Esfaqueamento no Centro Ismaili de Lisboa em 2023
O esfaqueamento no Centro Ismaili de Lisboa em 2023 aconteceu na manhã de 28 de Março, quando duas mulheres portuguesas, Farana Sadrudin e Mariana Jadaugy, pertencentes ao pessoal do Centro Muçulmano Ismaili em Lisboa foram mortas à facada por Abdul Bashir, um refugiado afegão matriculado no centro. [1][2][3][4]
Os acontecimentos
editarNa manhã do dia 28 de Março, cerca das 10 horas, Abdul Bashir saiu de casa com uma faca de grandes dimensões dissimulada na mochila e dirigiu-se, como era hábito, ao Centro Ismaili, para mais uma aula de língua portuguesa que frequentava, com outros colegas. Cerca de quarenta minutos depois, após atender um telefonema, atacou o professor à facada, ferindo-o no pescoço e no abdómen. [5][6]
Saindo da sala, encontrou Mariana Jadaugy, 24 anos, e Farana Sadrudin, 49. Esfaqueadas repetidas vezes, morreram no local.[5] Uma terceira mulher, cujo nome não foi divulgado, foi perseguida mas conseguiu escapar.[7]
Quando a polícia chegou ao local no minuto seguinte, foi forçada a disparar contra o homicida, atingindo-o numa perna. Foi conduzido ao hospital, onde ficou internado sob custódia , tendo sido submetido a operações.[5]
As vítimas
editarO professor de língua portuguesa ficou ferido e recebeu tratamento médico para ferimentos nas zonas do pescoço e cabeça no Hospital de Santa Maria recebendo alta hospitalar no mesmo dia do ataque. [8]
Farana Sahbudin Sadrudin, de 49 anos de idade e nacionalidade portuguesa, era a gerente e a principal responsável pela fundação Focus Europa, uma associação de assistência humanitária , era diplomada em Engenharia Informática, e trabalhara também para a seguradora AXA em Portugal, Espanha e Marrocos. Farana Sadrudin era sobrinha de Nazim Ahmad,o líder da comunidade ismaelita em Portugal.[9][1]
Mariana Jadaugy, de 24 anos de idade, pertencia à comunidade muçulmana Ismaili, desempenhava as funções de assistente social e “tinha em mãos o processo de naturalização” de Abdul Bashir. Era licenciada em Ciência Política e Relações Internacionais pela Universidade Nova de Lisboa, e concluira o mestrado de Ciências Sociais e Desenvolvimento no Instituto Superior de Economia e Gestão da Universidade de Lisboa (ISEG) em 2019.[1]
As duas vítimas mortais eram diretamente responsáveis pelo processo de integração social de Bashir em Portugal, um serviço que fornecia gratuitamente alojamento e alimentação à sua família [10][11] e preparava o seu pedido de naturalização.[12][13][14]
O criminoso
editarAbdul Bashir, de 28 anos de idade, era um refugiado afegão, vúvo e pai de 3 filhos menores, que chegara a Portugal, vindo da Grécia, onde sua esposa teria morrido num campo de refugiados, ao abrigo de um acordo com o governo português. [15]
Ele havia sido técnico de telecomunicações em Cabul , onde trabalhara para a Huawei, havia saído do Afeganistão por volta de 2015 e chegado ao campo de refugiados grego em 2019.[16]
Num vídeo de 2021 feito enquanto vivia no campo de refugiados grego, Abdul Bashir lamentou, em inglês, a morte da sua esposa num incêndio no campo cinco meses após sua chegada como imigrantes irregulares em Lesbos , na Grécia, afirmando que sua vida era muito difícil para ele e seus três filhos, e falou sobre seus pedidos de ajuda dirigidos ao ACNUR e de seu diploma de engenharia de telecomunicações.[17] Em Outubro de 2021, foi recolocado em Portugal ao abrigo do sistema formal de reinstalação de refugiados da UE, através de um acordo bilateral Grécia-Portugal com a ajuda da Fundação Aga Khan , e recebeu apoio (aconselhamento administrativo, alimentação e abrigo, aulas de língua portuguesa e aulas de costura) do Centro Ismaili de Lisboa até à data do ataque. [18] Ele procurava ativamente um emprego em Portugal, mas sem sucesso, uma situação que o deixava frustrado.[19] Depois de chegar ao território da UE, Bashir tinha solicitado o estatuto de refugiado na Alemanha, mas as suas pretensões foram rejeitadas pelas autoridades alemãs.[20] À data do crime ainda tentava sair de Portugal e mudar-se para a Alemanha com os filhos. [21]
Em Portugal, Bashir vivia com os três filhos de 9, 7 e 4 anos num apartamento arrendado em Odivelas, que era pago pelo Centro Ismaili. Ele era descrito por vizinhos e empregados de uma padaria próxima como um pai atencioso e uma pessoa calma e educada, que não falava português. [22]
Investigações
editarO telefonema que Abdul Bashir recebera enquanto estava na sala de aula na manhã do dia do crime, informava-o que não poderia viajar para Zurique, na Suiça, como planeara, por falta de um documento oficial que não lhe fora concedido. [23]Uma vez lá, ele poderia ter desejado ficar na Suíça ou chegar à Alemanha, onde já havia estado, mas de onde fora enviado de volta para Lisboa, [24] por ter sido Portugal que lhe concedeu o estatuto de refugiado.[25] Após o telefonema, Bashir usou a faca que trouxera escondida na mochila para iniciar o ataque.[6][26]
Várias fontes afirmam que Bashir estava sexualmente interessado na mulher mais jovem, Mariana Jadaugy, que ele matou naquele dia.[27][28][7] Declarações iniciais da Polícia Judiciária a 29 de Março descartaram o terrorismo como motivação do crime e falam antes de "surto psicótico", [29] mas em 31 de Março o Ministério Público afirmou que não descartaria o terrorismo como motivo. [30]
Ao mesmo tempo, de acordo com a polícia grega, ele era considerado suspeito do incêndio no campo de refugiados grego que matou a sua própria esposa. [31] A polícia grega notou que Abdul Bashir salvou os seus filhos do incêndio, mas não disse aos bombeiros que a esposa ainda estava dentro da casa.[32][33]
Bashir assediava constantemente, há vários meses, a vítima Farana Sadrudin e enviava-lhe constantes telefonemas e mensagens. Segundo o canal televisivo SIC, o criminoso desejava que ela fosse viver com ele, tomando conta dos seus três filhos.[34] O afegão já tinha demonstrado um comportamento violento. A irmã desta vítima aponta ser do seu conhecimento um caso complicado de um afegão no centro de apoio, "rude, arrogante e impulsivo" que ela pensa ser precisamente Bashir. [19][35] A jornalista Maria João Marques aponta possíveis motivações culturais e/ou religiosas para os crimes, notando o facto de que no Afeganistão "matar mulheres é tão comum como degolar uma galinha", mencionando porém ao mesmo tempo que em Portugal não existem problemas com as comunidades imigrantes.[36]
Referências
- ↑ a b c Duarte, José Carlos (e outros) (28 de Março de 2023). «A assistente social de 24 anos e a gerente "extraordinária" de 49 anos: as vítimas do ataque no Centro Ismaili». Observador
- ↑ Carmo, Daniela (29 de Março de 2023). «Homicídios no Centro Ismaili: vizinhos falam em pessoa pacata. Naquela manhã "não parecia nervoso"». Público
- ↑ Preussen, Wilhelmine (28 de Março de 2023). «Knife attacker kills 2 at Islamic center in Lisbon». Politico (em inglês)
- ↑ «Portugal : deux morts dans l'attaque au couteau d'un centre musulman à Lisbonne». Le Monde (em francês). 28 de março de 2023
- ↑ a b c Santos, Joao Amaral (29 de Março de 2023). «As 24 horas que trouxeram a morte e a tristeza ao sereno Centro Ismaili de Lisboa». Visão
- ↑ a b França, Ana (e outros) (30 de Março de 2023). «Centro Ismaelita: Abdul saiu de casa com a faca escondida entre livros e cadernos com a intenção de matar quem matou». Expresso
- ↑ a b Machado, Henrique (29 de Março de 2023). «Testemunhas revelam à PJ obsessão de Bashir pela vítima mais nova». CNN Portugal. Consultado em 21 de abril de 2023
- ↑ «Professor já teve alta após ataque ao Centro Ismaelita». Rádio Renascença. 28 de março de 2023
- ↑ Coelho, Maria Carolina (29 de março de 2023). «Vítima de ataque ao Centro Ismaili era diplomada pelo Instituto Politécnico de Setúbal». O Setubalense
- ↑ Laranjo, Tânia (28 de Março de 2023). «Vive em Odivelas, tem 28 anos e três filhos: Quem é o homem que matou duas mulheres no Centro Ismaelita». Correio da Manhã
- ↑ «Não tinha atividade de trabalho e o apartamento onde vivia era pago pelo Centro Ismaili: há novas informações sobre Abdul Bashir». MSN. 30 de Março de 2023
- ↑ «Ataque no Centro Ismaili: vítima estava encarregada da naturalização do agressor». SIC Notícias. 29 de Março de 2023
- ↑ Santos, João Amaral (28 de março de 2023). «Quem eram Mariana e Farana, as vítimas mortais do ataque no Centro Ismaili». Visão
- ↑ Miranda, Andreia (28 de Março de 2023). «Mariana e Farana, as vítimas mortais do ataque ao Centro Ismaili». CNN Portugal
- ↑ «Quem é Abdul Bashir, o atacante do centro Ismaili?». CNN Portugal. 28 de Março de 2023
- ↑ Duarte, José Carlos (1 de Abril de 2023). «Trabalhou na Huawei, viveu o inferno de Lesbos e procurava trabalho. A vida de Abdul Bashir, entre Cabul e Odivelas». Observador
- ↑ «"Condições de vida muito difíceis", explica em vídeo o autor do ataque ao Centro Ismaili». SAPO 24. 28 de Março de 2023
- ↑ «Quem é Abdul Bashir, o homem que atacou o Centro Ismaili?». SIC Notícias. 29 de Março de 2023
- ↑ a b «Abdul Bashir já tinha mostrado comportamentos violentos antes do ataque». Novo. 31 de Março de 2023
- ↑ Banha, Inês (28 de Março de 2023). «Refugiado afegão, pai e viúvo: o perfil do atacante ao Centro Ismaili de Lisboa». Jornal de Notícias
- ↑ «Suspeito ia viajar para a Alemanha». Record TV Europa. 30 de março de 2023
- ↑ “Vinha aqui todos os dias com os dois mais pequenos, educado, ninguém iria suspeitar”. Como os vizinhos descrevem Abdul Bashir, consultado em 7 de abril de 2023
- ↑ «Recusa de documentos para viajar com os filhos pode ter precipitado ataque de Abdul». ZAP Notícias. 30 de março de 2023
- ↑ Duarte, José Carlos (1 de Abril de 2023). «Trabalhou na Huawei, viveu o inferno de Lesbos e procurava trabalho. A vida de Abdul Bashir, entre Cabul e Odivelas». Observador
- ↑ Cardoso, Francisco José (30 de Março de 2023). «Abdul mata após alegada recusa de documento para viajar com os filhos». Diário de Notícias da Madeira
- ↑ «Recusa de documento para viajar para a Suíça pode ter levado ao ataque no Centro Ismaili». SAPO 24. 30 de Março de 2023
- ↑ Panda, Alexandre (e outros) (30 de março de 2023). «Abdul mata após recusa de documento para viajar com os filhos». Jornal de Notícias (Arq, em WayBack Machine)
- ↑ Gomes, Cláudia (30 de Março de 2023). «Ataque no Centro Ismaili. Abdul Bashir teria interesse amoroso por uma das vítimas, revelam testemunhas». MAGG
- ↑ «PJ afasta indícios de terrorismo e aponta para ″surto psicótico″». Diário de Noticias. 29 de Março de 2023
- ↑ Lima, Carlos R. (31 de março de 2023). «Ministério Público não descarta crime de terrorismo no Centro Ismaili». Visão (Arq. em WayBack Machine)
- ↑ «Homicida do Centro Ismaelita recusou ajuda psicológica. Abdul é suspeito de matar a mulher -». ZAP Notícias. 1 de abril de 2023
- ↑ Laranjo, Tânia (1 de abril de 2023). «Autor de massacre no Centro Ismaili é suspeito de matar a mulher na Grécia». Correio da Manhã (Arq. em WayBack Machine)
- ↑ «Ataque no Centro Ismaili; Afegão estará a ser investigado também pela morte da sua mulher». Sapo (Arq. em WayBack Machine). 1 de Abril de 2023
- ↑ «Ataque no Centro Ismaili: vítima recebia mensagens insistentes de Abdul Bashir». MSN. 30 de Março de 2023
- ↑ Guerreiro, Catarina (28 de Março de 2023). «"A minha irmã trabalhava de coração para ajudar os refugiados": Farid, irmão de Farana Sadrudin (uma das vítimas do ataque no Centro Ismaili)». CNN Portugal
- ↑ Marques, Maria João (29 de Março de 2023). «O atentado do criminoso fofinho». Público