João Abel Manta
João Abel Carneiro de Moura Abrantes Manta ComSE • ComL (Lisboa, 29 de janeiro de 1928) é um arquiteto, pintor, ilustrador e cartoonista português.
João Abel Manta | |
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João Abel Manta, 1977
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Nome completo | João Abel Carneiro de Moura Abrantes Manta |
Nascimento | 29 de janeiro de 1928 (96 anos) Lisboa |
Nacionalidade | portuguesa |
Cônjuge | Maria Alice Ribeiro (1 filha, Isabel Ribeiro Manta) |
Ocupação | arquitecto, pintor, ilustrador e cartoonista |
Autor de uma obra multifacetada, centrada sobretudo na arquitetura, desenho e pintura, João Abel Manta afirmou-se no panorama cultural português a partir do final da década de 1940. Nos anos que se seguiram teve importante atividade no domínio da arquitetura, que abandonaria progressivamente em favor das artes, destacando-se como um dos maiores cartoonistas portugueses das décadas de 1960 e 1970. Nos anos anteriores e posteriores ao 25 de Abril publicou regularmente, em jornais de grande tiragem, trabalhos emblemáticos da situação político-social portuguesa nesse período de transição (queda da ditadura e implantação de um regime democrático). Na década de 1980 redirecionou uma vez mais a sua obra, centrando-se prioritariamente na pintura.
Biografia
editarJoão Abel Manta é filho dos pintores Abel Manta e Maria Clementina Carneiro de Moura Manta. Foi casado com Maria Alice Ribeiro, de quem teve uma filha, Isabel Ribeiro Manta. Vive e trabalha em Lisboa.
"Filho único, [...] cresce numa casa de Santo Amaro de Oeiras [...] convivendo com alguns dos intelectuais mais importantes da época que se tornam amigos de seus pais" [1], como Manuel Mendes ou Aquilino Ribeiro; viaja longamente com os pais, conhece Espanha, Inglaterra, Holanda, mas serão sobretudos as viagens a Paris e Itália que o irão marcar.
Inscreve-se no curso de arquitectura da Escola Superior de Belas Artes de Lisboa, que termina em 1951 e onde faz amizade com Sá Nogueira e José Dias Coelho, entre outros; integra-se desde muito cedo na intelectualidade lisboeta ligada aos movimentos de esquerda que se opunham à ditadura fascista de Salazar e Marcelo Caetano; participa no MUD Juvenil. Terminado o curso, trabalha em associação com Alberto Pessoa, mas abandona progressivamente a arquitetura ao longo dos anos de 1960, expandindo a atividade por uma multiplicidade de áreas, das artes plásticas à cenografia, destacando-se em particular como cartoonista na década seguinte.[2]
Obteve vários prémios nacionais e estrangeiros; participou em inúmeras exposições colectivas, em Portugal e no estrangeiro; realizou múltiplas mostras individuais, entre as quais: Galeria Interior, Lisboa, 1971; Institute of Contemporary Arts (ICA), Londres, 1976; Museu Rafael Bordalo Pinheiro, Lisboa, 1992; Palácio Galveias, Lisboa, 2009.[2]
Obra
editarFoi responsável, com Alberto Pessoa e Hernâni Gandra, pelos projectos do Conjunto Habitacional na Avenida Infante Santo, Lisboa (com o qual ganhou o Prémio Municipal de Arquitectura em 1957), e da Associação Académica de Coimbra (1955-59).[3]
Como artista plástico, tem obras nas áreas da pintura, desenho (ilustração, cartoon), artes gráficas, cerâmica, tapeçaria e mosaico. Fez selos e cartazes, ilustrou livros, entre os quais A cartilha do marialva, de José Cardoso Pires. Foi o autor das tapeçarias do Salão Nobre da sede da Fundação Calouste Gunbenkian (c. 1969). Fez os cenários para A Relíquia, de Eça de Queiroz (1970; encenação de Artur Ramos) e O Processo, de Kafka (1970). No contexto da arte pública destacam-se o pavimento na Praça dos Restauradores, Lisboa, e o painel de azulejos na Avenida Calouste Gulbenkian, Lisboa (concebido em 1970 e aplicado em 1982).[2]
João Abel Manta destaca-se em particular nas artes plásticas, sobretudo no desenho, onde se afirmou bastante cedo, com trabalhos de relevo datados da década de 1940. Em 1961 venceu o Prémio de Desenho na II Exposição de Artes Plásticas da Fundação Calouste Gulbenkian com O Ornitóptero[4]. Dedicou-se à pintura, realizou um vasto conjunto de colagens, expôs em mostras coletivas e individuais. Mas a área em que se distinguiu de forma mais assinalável foi a do cartoon, sendo considerado por muitos como "o caso mais extraordinário do cartoonismo luso do nosso século [século XX], só equiparável [ao] próprio Bordalo Pinheiro" [5].
A sua atividade como cartoonista estende-se por um período alargado, desde aproximadamente 1954 até 1991, intensificando-se entre 1969 e 1976. Durante cerca de 7 anos os seus trabalhos foram publicados com regularidade em jornais como o Diário de Lisboa, Diário de Notícias, e O Jornal, abordando de forma crítica e profundamente irónica a realidade portuguesa; em 1981 publica novos trabalhos no Jornal de Letras, mas a partir daí a sua actividade como cartoonista torna-se esporádica.[2]
Com um grafismo único, meticuloso, os seus cartoons (veja-se por exemplo Turistas, da série Reportagem Fotográfica, 1972) marcaram a época anterior ao 25 de Abril: "Nenhum pintor daqui e de agora resumiu com tantas subtilezas a temperatura social e política do fascismo agonizante". Nesse "inventário doméstico" cabe praticamente tudo: "estão em causa os desastres e os grotescos duma burguesia, a nossa, com os seus emblemas e heróis". João Abel "aponta à História, ao monumento e em particular à procissão provinciana da nossa burguesia intelectual" [6].
A sua intervenção pública intensifica-se em 1974 e 1975, logo após a queda da ditadura, lançando-se "à batalha com redobrado ardor, multiplicando-se em caricaturas, posters e cartazes de orientação vincadamente revolucionária", e tornando-se no "artista máximo, talvez o único afinal, que a revolução de Abril suscitou". É o que vemos em desenhos como "Um problema difícil", de 1975, onde um grupo de notáveis – de Marx e Lenin a Gandhi e Sartre –, se interrogam perante um pequeno mapa de Portugal. João Abel Manta "ficará associado dum modo muito particular ao melhor e ao pior que em Portugal vivemos nesses dois anos"[7].
A partir de 1976 "o artista alistado João Abel eclipsa-se: os ventos são outros, o MFA (Movimento das Forças Armadas) dissolveu-se", e só em 1978 "emerge do silêncio e lança ao público um […] novo álbum: Caricaturas dos Anos de Salazar" [7], onde "narra uma história – a nossa história […] onde se encaixam, se alternam ou se encadeiam […] o ridículo e a tragédia da colonização e da guerra colonial, o miguelismo e o liberalismo […] a submissão popular e a sua revolta […] o folclore musical e o artesanato, o teatro, o cinema ou a pintura" [8].
A 3 de Setembro de 1979 foi feito Comendador da Ordem de Sant'Iago da Espada.[9]
A partir de 1981 dedica-se quase exclusivamente à pintura, num trabalho intimista que contrasta com o carácter de intervenção político-social dos seus cartoons. Em 2009 expõe no Palácio Galveias: "Nestas obras pratico uma inocente pintura a óleo sobre tela, […] para explicar a quem interesse o que penso do mundo e das coisas do passado e do presente" [10].
"A minha atração […] por alguns artistas do chamado impressionismo, deriva do modo notável como utilizam a técnica da pintura e talvez também pela tranquilidade dos temas, tranquilidade curiosa numa época agitada e revolucionária: intimidade da vida burguesa, paisagens repousantes, gente feliz, bailarinas" [10]. Mas a sua aparente proximidade formal com o impressionismo é enganadora, e nas suas pinturas das décadas de 1980 a 2000 deparamos frequentemente com um universo sombrio de onde emergem "figuras inomináveis e terríveis, produtos da alucinação" [11]. A visão perturbante de João Abel Manta funde o "quotidiano e o fantástico, em paisagens lisboetas invadidas de seres estranhos"[12], a par de uma recorrente presença de auto-figurações que remetem para um território autorreferencial até aí desconhecido na sua obra.
A 25 de Abril de 2004, foi agraciado com o grau de Comendador da Ordem da Liberdade.[9]
Algumas obras
editar-
Conjunto Habitacional, Avenida Infante Santo
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Conjunto Habitacional, Avenida Infante Santo
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Painel de azulejos, Avenida Gulbenkian
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Painel em pedra gravada, Associação Académica de Coimbra
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Painel em pedra gravada, Associação Académica de Coimbra
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Associação Académica de Coimbra
Algumas exposições e prémios
editar- 1947/53 – Exposições Gerais de Artes Plásticas, SNBA, Lisboa.
- 1953 – 20 Artistas Contemporâneos em Portugal, Galeria de Março; II Bienal de S. Paulo.
- 1954/60 – Blanco e Nero, Lugano, Suiça.
- 1957 – I Exposição de Artes Plásticas da Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa.
- 1958/62 – Salões de Arte Moderna, SNBA, Lisboa.
- 1959 – 50 Artistas Independentes, Lisboa.
- 1961 – II Exposição de Artes Plásticas da Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa – Prémio de Desenho.
- 1965 – Exposição Internacional de Artes Gráficas de Leipzig, Leipzig – Medalha de Prata.
- 1967 – Bienal de Tóquio, Japão.
- 1969/71 – Exposições do Grupo da Galeria Interior, Lisboa.
- 1969 – Gravura Portuguesa Contemporânea, Paris.
- 1971 – Exposição Individual – João Abel Manta: Pintura, Galeria Interior, Lisboa.
- 1971 – Obras de Pintura Contemporânea, SEIT e Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa.
- 1972 – Exposições Itinerantes de Pintura Portuguesa, Fundação Calouste Gulbenkian.
- 1975 – Artistas Portugueses, Berlim.
- 1975 – Exposição Internacional de Artes Gráficas de Leipzig, Leipzig – Prémio de Ilustração.
- 1976 – Exposição Individual – João Abel Manta: Drawings, Institute of Contemporary Arts, Londres.
- 1976 – 20 Anos de Gravura, Fundação Calouste Gulbenkian.
- 1978 – Arte Moderna Portuguesa 68-78, Sociedade Nacional de Belas Artes, Lisboa.
- 1979 – Arte Moderna Portuguesa, Sociedade Nacional de Belas Artes, Lisboa.
- 1986 – O Fantástico na Arte Portuguesa, Centro de Arte Moderna, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa.
- 1986 – 1ª e 2ª Exposições de Artes Plásticas da Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa.
- 1987 – Arte Contemporânea Portuguesa, Museo Español de Arte Contemporáneo, Madrid.
- 1988 – Recebe o Prémio Stuart-Regisconta / 88
- 1991 – Lisboa Século XX nas Artes Plásticas, Museu da Cidade, Lisboa.
- 1992 – Exposição Individual – João Abel Manta: Obra Gráfica, Galeria Municipal da Amadora.
- 1992 – Arte Portuguesa nos Anos 50, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa.
- 1992 – Exposição Individual – João Abel Manta: Obra Gráfica, Museu Rafael Bordalo Pinheiro, Lisboa.
- 1999 – Exposição Individual – João Abel Manta, Centro Cultural de Cascais.
- 2009 – Exposição Individual – João Abel Manta: Pintura 1991-2009, Câmara Municipal de Lisboa, Galeria Palácio Galveias, Lisboa.
- 2021 – Exposição Individual – A Máquina de Imagens, Palácio da Cidadela de Cascais; curadoria de Pedro Piedade Marques.[13]
Algumas publicações
editar- MANTA, João Abel – João Abel Manta: Cartoons. Lisboa: Edições O Jornal, 1975.
- MANTA, João Abel (org. Osvaldo de Sousa) – João Abel Manta – gráfica. Lisboa: Regisconta, 1988.
- MANTA, João Abel – João Abel Manta: obra gráfica. Lisboa: Museu Rafael Bordalo Pinheiro, 1992.
- MANTA, João Abel – Caricaturas portuguesas dos anos de Salazar (1978). Porto: Campo das Letras,1998. ISBN 972610-137-9
- COTRIM, João Paulo – João Abel Manta: Caprichos e desastres. Lisboa: Assírio & Alvim, 2008. ISBN 978-972-37-1342-7 Erro de parâmetro em {{ISBN}}: soma de verificação
- MANTA, João Abel – João Abel Manta, Pintura, 1991-2009. Lisboa: Câmara Municipal de Lisboa, 2009. ISBN 978-972-8543-14-3
- LETRIA, José Jorge - João Abel Manta: Não se distorce a cara de um homem. Lisboa: Guerra e Paz, 2014. ISBN 978-989-7021-18-3
Ilustração
editar- BARROS, Leitão de – Corvos (ilustrações de João Abel Manta). Lisboa: Emp. Nac. de Publicidade, 1960.
- VIEIRA, Padre António – Arte de furtar (ilustrações de João Abel Manta). Lisboa: Estudos Cor, 1969.
- PIRES, José Cardoso – Dinossauro excelentíssimo (ilustrações de João Abel Manta). Lisboa: Arcádia, 1972.
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Referências
- ↑ Milheiro, Ana Vaz - João Abel Manta: um (arquiteto) moderno relutante. J.A. nº 244, Jan./Fev./Março 2012, p.102.
- ↑ a b c d MANTA, João Abel – João Abel Manta: obra gráfica. Lisboa: Museu Rafael Bordalo Pinheiro, 1992.
- ↑ A.A.V.V (Ed. João Afonso) – Inquérito à Arquitectura do Século XX em Portugal. Lisboa: Ordem dos Arquitectos, 2006
- ↑ A.A.V.V. – II Exposição de Artes Plásticas da Fundação Calouste Gulbenkian. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1961, imagem nº 225.
- ↑ MEDINA, João – João Abel Manta. In: MANTA, João Abel – João Abel Manta: obra gráfica. Lisboa: Museu Rafael Bordalo Pinheiro, 1992, p.39.
- ↑ PIRES, José Cardoso – João Abel Manta. In: MANTA, João Abel – João Abel Manta: obra gráfica. Lisboa: Museu Rafael Bordalo Pinheiro, 1992, p.24.
- ↑ a b MEDINA, João – João Abel Manta. In: MANTA, João Abel – João Abel Manta: obra gráfica. Lisboa: Museu Rafael Bordalo Pinheiro, 1992, p.43, 44.
- ↑ DIONÍSIO, Mário – "Caricaturas Portuguesas de João Abel Manta". In: João Abel – João Abel Manta: obra gráfica. Lisboa: Museu Rafael Bordalo Pinheiro, 1992, p.223-225.
- ↑ a b «Cidadãos Nacionais Agraciados com Ordens Portuguesas». Resultado da busca de "João Abel Manta". Presidência da República Portuguesa. Consultado em 8 de julho de 2019
- ↑ a b João Abel Manta, depoimento, 2009. In: MANTA, João Abel – João Abel Manta, Pintura, 1991-2009. Lisboa: Câmara Municipal de Lisboa, 2009, p. 7. Também em: Diário de Notícias, 2009. ([1])
- ↑ GONÇALVES, Rui Mário - Paisagens transfiguradas. In: MANTA, João Abel - João Abel Manta. Lisboa: Edição Junta de Freguesia de Santa Catarina, 2001.
- ↑ PORFÍRIO, José Luís – "João Abel Manta: Pintura 1991-2009". Jornal Expresso, 19 de dezembro de 2009.
- ↑ «João Abel Manta: A Máquina de Imagens». Câmara Municipal de Cascais. Consultado em 6 de outubro de 2021