Luigia Carolina Zanrosso Eberle, mais conhecida pelo seu apelido Gigia Bandera (Schio, 2 de junho de 1854 — Caxias do Sul, 8 de março de 1918), foi uma imigrante italiana que se fixou em Caxias do Sul, no Brasil, onde foi a primeira mulher a trabalhar na funilaria como empresária, sendo uma das pioneiras da metalurgia na cidade e tornando-se um símbolo de empreendedorismo feminino. Foi mãe do empresário Abramo Eberle.

Gigia Bandera

Luigia Zanrosso nasceu na localidade de Monte Magré, em Schio, onde casou-se em 1878 com Giuseppe Eberle. Em 1884 a família se transferiu para Caxias do Sul. Traziam quatro filhos pequenos, Eugenio, Abramo, Maria Gioseppina e Maria Luigia, e Luiz, Rosina, Pedro, Amábile, Catarina e Maria nasceriam no Brasil.[1] Em 1886 Giuseppe adquiriu uma funilaria e uma casa comercial de Francisco Rossi, no centro da zona urbana, mas como ele também trabalhava como barbeiro e agricultor, passou a administração dos negócios para a esposa.[2] Luigia aprendeu o ofício e, segundo Charles Tonet, "percebendo a necessidade de produção de objetos de utilidades domésticas e ferramentaria agrícola, diante da constante entrada de grandes levas de imigrantes, vislumbra um crescente mercado consumidor".[3] Revelou-se uma exímia funileira, produzindo uma série de artigos que tiveram grande procura, como lamparinas, baldes, canecas e outros objetos utilitários, máquinas agrícolas e alambiques para produção de graspa.[2] Ainda segundo Tonet, "a funilaria prosperava atendendo à crescente demanda por artigos de utilidade doméstica, na medida em que o crescimento populacional era exponencial, e também por situar-se num excelente ponto comercial". Formando um significativo mercado, expandiu suas atividades instalando na casa comercial uma vidraçaria, aproveitando o crescimento do setor de construção em um momento em que a sede urbana se expandia rapidamente.[3] Seu filho Abramo foi seu aprendiz e auxiliar, e em 1896 assumiu a direção do negócio, que ele transformaria em uma grande metalúrgica. A casa onde funcionou a funilaria foi preservada pelo filho, que mais tarde a transportou para o topo da sede principal da metalúrgica.[2]

Faleceu em Caxias em 8 de março de 1918, sendo louvada em seus obituários como "respeitável" e "virtuosa matrona", "muito estimada por seus predicados de coração e seu gênio afável e comunicativo". Seu sepultamento foi muito acompanhado.[4][5] Com a crescente projeção de Abramo e seus sucessores à testa da indústria, a memória de Luigia foi bastante apagada,[6] mas nas décadas recentes vem sendo recuperada, sendo ressaltada sua condição de mulher dinâmica em uma época em que elas eram destinadas ao lar e à sujeição aos maridos.[7][8][9][10] O historiador Mário Gardelin assinalou seu papel fundamental no desenvolvimento da carreira do filho Abramo.[11] No 75º aniversário da metalúrgica foi comemorada na imprensa como a matriarca de uma dinastia de industriais e como a alma de uma empresa poderosa da qual "tanto se ufana a cidade e como ela o Rio Grande do Sul e o Brasil".[12] Em 1987 o Sindicato das Indústrias Metalúrgicas, Mecânica e de Material Elétrico instituiu o Troféu Mérito Metalúrgico Gigia Bandera,[13] a maior comenda do setor na região,[14] considerando que sua carreira "se confunde com a própria epopeia da industrialização de Caxias do Sul, especialmente do segmento metalúrgico da região. Luiza funileira não apenas exerceu o ofício, mas revelou intuição de empresária ao detectar um nicho de mercado em potencial no início do século. Ela vislumbrou o futuro na fabricação de utensílios voltados à vitivinicultura e à atividade do homem do campo. Assim nasceu uma das maiores empresas da história de Caxias do Sul: a Metalúrgica Abramo Eberle. Gigia Bandera é a síntese do mérito metalúrgico que o SIMECS confere, todo ano, a personalidades que, com sua visão estratégica, representação institucional, empresarial e de defesa da livre iniciativa, conseguem projetar suas empresas e o setor".[15] Em 1997 foi erguido na praça central de Caxias um monumento em sua memória e em homenagem às mulheres trabalhadoras da cidade. Em matéria publicada na ocasião, a historiadora Maria Abel Machado disse que "como as mulheres de seu tempo, Gigia Bandera foi destinada ao silêncio. No entanto, hoje, a história busca resgatar seu espaço junto aos pioneiros da região".[8] Segundo Maria Clara Mocellin, Luigia veio a ser considerada "um dos maiores símbolos de pioneirismo da indústria metalúrgica de Caxias do Sul".[16] Foi destacada no livro História das mulheres no Brasil (2004) de Mary Del Priore como a fundadora da Metalúrgica Eberle,[17] em 2011 a Associação das Pequenas e Médias Empresas de Vicenza, Itália, criou um troféu de mérito metalúrgico batizado com seu nome, "como uma homenagem à excepcional história empreendedora de Gigia Bandera",[18] e em 2013 a comuna de Schio enfocou sua trajetória como mulher empreendedora em seu boletim Quaderni di Schio.[19]

Ver também

editar

Referências

  1. "SIMECS reconhece mérito empreendedor". Tempo Todo, 26/11-04/12/2003
  2. a b c Tisott, Ramon Victor. "A família Eberle e o início do desenvolvimento industrial de Caxias do Sul". In: Anais do XXVI Simpósio Nacional de História – ANPUH. São Paulo, 2011
  3. a b Tonet, Charles. O empreendedorismo na ficção de José Clemente Pozenato: mito e expressão de regionalidade. Mestrado. Universidade de Caxias do Sul, 2017, pp. 48
  4. "Necrologia". O Brazil, 09/03/1918
  5. "Fallecimento". Città di Caxias, 09/03/1918
  6. Tessari, Anthony Beux. Imagens do labor : memória e esquecimento nas fotografias do trabalho da antiga metalúrgica Abramo Eberle (1896-1940). Mestrado. Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, 2013, p. 162
  7. Machado, Maria Abel. "O resgate de Gigia Bandera, a mulher que começou a Eberle". O Pellegrino, 20-26/04/1996
  8. a b "Gigia Bandera, o resgate de uma história de trabalho". Gazeta de Caxias, 26/07-01/08/1997
  9. Corrêa, Luiz Carlos Correa. "Gigia, uma história viva". O Pellegrino, 20-26/04/1996
  10. "Mulheres caxienses marcam data com fórum e protestos". Gazeta de Caxias, 06-12/03/1999
  11. "Sindicato entrega amanhã troféu Mérito Metalúrgico". Pioneiro, 08/02/1988
  12. "Crônica da Cidade". Pioneiro, 03/04/1971
  13. "Gigia Bandera". Correio Riograndense, 03/12/1997
  14. "Homenagem Metalurgia". O Pellegrino, 16-22/11/1996
  15. "Escolhidas as três personalidades de 1999". Pioneiro, 12/11/1999
  16. Mocellin, Maria Clara. Trajetórias em Rede: representações da italianidade entre empresários e intelectuais da região de Caxias do Sul. Doutorado. Universidade Estadual de Campinas, 2008, p. 152
  17. Del Priore, Mary. História das mulheres no Brasil. UNESP, 2004, p. 316
  18. "Gigia Bandera na Itália". Correio Riograndense, 23/11/2011
  19. "Raccontiamo donne — un ponte tra ieri e domani". In: Quaderni di Schio, 2013 (13)