Lógica doxástica
Lógica doxástica é um tipo de lógica modal preocupada com o raciocínio sobre crenças. O termo doxástico é derivado do grego antigo δόξα (doxa), que significa "crença" ou "opinião". Tipicamente, uma lógica do tipo doxástico utiliza Bx para referir-se a "Acredita-se que x é o caso," e o conjunto denota um conjunto de crenças. Na lógica doxástica, a crença é tratada como um operador modal.
- : {}
Existe um paralelismo completo entre uma pessoa que acredita em proposições e um sistema formal que deriva proposições. Usando a lógica doxástica, é possível expressar a contrapartida epistêmica do Teorema da Incompletude de Gödel, assim como o Teorema de Löb, e outros resultados metalógicos em termos de crença.[1]
Tipos de raciocinadores
editarPara demonstrar as propriedades dos conjuntos de crenças, Raymond Smullyan definiu os seguintes tipos de raciocinadores:
- Raciocinador preciso:[1][need quotation to verify][2][3][4][need quotation to verify] Um raciocinador preciso nunca crê em nenhuma proposição falsa. (axioma modal T).
- Raciocinador impreciso:[1][2][3][4] Um raciocinador impreciso crê em, pelo menos, uma proposição falsa.
- Raciocinador vaidoso:[1][4] Um raciocinador vaidoso crê que seus ou suas crenças nunca são imprecisas.Um raciocinador vaidoso irá necessariamente se transformar em uma imprecisão.
- ou
- Raciocinador consistente:[1][2][3][4] Um raciocinador consistente nunca acredita simultaneamente em uma proposição e na negação da mesma. (axioma modal D)
- ou
- Raciocinador normal:[1][2][3][4] Um raciocinador normal é aquele que, enquanto acreditando em p, também acredita que ele ou ela crê em p (axioma modal 4).
- Raciocinador peculiar:[1][4] Um raciocinador peculiar acredita em uma proposição p enquanto acredita também que ele ou ela não acredita em p. Apesar de um raciocinador peculiar parecer um estranho fenômeno psicológico (veja O Paradoxo de Moore), um raciocinador peculiar é necessariamente inexato, porém não necessariamente inconsistente.
- Raciocinador regular:[1][2][3][4] Um raciocinador regular é aquele que, enquanto acreditando que , também acredita que .
- Raciocinador reflexivo:[1][4] Um raciocinador reflexivo é aquele para o qual toda proposição p possui alguma proposição q tal que o raciocinador crê em .
- Se um raciocinador reflexivo do tipo 4 [veja abaixo] crê em , ele ou ela irá acreditar em p. Esse é um paralelismo do Teorema de Löb para raciocinadores.
- Raciocinador instável:[1][4] Um raciocinador instável é aquele que acredita que ele ou ela acredita em alguma proposição, sem acreditar de fato nela. Isto está mais para um estranho fenômeno psicológico do que para uma peculariedade; contudo, um raciocinador instável não é necessariamente inconsistente.
- Raciocinador estável:[1][4] Um raciocinador estável não é instável. Isto é, para todo p, se ele ou ela acredita em Bp, então ele ou ela acredita em p. Note que estabilidade é o inverso da normalidade. Diremos que um argumentador acredita que ele ou ela é estável se para toda proposição p, ele ou ela acredita que BBp→Bp (acreditando: "Se eu deveria acreditar que eu acredito em p, então eu realmente irei acreditar em p").
- Raciocinador modesto:[1][4] Um raciocinador modesto é aquele para o qual toda proposição p é acreditável, somente se ele ou ela acredita em p. Um raciocinador modesto nunca acredita em Bp→p a menos que ele ou ela acredite em p. Qualquer raciocinador reflexivo do tipo 4 é modesto. (Teorema de Löb)
- Raciocinador estranho:[4] Um raciocinador estranho é de tipo G e acredita que ele ou ela é inconsistente - mas está incorreto quanto a sua crença.
- Raciocinador tímido:[4] Um raciocinador tímido tem medo de acreditar em p [isto é, ele ou ela não acredita em p] se ele ou ela acredita em
Aumentando os níveis de racionalidade
editar- Raciocinador Tipo 1:[1][2][3][4][5] Um raciocinador do Tipo 1 possui um conhecimento completo da Lógica proposicional, isto é, ele ou ela mais cedo ou mais tarde acredita em qualquer tautologia (qualquer proposição demonstrável por tabelas-verdade). Também, o conjunto de crenças dele ou dela (passado, presente e futuro) é logicamente fechado sob o modus ponens. Se ele ou ela em algum momento acreditar em p e acreditar em p → q (p implica q), então ele ou ela irá (mais cedo ou mais tarde) acreditar em q.
- Raciocinador Tipo 1* :[1][2][3][4] Um raciocinador do Tipo 1* acredita em todas as tautologias; o conjunto de sentenças dele ou dela (passado, presente e futuro) é logicamente fechado sob o modus ponens, e para qualquer proposição p e q, ele ou ela acredita em p→q, então ele ou ela também irá acreditar que, se ele ou ela acredita em p, então ele ou ela acreditará em q. O Tipo 1* possui "um pouquinho mais" de auto-consciência do que o raciocinador do Tipo 1.
- Raciocinador do Tipo 2:[1][2][3][4] Um raciocinador é do Tipo 2 se ele ou ela é do tipo 1, e se para todo p e q, ele ou ela (corretamente) acredita que: "Se eu deveria em algum momento acreditar em p e em p→q, então eu vou acreditar em q." Sendo do Tipo 1, ele ou ela também crê na proposição logicamente equivalente: B(p→q)→(Bp→Bq). Um raciocinador do Tipo 2 está ciente de que as crenças dele ou dela estão fechadas sob o modus ponens.
- Raciocinador do Tipo 3:[1][2][3][4] Um raciocinador é do Tipo 3 se ele ou ela for um raciocinador normal do Tipo 2.
Teorema da incompletude de Gödel e a indecidibilidade doxástica
editarDigamos que um raciocinador exato enfrenta a tarefa de designar um valor verdade a uma afirmação feita a ele. Existe uma afirmação tal qual o raciocinador deverá ou permancer eternamente indeciso sobre ou perder seu ou sua precisão. Uma solução é a afirmação:
- S: "Eu nunca irei acreditar nesta afirmação"
Se o raciocinador acredite em algum momento na afirmação S, ele se torna falsificado por tal fato, fazendo S uma crença falsa e portanto tornando o raciocinador impreciso em acreditar em S.
Portanto, desde que o argumentador seja preciso, ele ou ela nunca irá crer em S. Logo, a afirmação era verdadeira, pois é exatamente isso que ela reivindicou. Segue-se posteriormente que o raciocinador nunca irá ter a falsa crença de que S é verdade. O raciocinador não pode crer nem que a afirmação é verdadeira nem falsa sem tornar-se inconsistente (isto é, possuir duas crenças contraditórias). Assim, o raciocinador deverá permanecer para sempre indeciso sobre se a afirmação S é verdadeira ou falsa.
O teorema equivalente é que para todo sistema formal F, existe uma afirmação matemática que pode ser interpretada como "Esta afirmação não é demonstrável no sistema formal F." Se o sistema F é consistente, nem a afirmação nem o oposto dela serão demonstráveis nele.[1][4]
Inconsistência e peculariedade de raciocinadores vaidosos
editarUm raciocinador do Tipo 1 enfrenta a seguinte afirmação "Você não acreditará nesta sentença." Agora, uma coisa interessante é que se o raciocinador acredita que ele ou ela é sempre preciso, então ele ou ela se tornará impreciso. Tal como um raciocinador irá pensar: "Se eu creio na afirmação, então ela se tornará falsa por tal fato, o que significa que sou impreciso. Isso é impossível, já que eu sempre sou preciso. Portanto, eu não posso crer nessa afirmação: ela deve ser falsa."
Neste ponto, o raciocinador crê que a afirmação é falsa, o que faz a afirmação verdadeira. Assim, o raciocinador é impreciso em acreditar que a afirmação é falsa. Se o raciocinador não tivesse assumido seu ou sua precisão, ele ou ela nunca iriam ter caído em uma imprecisão.
Também pode ser mostrado que um raciocinador vaidoso é peculiar. [1][4]
Crenças auto-realizáveis
editarPara sistemas, definimos reflexividade como para todo p (na linguagem do sistema) existe um q tal que q≡(Bq→p) é demonstrável no sistema. O Teorema de Löb (numa forma geral) é que para qualquer sistema reflexivo do Tipo 4, se Bp→p é demonstrável no sistema, então p também é.[1][4]
Inconsistência da crença na estabilidade de um qualquer
editarSe um raciocinador consistente reflexivo do Tipo 4 acredita que ele ou ela é estável, então ele ou ela tornar-se-á instável. Indicando o contrário, se um raciocinador estável reflexivo do Tipo 4 acredita que ele ou ela é estável, então ele ou ela se tornará inconsistente. Por que isso? Suponha que um raciocinador estável reflexivo do Tipo 4 acredita que ele ou ela é estável. Mostraremos que ele ou ela (mais cedo ou mais tarde) acreditará em qualquer proposição p. O raciocinador acredita que BBp→Bp, logo segundo o Teorema de Löb ele ou ela irá acreditar em Bp (pois ele ou ela acredita em Br→r, onde r é a proposição Bp, e então ele ou ela irá acreditar em r, que é a proposição Bp). Estando estável, ele ou ela irá, então, acreditar em p.[1][4]
Veja também
editarReferências
editar- ↑ a b c d e f g h i j k l m n o p q r s t u v Smullyan, Raymond M., (1986) Logicians who reason about themselves, Proceedings of the 1986 conference on Theoretical aspects of reasoning about knowledge, Monterey (CA), Morgan Kaufmann Publishers Inc., San Francisco (CA), pp. 341-352
- ↑ a b c d e f g h i j http://cs.wwc.edu/KU/Logic/Book/book/node17.html Arquivado em 30 de setembro de 2007, no Wayback Machine. Belief, Knowledge and Self-Awareness[dead link] [dead link]
- ↑ a b c d e f g h i j http://moonbase.wwc.edu/~aabyan/Logic/Modal.html Arquivado em 13 de fevereiro de 2007, no Wayback Machine. Modal Logics[dead link] [dead link]
- ↑ a b c d e f g h i j k l m n o p q r s t u v w Smullyan, Raymond M., (1987) Forever Undecided, Alfred A. Knopf Inc.
- ↑ a b Rod Girle, Possible Worlds, McGill-Queen's University Press (2003) ISBN 0-7735-2668-4 ISBN 978-0773526686
Leitura aprofundada
editar- Lindström, St.; Rabinowicz, Wl. (1999). «DDL Unlimited. Dynamic Doxastic Logic for Introspective Agents». Erkenntnis. 51 (2–3): 353–385. doi:10.1023/A:1005577906029
- Linski, L. (1968). «On Interpreting Doxastic Logic». Journal of Philosophy. 65 (17): 500–502. JSTOR 2024352
- Segerberg, Kr. (1999). «Default Logic as Dynamic Doxastic Logic». Erkenntnis. 50 (2–3): 333–352. doi:10.1023/A:1005546526502
- Wansing, H. (2000). «A Reduction of Doxastic Logic to Action Logic». Erkenntnis. 53 (1–2): 267–283. doi:10.1023/A:1005666218871