José Alberto Hermógenes
José Alberto Hermógenes de Souza (Salvador, 1 de outubro de 1944 - Salvador, 22 de agosto de 2021) foi um médico sanitarista, considerado um dos principais articuladores da Reforma Sanitária brasileira, que resultou no Sistema Único de Saúde – SUS aprovado na Assembleia Nacional Constituinte de 1987-1988.[1] Foi secretário de Saúde da Bahia e secretário-geral do Ministério da Saúde nas gestões dos Ministros Roberto Santos e Jamil Haddad.[2][3][4][5][6]
José Alberto Hermógenes | |
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José Alberto Hermógenes, em entrevista ao jornal do Sindimed - Sindicato dos Médicos da Bahia, 2011
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Nascimento | 1 de outubro de 1944 Salvador |
Morte | 22 de agosto de 2021 (76 anos) Salvador |
Nacionalidade | brasileiro |
Profissão | médico sanitarista |
Atuação na saúde pública
editarFormado pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia, em 1968.[7] Ingressou na Fundação SESP (Serviço Social de Saúde Pública) na qual veio a ser presidente. Começou na SESP na unidade de Bom Jesus da Lapa - Bahia, seguindo depois os municípios de Juazeiro, Itajuípe e Itabuna estes já exercendo função de chefia de serviço. Na sua atuação clínica, assistiu muitos pacientes como tuberculose e hanseníase.[4] No seu período na FSESP, realizou especialização em Saúde Pública na Fundação Osvaldo Cruz, no Rio de Janeiro.[8]
Na década de 1970, Hermógenes foi diretor do Centro de Treinamento da Secretaria de Saúde da Bahia, assumindo o cargo de Secretário de maio de 1978 a março de 1979 no governo de Roberto Santos.[4] Desde esse período, é referido com grande articulador e renovador nas instituições por onde passou uma liderança firme, mas de "jeito manso", valorizando os então chamados "jovens sanitaristas".[9]
Após seu mandato de Secretário, Hermógenes mudou-se com a família para Brasília e assumiu a Coordenação do Programa de Interiorização das Ações de Saúde e Saneamento (PIASS) no Ministério da Saúde. Em março de 1980, foi um dos debatedores do painel sobre "Modelos de Serviços Básicos de Saúde e sua Articulação com os Demais Níveis de Atendimento" na 7ª Conferência Nacional de Saúde, evento que foi um marco para discussão sobre a atenção primária da saúde no país.[10][11]
No governo de José Sarney, em 1985, foi Presidente da Fundação Sesp - Serviço Social de Saúde Pública, quando o ministro da Saúde era Carlos Sant'ana.[12] Em 1986, quando Roberto Santos tornou-se ministro da Saúde (1986-1987), foi convidado a assumir a Secretaria Geral da pasta. Foi o Coordenador da Comissão Nacional da Reforma Sanitária,[2][13][14] constituída por recomendação da 8ª Conferência Nacional de Saúde, tendo elaborado o texto-base do capítulo da Saúde da Constituição Federal de 1988, que criou o Sistema Único de Saúde – SUS.[15] A comissão contava ainda com outras personalidades consideradas, como ele, norteadoras dos princípios do SUS, como Sérgio Arouca, Arlindo Fábio e Hésio Cordeiro.[16][11][17][18][19][20][21]
Após o governo Sarney, Hermógenes, empolgado com a luta em favor do fortalecimento da produção estatal de medicamentos,[22] retornou à Bahia para assumir a Presidência da Bahiafarma – empresa de medicamentos do governo da Bahia, quando era governador Waldir Pires e secretário Luiz Umberto Pinheiro, mas continuou participando das articulações nacionais para implantação do SUS.[23][24]
Em 1991, com o impeachment de Fernando Collor, assumiu seu vice Itamar Franco, que convidou Jamil Haddad para Ministro da Saúde (1992-1993). Hermógenes, a convite do novo ministro, assumiu novamente como Secretário-Geral, participando ativamente da criação da política dos medicamentos genéricos no país.[4][25][26][27]
Na década de 1990, atuou na área de autogestão em saúde das caixas de assistência da FSESP (CAPESESP) e do Banco do Brasil (Cassi), sendo Diretor de Previdência e Assistência da CAPESESP e Gerente Nacional de Saúde da Cassi.[8][28]
Após a vitória do PT nas eleições de 2002, Hermógenes foi convidado pelo ministro Humberto Costa para assumir a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos, cargo em que voltou a defender e apoiar o desenvolvimento da indústria nacional de medicamentos e da produção estatal de medicamentos e insumos essenciais, a exemplo da implantação da fábrica de preservativos no Acre utilizando matéria-prima nacional.[29] Em 2004, deixou o cargo por pressão de aliados políticos do governo, interessados no orçamento da secretaria que dirigia a política de medicamentos.[30][31]
Para continuar em atividade, participou de processo seletivo para o cargo de Gerente da Cassi em Sergipe, onde permaneceu até 2007, ano em que se aposentou.[8]
Faleceu em Salvador, em 22 de agosto de 2021, em consequência de sequelas de Covid-19.[32] Diversas instituições de Saúde, como a Fiocruz -Fundação Oswaldo Cruz, CNS - Conselho Nacional de Saúde, SESAB - Secretaria de Saúde da Bahia, Abrasco - Associação Brasileira de Saúde Coletiva, ISC/UFBA - Instituto de Saúde Coletiva, da UFBA, Agência de Notícia da Aids, ABMMD - Associação Brasileira de Médicos e Médcicas pela Democracia e o Cremeb - Conselho Regional de Medicina da Bahia divulgaram manifestações de pesar, destacando a sua dedicação por toda vida à defesa do direito universal à saúde e à criação e consolidação do Sistema Único de Saúde (SUS).[33][34][35][36][37] [38][39]
A notícia de sua morte repercutiu também internacionalmente, em particular devido à sua identificação como um dos criadores do SUS e ser mais uma dentre as centenas de milhares de vítimas fatais da Covid no Brasil.[40][41]
Atuação política
editarTendo iniciado sua militância política como estudante de medicina, atuou no movimento estudantil como membro da organização clandestina Ação Popular – AP, grupo oriundo da Juventude Universitária Católica (JUC), que lutava contra a ditadura militar que dominou o Brasil no período 1964-1985. Posteriormente, filiou-se ao PCdoB – Partido Comunista do Brasil,[4] ao qual manteve-se ligado até o final da sua vida.[42] Foi conselheiro do Conselho Regional de Medicina da Bahia (1988-1998), diretor e presidente do Sindimed - Sindicato dos Médicos da Bahia.[43]
Referências
- ↑ Redação, Da (23 de agosto de 2021). «Um dos idealizadores do SUS, José Alberto Hermógenes morre aos 76 anos». Jornal Correio. Consultado em 23 de agosto de 2021
- ↑ a b Brasil., Ministério da Saúde. (1987). Documentos III - CNRS - Comissão Nacional da Reforma Sanitária. Rio de Janeiro: Secretaria Técnica da Comissão Nacional da Reforma Sanitária. 167 páginas
- ↑ Brasil., Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica (2010). Memórias da saúde da família no Brasil. Brasília: Ministério da Saúde. p. 93. 144 páginas
- ↑ a b c d e Sindimed - Bahia, Luta Médica. (Outubro de 2011). «Entrevista: José Alberto Hermógenes de Souza. p. 5-9.» (PDF). https://sindimed-ba.org.br/wp-content/uploads/2011/08/REVISTA-19.pdf. Consultado em 19 de julho de 2021
- ↑ «Jornal do Brasil (RJ) - 1980 a 1989 - DocReader Web». memoria.bn.br. Consultado em 20 de julho de 2021
- ↑ «Jornal dos Sports (RJ) - 1980 a 1989 - DocReader Web». memoria.bn.br. Consultado em 20 de julho de 2021
- ↑ Levantamento Nominal dos Formados de 1812 a 2008 da Faculdade de Medicina da Bahia - UFBA. Disponível em: http://www.cbg.org.br/wp-content/uploads/2012/07/b_formandos_medicina.pdf p. 370.
- ↑ a b c José Alberto Hermógenes de Souza, uma História de ética, competência e humildade. Homenagem do funcionários da Cassi - Sergipe, Aracaju, 2007 (impresso).
- ↑ «Tânia Celeste Matos Nunes :». observatoriohistoria.coc.fiocruz.br. Consultado em 23 de julho de 2021
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- ↑ Leite-Mor, Ana Cláudia Moraes Barros (2014). «As democracias possíveis : um estudo latouriano da Assembleia Nacional Constituinte e de suas propostas de democratização da saúde no Brasil» (PDF). Repositório da Universidade Estadual de Campinas
- ↑ «José Hermógenes, Pedro Simon e Sérgio Arouca - Memória ENSP». 157.86.160.244. Consultado em 22 de julho de 2021
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- ↑ «Conselheiros». Portal Cremeb BA. 5 de outubro de 2015. Consultado em 20 de julho de 2021