Enchentes e deslizamentos em Caraguatatuba em 1967
As enchentes e deslizamentos de terra em Caraguatatuba em 1967, coletivamente denominadas "Hecatombe" ou "Catástrofe"[1], referem-se à ocorrência de eventos extremos decorrentes das chuvas, em Caraguatatuba, em 18 de março de 1967. As inundações ocasionaram 436 mortes, de acordo com números oficiais.[2] Cerca de 3 mil pessoas perderam suas casas, 10 bairros foram atingidos e estima-se que 30 mil árvores foram arrastadas pelo movimento de massa.[3]
Enchentes e deslizamentos de terra em Caraguatatuba em março de 1967 | |
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Duração | 18 de março de 1967 |
Vítimas | 436 mortes oficialmente, mas o número pode ser maior. |
O desastre é considerado um dos maiores do país e foi uma das razões da criação da Defesa Civil do Estado de São Paulo.[3]
Antecedentes e contexto
editarA região do Litoral Norte do Estado de São Paulo apresentou, no início do século XX, rápida expansão de atividades urbanas. À implantação da Fazenda São Sebastião, também conhecida como Fazenda dos Ingleses, em 1927, dedicada a bananicultura e citricultura, seguiu-se o estabelecimento de vasta rede ferroviária, que chegou a 120 quilômetros de expansão, com 40 ramais[4]. A Fazenda dos Ingleses situava-se na bacia do Rio Juqueriquerê, e implicou em significativa alteração das condições naturais de drenagem e escoamento de águas da região. No Censo demográfico de 1960, a cidade já apresentava 9819 habitantes, 4655 dos quais na área urbana.
Somada à antropização acelerada, as configurações naturais do município contribuem para o risco de deslizamentos. Situada entre o Oceano Atlântico e a Serra do Mar, Caraguatatuba estende-se pelas encostas daquela serra, que possuem em alguns trechos declividades superiores a 40%, o que ocasiona instabilidade e tende a facilitar movimentos de massa[1]. As condições meteorológicas do litoral norte também são sensíveis a eventos extremos, pois trata-se de uma região com alta pluviosidade, variando entre médias mensais de 41 mm (Agosto) a 210 mm (Janeiro)[5].
Segundo os jornais, chovia intensamente desde o dia 16 de março de 1967, com a chuva se intensificando à noite. A precipitação intensa era consequência de uma anomalia de precipitação no Brasil naquele mês, relacionada a sistema frontais e às condições orográficas da região[1]. O mês de março vinha sendo marcado por chuvas diárias, que se intensificaram nos dias 17 e 18. De acordo com o posto da Fazenda dos Ingleses, o índice pluviométrico do mês de março foi de 851 mm, 420 mm somente no dia 18, não tendo sido registrado índice maior devido à saturação do pluviômetro[6].
O desastre
editarDurante o dia 17 de março, sexta-feira, a chuva intermitente já ocasionava alguns pontos de inundação no município. A precipitação tornou-se volumosa na manhã do sábado, 18 de março, e começaram os deslizamentos, a maior parte deles ocorrendo à tarde. Às 13 horas ocorreu uma avalanche de pedras, árvores e lama dos morros Cruzeiro, Jaraguá e Jaraguazinho, próximos à cidade. Grandes estrondos eram ouvidos pela população, mas dado que a visibilidade estava prejudicada pela chuva (estima-se que chegava a apenas 20 metros), não era possível então avaliar a situação da cidade[6].
Por volta das 15h30, houve deslizamentos de massa, e a cidade ficou isolada. A Rodovia dos Tamoios ficou destruída e vários carros ficaram presos no trecho de serra. O acesso para Ubatuba e São Sebastião, cidades vizinhas, ficou interditado, e a ajuda só pôde chegar por mar e ar. O Rio Santo Antônio aumentou sua largura de 40 para 200 metros. A lama desceu junto com o rio.[7]
Às 16h30 outra frente abriu-se no vale do Rio Santo Antônio. No bairro Rio do Ouro gigantescas barreiras começaram a cair pela manhã, formando uma enorme represa que se rompeu algumas horas mais tarde, desaparecendo com o bairro e provocando o deslocamento da ponte principal daquele rio. Caso não tivesse acontecido o rompimento, a cidade inteira teria sido inundada e coberta pelas águas.
Como resultado, a estrada da serra foi destruída em sua maior parte, não sendo possível reconhecer seu antigo traçado em muitos trechos, onde se formaram precipícios de mais de 100 m de profundidade. A Estrada de Ubatuba sofreu queda de barreiras nos trechos de Maranduba, Getuba, Sumaré, Prainha e Martim de Sá, que cobriram a pista com 80 centímetros de lama.[8] Houve interrupção do fornecimento de energia por três dias.
A contagem oficial foi de 436 mortes. Segundo moradores, entretanto, o número teria sido maior, com muitos corpos levados pelo mar ou nunca tendo sido encontrados sob a lama. Com a dimensão do desastre, tornou-se difícil determinar o número de desaparecidos em função do desaparecimento simultâneo de quem poderia dar falta de outros moradores eventualmente atingidos.
Devido aos estragos para a lavoura, e também por conta do declínio econômico verificado desde a Segunda Guerra Mundial, a Fazenda dos Ingleses encerrou suas atividades após a enchente de 1967.
Ver também
editarReferências
- ↑ a b c Castro, Luciana M. F. B. de et ali. Mudança climática, riscos e vulnerabilidade: um estudo dos eventos ocorridos em 1967 e 1996 na planície litorânea de Caraguatatuba-SP. CLIMEP-Climatologia e Estudos da Paisagem 6.1-2 (2011). Disponível em: <https://www.periodicos.rc.biblioteca.unesp.br/index.php/climatologia/article/download/4933/4441>
- ↑ Folha: Tragédia no Rio é o maior desastre natural em número de mortes no país
- ↑ a b «Há 55 anos, deslizamento no litoral norte de São Paulo matou 450 pessoas; tragédia está entre as maiores da história». G1. Consultado em 22 de fevereiro de 2023
- ↑ «Caraguatatuba - história da Cidade». Câmara Municipal de Caragatatuba. Consultado em 23 de outubro de 2024
- ↑ «Clima, condições meteorológicas e temperatura média por mês de Caragua (São Paulo, Brasil) - Weather Spark». pt.weatherspark.com. Consultado em 23 de outubro de 2024
- ↑ a b Ribeiro, Wagner (26 de outubro de 2020). «Tromba D'água em Caraguatatuba, o relatório detalhado de um morador realizado no dia seguinte ao ocorrido». São José dos Campos Antigamente. Consultado em 23 de outubro de 2024
- ↑ Corrá, Daniel (18 de março de 2017). «Deslizamento de terra que devastou Caraguatatuba completa 50 anos». Vale do Paraíba e Região. Consultado em 22 de fevereiro de 2023
- ↑ A Catástrofe de 1967