma sala de estar com bar, e a copa de piso.[17] Os terrenos em redor do convento também seriam recuperados, incluindo os tanques e a emblemática Fonte dos Passarinhos,[2] e seria instalada uma piscina, um espaço técnico e instalações sanitárias.[17] Neste período, também foi criada uma petição pública para reclamar a recuperação do convento e encontrar um outro alojamento para a família residente no seu interior, embora sem sucesso.[19]
Durante o Incêndio de Monchique de 2018, o edifício esteve ameaçado pelas chamas,[20] tendo sido salvo devido à intervenção dos filhos do casal, apesar da imprensa ter anunciado que o convento tinha sido destruído.[16] Em Junho de 2023, o convento foi integrado no programa estatal Revive, que tinha como finalidade proteger e valorizar o património público, e promover o seu aproveitamento como recurso económico e turístico.[14] De acordo com o presidente da Câmara Municipal, Paulo Alves, com esta medida procurou-se «encontrar uma solução para as valências turísticas e culturais» do imóvel, uma vez que iria permitir a procura por investidores privados no sentido de «reabilitar o edifício, adaptando-o a novas funções, mas mantendo na mesma uma parte de uso público, alocando ali fundos que a Câmara, só por si, não consegue reunir».[14] A autarquia era então era a proprietária quase total do antigo convento, faltando então apenas uma pequena parte, para a qual já tinha sido assinado o Contrato Promessa de Compra e Venda, embora ainda não tivessem conseguido fazer a correspondente escritura.[14] Em Julho desse ano, foi visitado pelo secretário de Estado do Turismo, tendo sido um dos pontos do município pelos quais passou como parte das sessões informativas do Roteiro + Interior Turismo.[14]
Ver também
editar- Património edificado no Município de Monchique
- Capela das Caldas de Monchique
- Capela de Nossa Senhora do Pé da Cruz (Monchique)
- Convento Franciscano de Silves
- Eremitério dos Pegos Verdes
- Ermida de Santo António (Monchique)
- Igreja Matriz de Monchique
- Igreja da Misericórdia de Monchique
- Igreja de São Sebastião
- Igreja do Senhor dos Passos
Referências
- ↑ a b c d e f g h i j k l m n o p q r s t u v «Convento de Nossa Senhora do Desterro». Câmara Municipal de Monchique. Consultado em 22 de Dezembro de 2019
- ↑ a b c d e f g h i VARELA, Ana Sofia (20 de Julho de 2017). «Câmara vai adquirir Convento de Monchique». Barlavento. Consultado em 22 de Dezembro de 2019
- ↑ «Convento de Monchique só se salvou do fogo graças a dois irmãos». ZAP / AEIOU. 11 de Agosto de 2018. Consultado em 22 de Dezembro de 2019
- ↑ a b c d «O Convento de Monchique» (PDF). O Monchiquense. Ano 1 (2). Monchique. 15 de Fevereiro de 1926. p. 2. Consultado em 28 de Abril de 2024 – via Hemeroteca Digital do Algarve
- ↑ TELLO, Ricardo (Junho de 2011). «árvores notáveis ou monumentais» (PDF). Algarve Vivo. Ano IV (42). Porches: PressRoma, Edição de Publicações Periódicas. p. 33. Consultado em 4 de Fevereiro de 2020
- ↑ a b c «Monchique Homenageou a Magnólia Centenária». IPress Journal. 22 de Março de 2017. Consultado em 22 de Dezembro de 2019
- ↑ a b «O Convento de Monchique» (PDF). O Monchiquense. Ano 1 (1). Monchique. 1 de Fevereiro de 1926. p. 2. Consultado em 28 de Abril de 2024 – via Hemeroteca Digital do Algarve
- ↑ a b «Ermida de S.Sebastião». Câmara Municipal de Monchique. Consultado em 8 de Maio de 2022
- ↑ a b Vilas e Aldeias do Algarve Rural, 2003:48
- ↑ a b COSTA, Nuno (22 de Março de 2017). «Magnólia do Convento morreu, mas Monchique não deixa apagar a sua memória». Sul Informação. Consultado em 22 de Dezembro de 2019
- ↑ «Monchique homenageou maior Magnólia da Europa no Dia da Árvore». Algarve Primeiro. 21 de Março de 2017. Consultado em 22 de Dezembro de 2019
- ↑ a b c d MARADO, Catarina Almeida, Antigos Conventos do Algarve. Um percurso pelo património da região, in RIBEIRO, Luís Bruno Ramos (Setembro de 2004). «Edifícios em ruínas». A Arquitectura Algarvia no Cinema Ficcional (Dissertação de Mestrado do Instituto Superior Manuel Teixeira Gomes). Portimão. p. 99. Consultado em 4 de Fevereiro de 2020 – via Repositório Científico Lusófona
- ↑ a b c «O Convento de Monchique» (PDF). O Monchiquense. Ano 1 (3). Monchique. 1 de Março de 1926. p. 2. Consultado em 28 de Abril de 2024 – via Hemeroteca Digital do Algarve
- ↑ a b c d e RODRIGUES, Elisabete (17 de Julho de 2023). «Investidor para o Convento de Monchique, procura-se!». Consultado em 20 de Julho de 2023
- ↑ CHRISTINO, Ribeiro (10 de Maio de 1911). «Digressão pelo oeste do Algarve» (PDF). O Occidente. XXXIV (1165). p. 103. Consultado em 4 de Fevereiro de 2020 – via Hemeroteca Digital de Lisboa
- ↑ a b RAMOS, Rosa (11 de Agosto de 2018). «Dois irmãos salvaram o convento de Monchique do fogo». Sol / SAPO. Consultado em 22 de Dezembro de 2019
- ↑ a b c d e f g h i MALHEIRO, Cecília (19 de Outubro de 2007). «Convento algarvio transformado em hotel de luxo». Açoriano Oriental. Consultado em 25 de Dezembro de 2019
- ↑ «365 Algarve - Programa Cultural Outubro 2016 a Maio 2017» (PDF). Turismo de Portugal. p. 10. Consultado em 4 de Fevereiro de 2020 – via Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Algarve
- ↑ a b «Monchique mayor determines to buy landmark convent of Nossa Senhora do Desterro» (em inglês). Algarve Daily News. 17 de Julho de 2017. Consultado em 24 de Dezembro de 2019
- ↑ REVEZ, Idálio (6 de Agosto de 2018). «Fogo volta a aproximar-se da vila de Monchique». Público. Consultado em 4 de Fevereiro de 2020
Bibliografia
editar- Vilas e Aldeias do Algarve Rural 2ª ed. Faro: Globalgarve/Alcance/In Loco/Vicentina. 2003. 171 páginas. ISBN 972-8152-27-2
Ligações externas
editar- Convento de Nossa Senhora do Desterro na base de dados SIPA da Direção-Geral do Património Cultural
- Convento de Nossa Senhora do Desterro na base de dados Ulysses da Direção-Geral do Património Cultural
- «Página sobre o Convento de Nossa Senhora do Desterro, no sítio electrónico Wikimapia»