Melindrosa
Melindrosa é um termo típico dos anos 1920 usado para se referir ao novo estilo de vida das mulheres jovens, que usavam saias curtas, aboliram o espartilho, cortavam seus cabelos curtos (popularmente conhecidos como à la garçonne ou bob cut, hoje também como corte chanel), ouviam e dançavam provocativamente o jazz e o charleston e desacatavam a tradicional conduta feminina. Nos países de língua francesa e em outros países como Portugal, eram conhecidas como as garçonnes, nos de língua inglesa, como flappers, e melindrosas mais usada no Brasil. Usavam das brincadeiras com homens um estilo de vida, até então abominada como bons modos para as mulheres.[1]
As melindrosas eram constantemente vistas como impetuosas por usar maquiagem excessivamente, beber, tratar o sexo como algo casual, fumar e dirigir, ou seja, fazer tudo que fosse tido como um desafio as normas radicais e limitadoras de outrora.[2] As melindrosas tiveram suas origens em um período de liberalismo econômico, conhecido como os "anos loucos". A turbulência social, a política e o aumento dos intercâmbios culturais através de viagens transatlânticas que seguiu-se ao final da Primeira Guerra Mundial, assim como a exportação do jazz à Europa, difundiram essa moda.
A mais notória melindrosa brasileira seria a personagem Lu de "Memórias de um Gigolô", criada pelo escritor paulista Marcos Rey em 1968[3]. A "Betty Boop", personagem de desenhos tida como melindrosa, faz muito sucesso no Brasil. Cartazes de cervejas e refrigerantes nos anos 20 e 30 abusaram dessa ideia.
Etimologia
editarMelindrosa
editarFoi dado esse termo, pois vem da palavra melindre, algo que causa constrangimento, vergonha ou até mesmo alguém que se mágoa com facilidade, que no caso referia-se às mulheres que possuíam maneiras afetadas e que estavam sempre seguindo as tendências da moda. Mulheres que queriam revolucionar com seus trajes e trejeitos.
Garçonne
editarO nome feminino garçonne provem de garçon (''menino'' em francês), foi introduzido no século XIII, no sentido de ''mulher volúvel'', mas séria apenas como um hápax. Reaparece em 1880 nos escritos de Joris-Karl Huysmans para designar uma ''jovem com características de moçoilo'', que é comparado em português com o termo maria-rapaz.[4]
O termo, em seguida, torna-se sinônimo de mulher emancipada: independente e ativa, livre para se movimentar - ela sai, dança, fuma, tem práticas de desporto ao ar livre, dirige um carro, viaja sozinha - Ela mostra a normalidade de se relacionar fora do casamento, até sua homossexualidade ou bissexualidade, ou viver um relacionamento aberto.
É em Paris que começa a surgir a aparência melindrosa, sob o impulso de Coco Chanel em particular.
Flapper
editarA gíria "flapper", que descreve uma jovem moça, começou a ser usada na Inglaterra, embora ainda existam dúvidas quanto à sua real origem. Pode, supostamente, fazer referência a um jovem pássaro batendo (flapping) as asas enquanto aprende a voar. No entanto, pode derivar ou de um uso anterior no norte da Inglaterra que significa "adolescente", referindo-se as meninas cujas tranças batiam (flapped) em costas[5] e que usavam saias ao redor dos joelhos até os quinze anos, quando teriam que usar vestidos e amarrar o cabelo em um coque, ou de uma palavra mais antiga que significa "prostituta".[6] A gíria "flap" foi usada para designar jovens prostitutas já em 1631.[7] Na década de 1890, a palavra "flapper" estava emergindo na Inglaterra como gíria popular, tanto para uma jovem prostituta[8],[9] quanto em um sentido mais geral - e menos depreciativo - para qualquer adolescente animada.[10]
A palavra apareceu impressa pela primeira vez em 1903 no Reino Unido e 1904 nos Estados Unidos, quando o romancista Desmond Coke usou isso em sua história de vida na Universidade de Oxford, Sandford of Merton: "There's a stunning flapper" ("Há uma melindrosa deslumbrante").[11] Em 1907, o ator britânico George Graves explicou a palavra aos americanos, dizendo que era uma gíria teatral para jovens artistas acrobáticas femininas.[12] A flapper também era conhecida como uma dançarina, que movia os braços como um pássaro batendo as asas enquanto dançava o Charleston. Isto tornou-se um movimento de dança bastante competitivo durante esta era.[13]
Em 1908, jornais tão sérios quanto The Times usaram o termo, embora com uma explicação cuidadosa: "Uma 'melindrosa', podemos explicar, é uma jovem moça que ainda não foi promovida para longos vestidos e o uso de seus cabelos amarrados".[14][15] Em abril de 1908, a seção de moda de The Globe and Traveler de Londres continha um esboço intitulado "The Dress of the Young Girl" com a seguinte explicação:
"Americanos e esses afortunados ingleses cujo dinheiro e status lhes permitem usar livremente gírias... como o assunto desse texto, a 'melindrosa'. A adequação deste termo não me leva a admiração dos incríveis poderes de enriquecer a nossa língua, que os americanos reconhecem modestamente que possuem... [e] de fato, mal mereceria a honra de um momento de minha atenção, mas pelo fato de procurar em vão qualquer outra expressão que se entenda significar aquela importante jovem, a virgem de cerca de dezesseis anos."[16]
O esboço é de uma garota com uma saia comprida, "que tem a cintura bastante alta e esguia, ... um pouco sem vida, sua simplicidade é aliviada por uma faixa amarrada de forma descuidada em torno da saia".[17]
Em novembro de 1910, a palavra era popular o suficiente para A. E. James começar uma série de histórias na London Magazine, com as desventuras de uma linda garota de quinze anos, intitulada "Her Majesty the Flapper".[18] Em 1911, uma critica do jornal indica que a "melindrosa" maliciosa e coquete era uma estabelecida peça de teatro.[19]
Em 1912, o empresário teatral londrino John Tiller, que definiu a palavra numa entrevista que deu ao The New York Times, descreveu uma "melindrosa" como pertencente a uma faixa etária um pouco mais velha, uma menina que "acabou de sair".[20] O uso de Tiller na frase "sair" significa "para fazer uma entrada formal na 'sociedade' alcançando a feminilidade".[21] Na sociedade educada na época, uma adolescente que não "saiu" ainda seria classificada como uma criança. Esperava-se que ela mantivesse um perfil discreto em ocasiões sociais e não devesse ser objeto de atenção masculina. Embora a palavra ainda fosse amplamente entendida como referindo-se as adolescentes de espírito livre da Grã-Bretanha, estava sendo estendida para descrever qualquer mulher impetuosa e imatura. No final de 1914, a revista britânica Vanity Fair informou que a "melindrosa" estava começando a desaparecer na Inglaterra, sendo substituído pelas chamadas "Little Creatures".[22]
No entanto, o uso da palavra aumentou durante a Primeira Guerra Mundial, talvez devido ao visível surgimento de mulheres jovens na força de trabalho, para suprir o lugar de homens ausentes;[23] um artigo do Times sobre o problema de encontrar empregos para mulheres desempregadas pelo retorno da força de trabalho masculina é intitulado "The Flapper's Future".[24] Sob essa influência, o significado do termo mudou um pouco, mudando para "jovens mulheres independentes, vulgares e loucas".[9]
Em sua palestra, realizada em fevereiro de 1920, sobre o excesso de mulheres jovens na Grã-Bretanha causada pela perda de homens jovens durante a guerra, o Dr. R. Murray-Leslie criticou: "o tipo borboleta social ... a frívola, seminua, flapper do jazz, irresponsável e indisciplinada, a quem uma dança, um chapéu novo ou um homem com um carro eram mais importantes do que o destino das nações".[25] Em maio daquele ano, Selznick Pictures lançou The Flapper, um filme de comédia mudo estrelado por Olive Thomas. Foi o primeiro filme nos Estados Unidos a retratar o estilo de vida "flapper". Naquela época, o termo tinha assumido o significado completo do estilo e das atitudes de geração flapper.
O uso do termo coincidiu com a moda entre as adolescentes dos Estados Unidos no início da década de 1920 de usar galochas desafiveladas,[26] e uma generalizada etimologia falsa afirmou que elas eram chamados de "flappers" porque as fivelas batiam (flapped) quando caminhavam.[27][28] Outra sugestão para a origem do termo, em relação à moda, vem de uma tendência da moda dos anos 20, na qual as mulheres jovens deixavam seu sobretudo desabotoado para permitir que ele se movesse (flap) de um lado para o outro enquanto caminhavam, aparentando mais independência e liberdade, diferente do apertado e sufocante vestuário Vitoriano da época passada.[29]
Em meados da década de 1930, na Grã-Bretanha, embora ainda ocasionalmente usada, a palavra "flapper" se associara ao passado. Em 1936, um jornalista do Times agrupou-o, junto com termos como "blotto" (bêbado), como uma gíria desatualizada: "(blotto) evoca um eco distante de alegria de rags e flappers ... Isto recorda um passado que ainda não é um 'período'".[30]
Referências
editar- ↑ "As Flappers (Ou Melindrosas), as primeiras feministas do século passado". Vintage & Retrô.
- ↑ Rosenberg, Jennifer. "Flappers in the Roaring Twenties". About.com.
- ↑ «tiro de letra - Marcos Rey». www.tirodeletra.com.br. Consultado em 1 de outubro de 2022
- ↑ Trésor de la langue française informatisé. Centre national de ressources textuelles et lexicales: [s.n.]
- ↑ Evans, Ivan H. Brewer's Dictionary of Phrase and Fable (rev. ed.) New York: Harper & Row, 1981.
- ↑ "flapper", Online Etymology Dictionary.
- ↑ Mabbe, James. Celestina IX. 110 "Fall to your flap, my Masters, kisse and clip"; 112 "Come hither, you foule flappes."
- ↑ Barrere; Leland (1889), Dictionary of Slang,
Flippers, flappers, very young girls trained to vice
. - ↑ a b Savage, Jon. Teenage: The Creation of Youth Culture. New York: Viking, 2007. p. 202.
- ↑ Lowsley, Barzillai. A glossary of Berkshire words and phrases (1888) (E.D.S.): "Vlapper,.. applied in joke to a girl of the bread-and-butter age."
- ↑ Oxford English Dictionary, 1989.
- ↑ "The Comedy Old Man and His Troubles". The New York Times (interview with English comedy actor George Graves). February 3, 1907. "What are 'flappers'? Why, they are the young girls with their hair still hanging down their backs. They are the sort that can climb up ropes hand over hand and pose at the top."
- ↑ The Jazz Age. The 20s. Alexandria, Virginia.: Editors of the Time-Life Books. 1997. p. 38.
- ↑ "A 'flapper', we may explain, is a young lady who has not yet been promoted to long frocks and the wearing of her hair 'up'"
- ↑ The Times (38574), p 15, col F, February 20, 1908
- ↑ "Americans, and those fortunate English folk whose money and status permit them to go in freely for slang terms ... call the subject of these lines the 'flapper.' The appropriateness of this term does not move me to such whole-hearted admiration of the amazing powers of enriching our language which the Americans modestly acknowledge they possess ..., [and] in fact, would scarcely merit the honour of a moment of my attention, but for the fact that I seek in vain for any other expression that is understood to signify that important young person, the maiden of some sixteen years."
- ↑ "The Dress of the Young Girl". The Globe and Traveler. April 11, 1908.
- ↑ James, A. E. "Her Majesty the Flapper" Arquivado em 4 de dezembro de 2009, no Wayback Machine.. London Magazine (November, 1910)
- ↑ "Review of the 1911 comedy Lady Patricia". The Times (39540). March 23, 1911. p 10, col C.
Now the 'flapper' is Miss Clare Lesley, the Dean's tomboy daughter..." In the play a mature married couple, Patricia and Michael, vainly pursue slang-talking teenagers Billy and Clare, and so "Clare, out of the charity of youth for enamoured maturity, indulges Michael with a little mild flirtation" before at the end finding real love with Billy, who is her own age. The actress playing the flapper is characterized as "full of youth and 'go'".
- ↑ "Some facts about the ballet", The New York Times, March 31, 1912, "Mr. Tiller explained the difference between a "pony" and a "flapper". A pony, he said, is a small dancer who may be of any age. A flapper is a girl who has just "come out". She is at an awkward age, neither a child nor a woman, and she is just as likely to develop into a show girl as a pony."
- ↑ Oxford English Dictionary
- ↑ Anonymous (December 1914) "The Melancholy Passing of the Flapper" Vanity Fair.
- ↑ "Daily News". November 11, 1918: 4.
One day, at noon, I was in a departmental office of the Ministry of Munitions... very young girls and flappers, and young women, and women who were elderly, came out to their lunches...
- ↑ The Times (42232), p 7, col B, October 16, 1919
- ↑ The Times (42326), p 9, col A, February 5, 1920.
- ↑ "Flappers flaunt fads in footwear" The New York Times (January 29, 1922). O artigo alega que a origem da moda foi o traje de Douglas Fairbanks no filme The Three Musketeers, na qual ele usou o cano de suas botas abaixado.
- ↑ Basinger, Jeanne (2000), Silent Stars, Wesleyan
- ↑ Strong, Marion in Brady, Kathleen (2001), Lucille: The life of Lucille Ball, Billboard, "The more noise the buckles made, the better they flapped, that's why we were called flappers".
- ↑ Corrigan, Jim. The 1920s Decade in photos: The Roaring Twenties. Berkeley Heights, New Jersey: Enslow Publishers, Inc, 2009, 19.
- ↑ The Times (London, England): "Delivering Drunkards", December 2, 1936, p. 15