Fundação Ford: diferenças entre revisões

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Estou começando a achar que alguns aqui são os famosos bolsistas dessa fundação. Amigos, isso aqui não é site apologético. O artigo que escrevi traz fontes. Podem verificá-las.
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== História ==
'''As origens: de 1936 a 1945'''
A Fundação Ford foi fundada em 1934 em Detroit.<ref>Frédéric Martel, ''De la culture en Amérique'', Paris, Gallimard, 2006, {{ISBN|2070779319}}, p.308</ref> Inicialmente, ela se dedicava a colaborar localmente, em seguida, ele cresceu e diversificou suas doações. Em 1950-1960, sob a liderança do presidente Henry Heald, a Fundação Ford ajudou universidades americanas e a divulgação da arte.<ref>Frédéric Martel, ''De la culture en Amérique'', Paris, Gallimard, 2006, {{ISBN|2070779319}}, p.311</ref> Ele subsidiou orquestras americanas com 80 milhões de US$;<ref>Frédéric Martel, ''De la culture en Amérique'', Paris, Gallimard, 2006, {{ISBN|2070779319}}, p.94</ref> distribuindo grandes somas para balés, teatros, etc: na década de 1960, a Fundação Ford era a que tinha mais fundos dos Estados Unidos.<ref>Frédéric Martel, ''De la culture en Amérique'', Paris, Gallimard, 2006, {{ISBN|2070779319}}, p.317</ref> Entre 1966 e 1986, distribui $ 200 milhões a mais de 1.000 Comunidade de Desenvolvimento da Corporations,<ref>Frédéric Martel, ''De la culture en Amérique'', Paris, Gallimard, 2006, {{ISBN|2070779319}}p. 468</ref> as organizações em bairros difíceis cuja finalidade é desenvolver atividades culturais.
 
Em uma cerimônia solene ocorrida na cidade de Dearborn, em Michigan, nos Estados Unidos, no dia 30 de julho de 1938, o cônsul da Alemanha acreditado em Cleveland, Karl Krapp, e seu congênere em Detroit, Fritz Heller, presentearam o industrial estadunidense Henry Ford pelo dia do seu aniversário. A pedido do führer, ofereceram-lhe a Grã-Cruz da Ordem da Águia Alemã (Großkreuz des Deutschen Adlerordens). Essa alta condecoração do Estado alemão havia sido criada no ano anterior por [[Adolf Hitler]] com o intuito de homenagear estrangeiros que desfrutavam da sua admiração. Outros dois indivíduos que receberam a referida medalha honorífica foram Benito Mussolini e o espanhol Francisco Franco.
Desde o início do século XXI, a Fundação Ford distribui aproximadamente 80 milhões de USD por ano para instituições culturais e artísticas.<ref>Frédéric Martel, ''De la culture en Amérique'', Paris, Gallimard, 2006, {{ISBN|2070779319}}, p.324</ref> Na França, financia entre outras o ''[[SOS Racisme]]'',<ref>[http://mobile.agoravox.fr/actualites/citoyennete/article/qui-finance-sos-racisme-79224 Qui finance SOS Racisme ?]</ref> o ''[[Conseil représentatif des associations noires de France]]'',<ref>[http://patricklozes.blogs.nouvelobs.com/archive/2009/04/index.html La mesure de la diversité souhaitée par le CRAN est majoritaire est France]</ref> e o ''L’Institut français des relations internationales'',<ref>{{Citar web |url=http://www.utpba.net/article13444.html |titulo=Pourquoi la Fondation Ford subventionne la contestation |acessodata=2014-08-30 |arquivourl=https://web.archive.org/web/20071214130915/http://www.utpba.net/article13444.html |arquivodata=2007-12-14 |urlmorta=yes }}</ref> e também no passado, a ''Futuribles''<ref>{{Citar web |url=http://www.futuribles.com/pdf/Historique%20de%20la%20revue.pdf |titulo=Naissance et histoire d'une revue de prospective |acessodata=2014-08-30 |arquivourl=https://web.archive.org/web/20120608095518/http://www.futuribles.com/pdf/Historique%20de%20la%20revue.pdf |arquivodata=2012-06-08 |urlmorta=yes }}</ref> e o Congrès pour la liberté de la culture,<ref>[http://www.cairn.info/revue-vingtieme-siecle-revue-d-histoire-2002-4-page-65.htm La diplomatie culturelle de la fondation Ford]</ref>, e a [[Repórteres sem Fronteiras]].<ref>[http://www.legrandsoir.info/Les-114-000-liens-entre-la-CIA-et-une-ONG-francaise.html Les liens a une ONG française.]</ref>
 
Adolf Hitler há muito manifestava uma forte simpatia por Henry Ford e manteve uma foto dele em seu escritório em Munique. No início dos anos 1920, Henry Ford escreveu execráveis escritos antisemitas, os panfletos The International Jews: The World`s Problem, transformados ulteriormente em livro e que inspiraram o líder nazista na sua perseguição implacável aos judeus na Europa. Traduzidos para a língua alemã, os escritos de Ford tiveram ampla circulação nos meios nazistas antes de 1933. Por essa razão, a primeira edição de Mein Kampf Hitler, dedicou a Henry Ford.
Em 1 de Julho de 2009, a Fundação Ford doou US $ 300.000 para a [[Wikimedia|Fundação Wikimedia]] para apoiar o desenvolvimento da plataforma multimídia [[Wikimedia Commons]].<ref>« [http://wikimediafoundation.org/wiki/Press_releases/Wikimedia_Ford_Foundation_Grant_July_2009 {{lang|en|Wikimedia Foundation receives Ford Foundation grant to grow Wikimedia Commons, a free educational media repository}}] », comunicado a imprensa pela wikimediafoundation.org</ref>
 
Afora as concepções lunáticas da existência de uma conspiração judaico-comunista internacional contra a qual ambos lutavam, a admiração de Hitler por Henry Ford advinha também dos métodos de racionalização industrial. Essa racionalização serviria como exemplo tanto ao modelo industrial do Reich, como ao sistema, igualmente fabril, de extermínio bárbaro de milhões de pessoas em campos de concentração, a exemplo de Auschwitz, Sobibor e Treblinka.
Exceto pelo seu nome , a Fundação Ford não tem nenhuma ligação com a Ford Motor Company e a família Ford há mais de trinta anos. Henry Ford II, o último membro da família no conselho de administração demitiu-se do conselho da fundação , em 1976.
 
Desde os anos 1920, Ford vinha contribuindo com o financiamento do Partido Nacional-Socialista na Alemanha e enviava de 10 a 20 mil marcos alemães como presente de aniversário para Adolf Hitler todos os anos, até 1944. <ref>{{Citar periódico|ultimo=Moniz Bandeira|primeiro=Luiz Alberto|data=2016|titulo=Der zweite Kalte Krieg – ein Anfangspanorama|url=http://dx.doi.org/10.1007/978-3-658-09414-0_3|local=Wiesbaden|publicado=Springer Fachmedien Wiesbaden|paginas=27–44|isbn=9783658094133}}</ref> Nos Estados Unidos, Henry Ford manteve um [[Nazismo nos Estados Unidos|sistema]] conhecido pelos críticos como a “Gestapo de Ford”, o que também lhe rendeu o apelido dado pelo New York Times, em 1928, de “Mussolini do Highland Park”.<ref>{{Citar periódico|data=2017-01-12|titulo=4. Die Verfolgung von Repressionen|url=http://dx.doi.org/10.1515/9783110521184-006|local=Berlin, Boston|publicado=De Gruyter|isbn=9783110521184}}</ref>
 
Ford, além de perseguir e reprimir sindicalistas, organizou um sistema de vigilância e controle da vida privada de seus funcionários, por meio da criação de um Departamento de Sociologia da Ford Motor Company. Tal órgão procurava intervir nos aspectos privados dos trabalhadores das fábricas, como moradia, alimentação, lazer e modo de vida. Ford até mesmo contratou um ex-pugilista que serviu como “fiscalizador” do serviço privado de repressão política e social aos trabalhadores da Ford em Dearborn e que lhes fazia visitas inesperadas em seus lares. <ref>{{Citar periódico|data=2017-01-12|titulo=4. Die Verfolgung von Repressionen|url=http://dx.doi.org/10.1515/9783110521184-006|local=Berlin, Boston|publicado=De Gruyter|isbn=9783110521184}}</ref>
 
A condecoração de Henry Ford com o maior título honorífico dado a estrangeiros pelo governo nazista nada mais foi do que um reconhecimento inter pares. Dois anos antes, no início de 1936, Edsel Ford, filho de Henry Ford e então presidente da Ford Motor Company anunciou a criação da Fundação Ford, que tinha por objetivo dispender recursos “à caridade, à educação e à ciência”. Mas, de fato, a criação da fundação filantrópica familiar servia a interesses econômicos muito claros aos contemporâneos.
 
Em 1934, um grupo de empresários, banqueiros e oficiais militares estadunidenses patrocinaram uma tentativa de golpe de Estado contra o presidente Franklin D. Roosevelt, golpe esse que visava à instauração de um regime filofascista nos Estados Unidos.<ref>{{Citar periódico|ultimo=Moniz-Bandeira|primeiro=Luiz Alberto|data=2013|titulo=Wachstumsmarkt Brasilien|url=http://dx.doi.org/10.1007/978-3-658-02202-0|doi=10.1007/978-3-658-02202-0}}</ref> Malfadada a tentativa de golpe contra Roosevelt e no contexto econômico do New Deal, em 1935, o Congresso dos Estados Unidos aprovou o Revenue Act, uma espécie de taxação de grandes fortunas que chegava à casa dos 70%. <ref>{{Citar periódico|ultimo=Chaves|primeiro=Wanderson da Silva|titulo=O Brasil e a recriação da questão racial no pós-guerra: um percurso através da história da Fundação Ford|url=http://dx.doi.org/10.11606/t.8.2012.tde-22082012-111507}}</ref>
 
O maior prejudicado com a nova legislação seria justamente a multimilionária família Ford. Para dissimular do fisco a cobrança dos novos impostos foi, portanto, criada a Fundação Ford, transferindo-se, assim, 90% das ações da Ford Motor Co. pertecentes à família para a nova entidade “filantrópica”. Desde então, diferentemente do que se pensa, a Fundação Ford tornou-se a proprietária da Ford Motor Company. <ref>{{Citar web|titulo=HUG 26, ff. 078r-v, inc. Hoc idem est gravitas corporis quod conatus|url=http://dx.doi.org/10.1163/2468-0303-cohu_26-054|obra=Codices Hugeniani Online|acessodata=2019-11-03}}</ref> Os três únicos diretores da Fundação Ford no período eram Edsel Ford, presidente da Ford Motor Co. e igualmente presidente da Fundação; Bert J. Craig, secretário e tesoureiro da Ford Motor Co; e Clifford Longley, advogado da Ford Motor Co.
 
Pressionada pelo governo a dar, então, início a qualquer atividade filantrópica de relevo, a Fundação Ford anunciou, em dezembro de 1937, a doação de um terreno em Dearborn, Michigan, EUA, para a construção de quatro mil “moradias modelo” para operários locais. A Ford doou o terreno e o projeto, enquanto a construção ficaria a cargo de outros empresários que tivessem interesse no empreendimento. Originalmente anunciado como filantropia a operários, pelos baixos custos de aluguel ou venda, logo o projeto foi desconfigurado, tornando-se um empreendimento imobiliário de mais alto padrão, com centro de negócios, escolas, clínicas médicas, lojas, entre outros. De acordo com uma matéria da época, a iniciativa passou a beneficiar trabalhadores de “white collar”, conforme a expressão do jornal <ref>{{citar livro|título=De La Crosse Tribune, La Crosse, Winconsin, EUA, 6 jul. 1939.|ultimo=|primeiro=|editora=|ano=|local=|páginas=|acessodata=}}</ref>.
 
Essa foi a única iniciativa “filantrópica” da entidade que teve ampla repercussão antes de 1945. O real interesse por trás da criação da Fundação, i.e., dissimular a fortuna familiar adquirida ao longo dos anos de exploração da classe trabalhadora pela Ford Motor Co., fez com que ela permanecesse inexpressiva nas suas ações “humanitárias” durante os primeiros dez anos de existência. Já na Europa, a Ford Motor Co. mantinha fortes investimentos econômicos desde os anos 1920. Em particular, na Inglaterra e na Alemanha. Neste último, encontrou certas dificuldades decorrentes da ascensão do nacionalismo de ultra-direita no país, uma vez que parte da população sabotava a compra de produtos de empresas estrangeiras. Mesmo assim, a relação com o governo nazista que ascendeu em 1933 era mais amena e a Ford fabricou um terço dos caminhões do exército nazista, por exemplo, e dobrou de tamanho na Alemanha entre 1939 e 1945 <ref>{{Citar periódico|ultimo=Lima|primeiro=Claudia Silva|data=2017-03-09|titulo=OS PRESSUPOSTOS DE UM DEBATE: Teoria, Método e Ensino de História|url=http://dx.doi.org/10.18764/2446-6549/interespaco.v2n6p324-343|jornal=InterEspaço: Revista de Geografia e Interdisciplinaridade|volume=2|numero=6|paginas=324|doi=10.18764/2446-6549/interespaco.v2n6p324-343|issn=2446-6549}}</ref>.
 
Entre 1941 e 1945, a subsidiária da Ford Motor Co. em Colônia, na Alemanha, a FordWerke, utilizou, inclusive, trabalho escravo de presos estrangeiros e judeus, oriundos da Europa Oriental, da União Soviética, da Itália e da França. A própria Ford Motor Co. em 1998 abriu um amplo processo de investigação interna sobre a conduta da sua subsidiária na Alemanha, provocada por processos legais de sobreviventes do Holocausto que foram movidos contra a empresa por haverem trabalhado como escravos na FordWerke <ref>{{Citar periódico|ultimo=BAJOHR|primeiro=FRANK|titulo=No “Volksgenossen”:|url=http://dx.doi.org/10.2307/j.ctv301hb7.5|publicado=Princeton University Press|paginas=45–65|isbn=9780691188355}}</ref>.
 
Esses são alguns poucos e relevantes fatos do período de origem da Fundação Ford. Frente à oposição política que a família Ford mantinha ao governo de Franklin D. Roosevelt, até o final da II Guerra, a Fundação não atuou em parceria com o governo dos Estados Unidos. E suas atividades de caridade restringiam-se a poucas iniciativas em Michigan. A relação estreita com o Departamento de Estado e os órgãos de inteligência estadunidenses passaria a ocorrer a partir do início da chamada Guerra Fria.
 
'''Pós-Guerra e Guerra Fria: de 1945 aos anos 1960'''
 
Com o término da Segunda Guerra Mundial, grandes empresários e financistas estadunidenses, muitos dos quais haviam apoiado a ascensão do nazi-fascismo na Europa, bem como muitos quadros técnicos do partido nazista alemão, passaram a colaborar com os Estados Unidos num esforço pela hegemonia global e pelo combate à expansão do comunismo. Entre os frustrados com a derrota nazi-fascista encontrava-se a família Ford, que passaria então a atuar junto à política externa dos Estados Unidos a fim de justificar a série de isenções de impostos que obtivera com a criação da sua fundação “filantrópica” em 1936.
 
Em 1943, porém, faleceu Edsel Ford, o primeiro presidente da Fundação e presidente da Ford Motor Co. O patrono, Henry Ford, faleceu quatro anos depois, em 1947. Por esta razão, as presidências da Fundação Ford e da Ford Motor Co. ficaram a cargo do filho de Edsel, Henry Ford II. Ele é quem vai reestruturar a Fundação Ford, fazendo com que a entidade passasse a atuar na política internacional, como ocorre ainda hoje.
 
O intuito aqui não é o de enumerar as diversas atividades e financiamentos promovidos pela Fundação Ford ao longo dos anos, porque isso excederia muito os objetivos desse artigo, não havendo, ademais, um levantamento exaustivo dessas atividades. Optou-se apenas pela apresentação de dados dos principais indivíduos que compuseram o ''staff'' da Fundação Ford, destacando suas relações com o aparato estatal dos Estados Unidos e seu complexo industrial-militar-acadêmico.
 
A partir de 1947, no contexto do lançamento da Doutrina Truman, a Fundação Ford passou por uma reestruturação que, em razão da sua expansão à atuação internacional, necessitava operar em parceria com o Departamento de Estado e os órgãos de inteligência dos Estados Unidos, como com a recém-fundada Agência Central de Inteligência, a CIA.
 
Essas novas diretrizes da entidade foram elaboradas por um conjunto de indivíduos, entre os quais o então presidente da entidade, Henry Ford II, Ernest Kanzler, antigo executivo da Ford Motor Co.,Donald K. David, da Harvard Business School, e Karl T.Compton, presidente do Massachusetts Institute of Technology. Mas, o principal formulador da perspectiva de internacionalização da Fundação foi Horace Rowan Gaither Jr.
 
Durante a Segunda Guerra Mundial, Donald David e Karl Compton eram elementos de ligação entre a industria armamentista e as pesquisas acadêmicas nos Estados Unidos <ref>{{Citar periódico|ultimo=Chaves|primeiro=Wanderson da Silva|titulo=O Brasil e a recriação da questão racial no pós-guerra: um percurso através da história da Fundação Ford|url=http://dx.doi.org/10.11606/t.8.2012.tde-22082012-111507}}</ref>. Já Horace Rowan Gaither Jr. era um executivo de corporações privadas ligadas ao Departamento de Defesa e ao Exército dos Estados Unidos, como a RAND Corporation e MITRE Corporation <ref>{{Citar periódico|ultimo=Chaves|primeiro=Wanderson da Silva|titulo=O Brasil e a recriação da questão racial no pós-guerra: um percurso através da história da Fundação Ford|url=http://dx.doi.org/10.11606/t.8.2012.tde-22082012-111507}}</ref>.
 
O primeiro presidente da Fundação, fora dos quadros de diretores da Ford Motor Co.,foi Paul G. Hoffmann. Entre 1948 e 1950, Paul Hoffmann havia sido diretor-chefe da Administração de Cooperação Econômica, organismo que administrava o Plano Marshall na Europa depois da Guerra . No período em que ocupou a presidência da Fundação Ford, apareceram as primeiras denúncias da relação entre a entidade e atividades clandestinas do serviço secreto estadunidense no exterior.
 
Em dezembro de 1951, por exemplo, o presidente Harry Truman nomeou como embaixador na União Soviética George F. Kennan. Kennan era um especialista em política soviética e foi o formulador da política de “contenção” do comunismo.  Em 1944, Kennan já havia composto a embaixada dos Estados Unidos em Moscou. Quando retornou aos Estados Unidos, em 1946, ocupou cargo no Colégio de Guerra e no Departamento de Estado. Entre 1949 e 1950, Kennan “licenciou-se” das suas funções públicas, passando a trabalhar para a Fundação Ford, no seu Fundo do Oriente Europeu para o Entedimento Internacional.
 
Quando foi novamente nomeado ao cargo de embaixador em Moscou no final do ano de 1951, o Pravda, órgão oficial de imprensa soviética, denunciou Kennan como sendo o responsável pela distribuição de fundos da Fundação Ford para auxiliar “''organizações anti-soviéticas''” <ref>{{citar livro|título=O Estado de S. Paulo, 28 dez. 1951|ultimo=|primeiro=|editora=|ano=|local=|páginas=|acessodata=}}</ref>. A nota dizia ainda que o objetivo de tais doações era o de “''fomentar atividades clandestinas''” no país <ref>{{Citar periódico|ultimo=PEDRUCE FONSECA|primeiro=LETICIA|titulo=A CONSTRUÇÃO VISUAL DO JORNAL DO BRASIL NA PRIMEIRA METADE DO SÉCULO XX|url=http://dx.doi.org/10.17771/pucrio.acad.11855}}</ref>.
 
Em 1952, com a campanha presidencial do ex-comandante supremo das Forças Aliadas na Europa e ex-comandante supremo da OTAN, o general Dwight Eisenhower, Paul Hoffmann fundou, e igualmente presidiu, a Liga dos Cidadãos Favoráveis a Eisenhower. No mesmo ano, Hoffman trouxe para a Fundação Ford ninguém menos que Richard Bissel, chefe do serviço clandestino da CIA <ref>{{Citar periódico|ultimo=Bandeira|primeiro=L. A. Moniz|data=1998-06|titulo=A Guerra do Chaco|url=http://dx.doi.org/10.1590/s0034-73291998000100008|jornal=Revista Brasileira de Política Internacional|volume=41|numero=1|paginas=162–197|doi=10.1590/s0034-73291998000100008|issn=0034-7329}}</ref> e que havia trabalhado com ele na administração do Plano Marshall. Como membro da agência de inteligência, Richard Bissel era muito próximo de Allen Dulles, que, com a administração Eisenhower, tornou-se o diretor geral da CIA. Bissel recebeu o convite de Dulles para ser seu principal assistente na agência em 1954 e deixou a Ford. <ref>{{Citar periódico|ultimo=Blitz|primeiro=David|data=2001-12-31|titulo=Cultural Cold War [review of Frances Stonor Saunders, <i>The Cultural Cold War: the CIA and the World of Arts and Letters</i>]|url=http://dx.doi.org/10.15173/russell.v21i2.2009|jornal=Russell: the Journal of Bertrand Russell Studies|volume=21|numero=2|doi=10.15173/russell.v21i2.2009|issn=1913-8032}}</ref> Na Fundação, Bissel obteve o auxílio de Allen Dulles e outros altos oficiais colegas seus da CIA na formulação de várias ações da Fundação Ford pelo mundo <ref>{{Citar periódico|ultimo=Blitz|primeiro=David|data=2001-12-31|titulo=Cultural Cold War [review of Frances Stonor Saunders, <i>The Cultural Cold War: the CIA and the World of Arts and Letters</i>]|url=http://dx.doi.org/10.15173/russell.v21i2.2009|jornal=Russell: the Journal of Bertrand Russell Studies|volume=21|numero=2|doi=10.15173/russell.v21i2.2009|issn=1913-8032}}</ref>.
 
Também em 1953, ingressou na Fundação Ford, Frank Lindsay, antigo veterano do OSS – ''Office of Strategic Service'' (órgão precursor da CIA). Como Bissel, Lindsay foi um dos primeiros formuladores, em 1947, de técnicas de operações encobertas do serviço secreto dos Estados Unidos. Lindsay foi levado para a Fundação Ford por um de seus diretores, Waldemar Nielsen, também um agente da CIA <ref>{{Citar web|titulo=Supplementum Epigraphicum GraecumSyracuse. Op. cit. 119, n. 29.|url=http://dx.doi.org/10.1163/1874-6772_seg_a4_26|obra=Supplementum Epigraphicum Graecum|acessodata=2019-11-03}}</ref>.
 
Em 1954, foi empossado o novo presidente da Fundação Ford: John McCloy. Antes de ocupar esse cargo, McCloy havia sido Secretário Assistente do Ministério da Guerra dos Estados Unidos durante a II Guerra Mundial. Depois do conflito, foi Alto Comissário da Alemanha ocupada, foi presidente do Banco Mundial e presidente do Chase Manhattan Bank, pertencente à família Rockefeller. Além de ser diretor de grandes corporações, McCloy foi advogado em ''Wall Street'', representando nessa posição as maiores empresas petrolíferas dos Estados Unidos. Como Alto Comissário da Alemanha ocupada, trabalhou junto com os órgãos de inteligência dos Estados Unidos na Europa no final da Segunda Guerra Mundial, período em que vários quadros técnicos do nazismo passaram a trabalhar para os Estados Unidos <ref>{{citar livro|título=Biografia de John McCloy no sítio eletrônico do Bando Mundial; PETRAS, James. The Ford Foundation and the CIA. Rebellion, 5 dez. 2001; STONOR, Francis Saunders. Op. cit. p. 120.|ultimo=|primeiro=|editora=|ano=|local=|páginas=|acessodata=}}</ref>.
 
Em 1953, com John McCloy a frente da Fundação Ford, Shepard Stone também ingressou na instituição na área de Relações Internacionais. Shepard Stone havia trabalhado com McCloy como assessor de relações públicas no período em que o segundo fora alto comissário da ocupação da Alemanha depois da Guerra e, depois de ter “recusado” ocupar um cargo na área de operações psicológicas (psy-ops) na CIA, passou a trabalhar para a Fundação Ford <ref>{{Citar periódico|data=2007-12-01|titulo=Stonor, Oswald Francis Gerard, (3 June 1872–22 June 1940)|url=http://dx.doi.org/10.1093/ww/9780199540884.013.u217704|jornal=Who Was Who|publicado=Oxford University Press}}</ref>.
 
O presidente seguinte da Fundação Ford foi Horace Rowan Gaither Jr. Além de ter sido o responsável pela formulação das diretrizes que estabeleceram o vínculo entre a entidade e o aparato estatal estadunidense em 1947, uma ação sua que vale menção foi que, em novembro de 1957, o presidente Eisenhower encarregou um grupo de cientistas para um estudo, altamente sigiloso, a respeito de possíveis ataques nucleares da União Soviética contra os Estados Unidos. Foi encarregado da presidência do grupo de pesquisadores justamente Horace Rowan Gaither Jr, <ref>{{citar livro|título=O Estado de S. Paulo, 27 nov. 1957, p. 2|ultimo=|primeiro=|editora=|ano=|local=|páginas=|acessodata=}}</ref>.
 
O relatório final do grupo, apresentado ao Conselho Nacional de Segurança e ao Departamento de Defesa, previa que, sob risco de uma ameaça nuclear soviética, era necessário um forte aumento dos gastos militares pelos próximos treze anos, ou seja, até 1970,<ref>{{citar livro|título=O Estado de S. Paulo, 21 dez. 1957, p.5|ultimo=|primeiro=|editora=|ano=|local=|páginas=|acessodata=}}</ref>, o que fortaleceu a posição do complexo industrial-militar e, em particular, da indústria bélica.
 
Nesse mesmo ano em que Horace Rowan Gaither Jr. ocupava a presidência da Fundação Ford, em fevereiro, o ministro das Relações Exteriores da União Soviética, Dmitri Shepilov, havia apresentado uma nota à imprensa internacional em Moscou em que denunciava que “''organismos oficiais do governo dos Estados Unidos desenvolvem atividades subversivas e de espionagem, sob o disfarce de toda sorte de comissões, fundações e instituições particulares''”. A nota citava como cobertura do serviço secreto a Fundação Ford, a Fundação Rockefeller e a Fundação Carnegie. A nota ainda dizia que a chamada “''libertação das democracias populares''” havia se convertido na “''pedra fundamental da política exterior norte-americana''” <ref>{{citar livro|título=O Estado de S. Paulo, 7 de fev. 1957, p. 2|ultimo=|primeiro=|editora=|ano=|local=|páginas=|acessodata=}}</ref>
 
Depois de H. Rowan Gaither Jr. o presidente da Fundação Ford foi Henry T. Heald, que ficará no cargo até 1965. Não existem muitos dados a respeito da sua relação com o aparato estatal e de inteligência dos Estados Unidos, apenas que era um indivíduo igualmente vinculado ao chamado complexo industrial-militar-acadêmico estadunidense, uma vez que, entre 1940 e 1952, presidiu o Illinois Institute of Technology <ref>{{Citar web|titulo=Henry T. Heald {{!}} Illinois Institute of Technology|url=https://web.iit.edu/about/history/hall-fame/henry-t-heald|obra=web.iit.edu|acessodata=2019-11-03}}</ref>. Mas é lícito afirmar que essa relação não deixou de acontecer durante sua administração como presidente da Fundação, a exemplo da atuação da entidade no Brasil desde 1961, como se verá na próxima parte do artigo.
 
Em 1966, McGeorge Bundy tornou-se presidente da Fundação Ford, ficando no cargo até 1979.Imediatamente antes de ocupar a presidência da Fundação Ford, McGeorge foi Assistente de Segurança Nacional dos presidentes John F. Kennedy e Lyndon Johnson, cargo que,entre outras funções, tinha como prerrogativa o monitoramento das atividades da CIA.
 
Bundy também havia trabalhado na organização do Plano Marshall e, posteriormente, como reconhecido intelectual de política exterior nos meios conservadores nos Estados Unidos, a ele e ao irmão também é atribuída a formulação de falsos pretextos que justificaram ao Congresso a escalada militar do país na Guerra do Vietnã em 1964 <ref>{{Citar periódico|data=2003-12-31|editor-sobrenome=Lienhard|editor-nome=Martin|titulo=SOBRE ESTE LIVRO|url=http://dx.doi.org/10.31819/9783865278043-002|local=Frankfurt a. M., Madrid|publicado=Iberoamericana Vervuert|paginas=11–12|isbn=9783865278043}}</ref>.
 
No mesmo ano, McGeorge Bundy compôs um comitê do governo para formular ações encobertas no Chile para a eleição de Eduardo Frei.<ref>{{Citar web|titulo=Supplementum Epigraphicum GraecumSivrihissar (in vico). Op. cit. Op. cit. 334, n. 19.|url=http://dx.doi.org/10.1163/1874-6772_seg_a2_597|obra=Supplementum Epigraphicum Graecum|acessodata=2019-11-03}}</ref>. Seu irmão, William Bundy, era membro do Conselho de Avaliação Nacional da CIA e genro do antigo secretário de Estado Dean Achenson <ref>{{Citar periódico|ultimo=Moniz-Bandeira|primeiro=Luiz Alberto|data=2013|titulo=Wachstumsmarkt Brasilien|url=http://dx.doi.org/10.1007/978-3-658-02202-0|doi=10.1007/978-3-658-02202-0}}</ref>. O fato é que a maior parte dos funcionários de alto escalão da Fundação Ford entre 1945 e 1979 eram ou tinham sido agentes, tinham ligações com agentes ou trabalhavam em profunda conexão com a CIA, com o Pentágono, com o Departamento de Estado e com o alto escalão do complexo indutrial-militar privado dos Estados Unidos. Essas redes de relações do poder imperialista foram estabelecidas durante a Segunda Guerra Mundial e, no pós-Guerra e na Guerra Fria, estenderam-se e aprofundaram-se em decorrência da disputa contra a União Soviética por hegemonia global.
 
Conforme aponta ainda Frances Stonor Saunders, um dos intuitos principais que movia a relação orgânica entre a Fundação Ford, a CIA e o Departamento de Estado era livrar-se de eventuais embaraços na política interna dos Estados Unidos em relação a ações de inteligência no exterior. As fundações, em particular, a Fundação Ford, e outras entidades privadas, desburocratizavam ações sigilosas (na maioria das vezes ilegais) em outros países, sobretudo, na área cultural e de operações psicológicas (psy-ops), uma vez que não precisavam prestar contas das suas ações ao Congresso do país.<ref>{{citar livro|título=Quem pagou a Conta? A CIA na guerra fria da cultura|ultimo=Saunders:|primeiro=Frances Stonor|editora=|ano=|local=|páginas=|acessodata=}}</ref>
 
== No Brasil ==
Depois da Revolução Cubana, a política externa estadunidense voltou-se mais atentamente para a América Latina e, em particular, para o Brasil. A pretexto de conter a ameaça comunista internacional, o Departamento de Estado, a CIA, o Pentágono e grandes corporações patrocinaram uma série de regimes militares sanguinários por todo o continente. Foi nesse contexto que a Fundação Ford passou a atuar como organização “filantrópica” no Brasil, em 1961, abrindo um escritório no país ano seguinte, mesmo período em que também o fez no Chile e no México.
 
Dois elementos que foram abordados nas partes anteriores do artigo merecem atenção aqui. O primeiro deles é o fato de, à época, a Fundação Ford deter a maior parte das ações da Ford Motor Company, diferente do que comumente se pensa. Em 1962, por exemplo, a Fundação Ford era proprietária de mais de 50% das ações das indústrias Ford e sua principal controladora <ref>{{Citar periódico|ultimo=Silva|primeiro=Marco Antônio|titulo=Obtenção de um modelo geoidal para o Estado de São Paulo.|url=http://dx.doi.org/10.11606/d.3.2002.tde-09072003-195706}}</ref>. O segundo elemento refere-se à relação desenvolvida no pós-Guerra entre a Fundação e os órgãos de inteligência dos Estados Unidos. Como já foi mencionado, depois da Segunda Guerra Mundial, a maior parte dos altos funcionários da entidade eram ou tinham sido agentes, tinham ligações com agentes ou trabalhavam em profunda conexão com os órgãos de inteligência, com o Departamento de Defesa, com o Departamento de Estado e com o complexo indutrial-militar privado dos Estados Unidos.
 
No Brasil, desde 1962, alguns executivos da Ford Motor do Brasil estiveram vinculados à conspiração civil-militar que levou ao golpe de Estado de 1964. Estavam ligados principalmente ao financiamento do chamado “complexo IPES/IBAD”, cujos recursos advinham, entre outras pessoas jurídicas, da Atlantic Community Development Group for Latin America (ADELA), da qual a Ford Motor era participante, e da American Chamber of Commerce, onde participavam vários diretores da Ford Motor do Brasil (Mario Bardella, Robert F. Carlson, Luiz B. Carneiro da Cunha, Joseph Radleigh Dent, H. H. Eichstaedt, John C. Goulden) <ref name=":0">{{Citar periódico|ultimo=Joao Buzanello|primeiro=Edemar|data=1987-10-13|titulo=Brasil: el golpe de Estado de 1964. Dreifuss, Rene Armand, 1964: A conquista do Estado, Voces, Petropolis, Brasil, 1986, 647 pp.|url=http://dx.doi.org/10.22201/cela.24484946e.1987.3.46929|jornal=Estudios Latinoamericanos|volume=2|numero=3|paginas=111|doi=10.22201/cela.24484946e.1987.3.46929|issn=2448-4946}}</ref>. Inclusive, em 1963, o Congresso brasileiro instaurou uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar as atividades do IBAD no financiamento da campanha eleitoral anterior. O predidente da CPI foi o deputado federal Rubens Paiva.
 
Mas o principal nome vinculado à Ford Motor do Brasil com participação no golpe de 1964 foi Humberto Monteiro. Monteiro era membro-diretor da seção de São Paulo do IPES. Também integrava o Sindicato da Indústria de Aparelhos Elétricos, Eletrônicos e Similares do Estado de São Paulo, da American Chamber of Commerce. <ref name=":1">{{Citar periódico|ultimo=Robin|primeiro=Geiß|data=2013-07|titulo=Ne bis in idem|url=http://dx.doi.org/10.1093/law:epil/9780199231690/e66|jornal=Max Planck Encyclopedia of Public International Law|publicado=Oxford University Press|isbn=9780199231690}}</ref> Monteiro foi secretário da Fazenda do Estado de São Paulo no governo Ademar de Barros e presidente da União Cultural Brasil-Estados Unidos.
 
Logo após o golpe, em setembro de 1964, chegou ao Brasil, Peter Dexter Bell, um dos mais importantes representantes da Fundação Ford para a área internacional e responsável pela distribuição dos recursos da entidade no país. Antes de ocupar tal posto, Peter Bell havia estagiado na área de Relações de Segurança Internacional do Pentágono. Meses depois da sua chegada ao Brasil, no início de 1965, ele fez sua primeira visita a uma instituição de ensino superior, a Faculdade de Ciências Econômicas da UFMG. Lá, foi recebido com a explosão de uma bomba, detonada por estudantes a fim de que ele “mantivesse distância”. <ref>{{Citar periódico|ultimo=Santos|primeiro=Solange Maria dos|titulo=Perfil dos periódicos científicos de Ciências Sociais e de Humanidades: mapeamento das caracteríticas extrínsecas|url=http://dx.doi.org/10.11606/d.27.2010.tde-10112010-161748}}</ref>
 
É importante relembrar que, em 1964, McGeorge Bundy, que assumiria a presidência da Fundação Ford dois anos depois, era Assessor de Segurança Nacional do presidente Lyndon Johnson e uma das suas prerrogativas era monitorar e assessorar as atividades da CIA ao redor do mundo. McGeorge Bundy compôs, também em 1964, um comitê especial da Casa Branca, junto com outros membros do governo e das agências de inteligência, a fim de determinarem ações clandestinas no Chile para auxiliar na eleição de Eduardo Frei. É provável também que, ocupando o cargo, tenha sido um dos formuladores da parceria golpista para o Brasil.
 
Na mesma época, o irmão de McGeorge, William Bundy, compunha o Comitê Nacional de Avaliação da CIA. Os irmãos Bundy são ainda apontados como os formuladores de falsos pretextos apresentados ao Congresso dos Estados Unidos para justificar a escalada militar do país na Guerra do Vietnã a partir de 1964. <ref name=":0" /> McGeorge ficará na presidência da Fundação Ford entre 1966 e 1979, período de maior influência da entidade no Brasil. Portanto, Peter Bell foi o principal representante, no Brasil e na América Latina, da administração de McGeorge Bundy na Fundação Ford.
 
Seguindo as diretrizes de internacionalização da Fundação, formuladas por Horace Rowan Gaither Jr. depois da Segunda Guerra Mundial, a principal atividade de Peter Bell no Brasil era promover o financiamento de atividades nos campos social, acadêmico e cultural. No pós-guerra, uma série de colaborações diplomático-empresariais foram firmadas entre o Brasil e os Estados Unidos. Duas delas foram a Comissão Mista Brasil-Estados Unidos para o Desenvolvimento Econômico, criada em 1951, e ligada ao Ponto IV do Plano Marshall <ref name=":1" /> e, em 1961, a Aliança para o Progresso. Ambas as parcerias, no entanto, destinavam-se sobretudo ao campo econômico-industrial. Logo, na estratégia da política externa dos Estados Unidos, um dos papéis a ser cumprido pela Fundação Ford no Brasil seria o de atuar em áreas que as iniciativas anteriores não abrangiam e essa foi a atuação de Bell. Peter Bell ficou no Brasil entre 1964 e 1969 e ele próprio narra que encontrou-se com agentes da CIA por aqui, a pedido do embaixador dos Estados Unidos, a fim de conversarem sobre os financiamentos promovidos pela Fundação Ford. <ref>{{Citar periódico|ultimo=Amorim|primeiro=Jeovane Aparecido|data=2011-12-20|titulo=O Estadão e as eleições: análise da campanha presidencial de 1945 com base na leitura do jornal O Estado de S. Paulo|url=http://dx.doi.org/10.5433/1984-3356.2011v4n8p925|jornal=Antíteses|volume=4|numero=8|paginas=925–948|doi=10.5433/1984-3356.2011v4n8p925|issn=1984-3356}}</ref>
 
Em março de 1968, o presidente Arthur da Costa e Silva solicitou ao Congresso uma autorização, em caráter especial, para que a Fundação Ford fosse considerada de “utilidade pública”, o que era uma prerrogativa apenas de entidades nacionais. Na exposição de motivos formulada pelo ministro da Justiça, Luis Antônio da Gama e Silva justifica-se para tal medida em “face aos relevantes serviços prestados pela entidade através da realização de intenso programa social objetivando o bem estar humano…” <ref>{{citar livro|título=Comissão Nacional da Verdade. Tomada pública de depoimento de agentes da repressão: Merival Chaves.|ultimo=|primeiro=|editora=|ano=|local=|páginas=|acessodata=}}</ref>. Em junho, o Senado aprovou a solicitação do general.
 
Seis meses depois dessa aprovação, tanto Costa e Silva, como o professor e ex-reitor da USP, Gama e Silva, foram signatários do Ato Institucional n. 5 (AI-5), expressando a preocupação de ambos com o “bem estar humano” no país, promovendo expurgos, torturas, assassinatos, perseguições e toda a sorte de barbárie contra a população organizada contra o regime. Em 1 de julho de 1969, na esteira do AI-5, foi criada a Operação Bandeirantes e a Ford Motor Co., cuja maior acionista era a Fundação Ford, tornou-se uma das suas principais financiadoras <ref>{{Citar periódico|ultimo=Canabarro|primeiro=IVO Santos|data=2014-12-17|titulo=Caminhos da Comissão Nacional da Verdade (CNV): memórias em construção.|url=http://dx.doi.org/10.5007/2177-7055.2014v35n69p215|jornal=Seqüência: Estudos Jurídicos e Políticos|volume=35|numero=69|paginas=215|doi=10.5007/2177-7055.2014v35n69p215|issn=2177-7055}}</ref>. O intuito central da operação era o extermínio dos militantes comunistas do país. A Ford Motor Co. dispendeu recursos também para a criação dos DOI-CODI, conforme, entre outras fontes, o depoimento à Comissão da Verdade do ex-agente da repressão Merival Chaves, do setor de inteligência do Exército <ref>{{Citar periódico|ultimo=CATALDO DE S T DOS SANTOS|primeiro=AMANDA|titulo=COMISSÃO NACIONAL DA VERDADE: O ÚLTIMO CAPÍTULO DA JUSTIÇA DE TRANSIÇÃO NO BRASIL?|url=http://dx.doi.org/10.17771/pucrio.acad.34045}}</ref>. É desnecessário mencionar aqui as atrocidades perpetradas pelo órgão contra os revolucionários brasileiros do período.
 
Entre as muitas iniciativas “filantrópicas” da Fundação Ford no Brasil, a mais conhecida foram os recursos que, também em 1969, a entidade destinou à criação do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (CEBRAP), cujo principal pesquisador veio posteriormente a ser presidente do país, [[Fernando Henrique Cardoso]]. O centro foi fundado por professores que haviam sido demitidos da universidade em razão do AI-5 e, no primeiro momento, a embaixada dos Estados Unidos e a CIA no Brasil, talvez um pouco desinformados, viram com preocupação o auxílio da Fundação Ford. Porém, segundo o próprio Peter Bell, depois que ele se reuniu com um agente da CIA no país, a preocupação se desfez e a entidade destinou recursos à criação do centro de pesquisa.<ref>{{Citar web|titulo='Para os EUA, Brasil era campo de batalha na Guerra Fria' - Política|url=https://politica.estadao.com.br/noticias/eleicoes,para-os-eua-brasil-era-campo-de-batalha-na-guerra-fria-imp-,931221|obra=Estadão|acessodata=2019-11-04|lingua=pt-BR}}</ref> Em entrevista concedida ao jornal O Estado de S. Paulo em 2012, Peter Bell afirmou, com toda razão: “No contexto do período, entendo que alguns brasileiros possam ter desconfiado de mim.” <ref>{{Citar web|titulo='Para os EUA, Brasil era campo de batalha na Guerra Fria' - Política|url=https://politica.estadao.com.br/noticias/eleicoes,para-os-eua-brasil-era-campo-de-batalha-na-guerra-fria-imp-,931221|obra=Estadão|acessodata=2019-11-04|lingua=pt-BR}}</ref> Conforme o processo de abertura política no país a partir de meados dos anos 1970, a Fundação Ford foi “camaleonicamente” adaptando-se ao novo ambiente e sua nova linha de atuação passou a ser os chamados “direitos humanos”
 
== Críticas ==