Abu Jafar Amade ibne Ibraim ibne Abi Calide ibne Aljazar de Cairuão (em árabe: ابو جعفر احمد ابن ابراهيم ابن ابى خالد ابن الجزار; romaniz.: Abū Jaʿfar Aḥmad ibn Ibrāhīm ibn Abī Khālid ibn al-Jazzār al-Qayrawani), conhecido como ibne Aljazar (ibn al Jazzar) ou Algazar (al-Gazzar) e pelo nome latinizado de Algizar (Cairuão, c.898 — Cairuão, c.980) foi um polímata da Ifríquia (atual Tunísia) que se celebrizou principalmente como médico, nomeadamente pelo seu extenso tratado “Viático do viajante”, o qual foi traduzido para latim e levado para o Ocidente no século XI por Constantino, o Africano, da Escola Médica de Salerno, e que se tornou um livro de ensino clássico da medicina A faculdade de medicina de Sousse foi batizada em sua honra.

Algizar
ابو جعفر احمد ابن ابراهيم ابن ابى خالد ابن الجزار

Suposto retrato de Algizar
Nome completo Abū Ja'far Ahmad ibn Ibrāhīm ibn Abī Khālid ibn al Jazzar al-Kaïraouani
Outros nomes Algizar, al-Gazzar
Nascimento c.898
Cairuão
Morte c.980 (82 anos)
Cairuão
Nacionalidade Emirado Aglábida
Etnia Árabe
Ocupação Médico, polímata
Principais trabalhos Tratados de medicina e obras sobre história, gramática, jurisprudência, prosódia, etc.
Magnum opus Viático do viajante
Religião Islão

Biografia

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Algizar cresceu numa família de médicos, tendo seguido o percurso do seu pai e do seu tio, como era hábito na sua época. De facto, algumas profissões, como o ensino e a medicina, estavam reservadas a certas famílias. Durante a infância, Algizar recebeu um ensino pluridisciplinar, conforme os usos e metodologia em voga em Cairuão, a principal cidade do Emirado Aglábida: estudou o Alcorão, a fiqh (jurisprudência islâmica), a suna (a segunda fonte das leis islâmicas), os hádices, gramática e literatura árabe. Aprendeu igualmente medicina com o pai, o tio e com o judeu Isaac Israeli bem Salomão.

É autor de obras de gramática e de história e compõe poesia. Segundo alguns autores,[quais?] teria ultrapassado o seu mestre Isaac Israeli pelo número de obras e a respetiva diversidade, avanços, metodologia, importância do conteúdo, difusão e persistência da sua influência ao longo do tempo. Uma das suas obras mais relevantes é um livro de medicina destinado aos pobres, que denota uma predisposição social pouco usual na época. Graças aos seus conhecimentos de medicina, os habitantes de Cairuão acorriam em grande número a ele para serem curados e também ensinados. Era ele próprio que preparava os medicamentos (xaropes, unguentos, comprimidos e outros) e entregava-os a um criado que, sentado no vestíbulo da sua casa, os dava aos destinatários e recebia os pagamentos dos remédios e dos honorários de médico. Ignoram-se os preços que praticava, mas quando morreu, Algizar deixou uma enorme fortuna, avaliada em 4 020 dinares de ouro e 25 quintais de livros. Estes últimos, escritos com cálamo em peles tratadas, tinham então um valor muito elevado.

O Viático

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Algizar escreveu alguns livros sobre gramática, história, jurisprudência, prosódia, etc. Perderam-se muitas das suas obras, que se conhecem apenas por citações de diferentes autores. A mais importante é a “Zād al mussāfir wa tuhfatu elqādim” ("Viático do viajante"; em latim: Viaticum). Traduzida em latim e hebraico, foi copiada, recopiada e impressa em França e Itália no século XVI. Foi adotada e vulgarizada na Europa como um livro de ensino clássico da medicina. O livro não é uma compilação, como o Cânone de Avicena, que mistura medicina e filosofia. Ao contrário de Avicena, Algizar era um médico praticante, pelo que o seu livro apresenta outra perspetiva.

O Viaticum de Algizar é um tratado de medicina que cobre o corpo humano da cabeça aos pés, concebido para ensinar clínica. Não inclui anatomia nem filosofia, mas lições escritas para os seus cursos, como salienta o autor na conclusão do livro e como se percebe pelas repetições que se encontram. Para cada doença, o livro enumera o nome, os sintomas conhecidos, o tratamento e por vezes indica o prognóstico. Cita frequentemente autores estrangeiros, como que para dar importância lhes dar importância, ou por honestidade intelectual, para justificar os empréstimos.

Dividida em dois volumes e sete capítulos, quatro no primeiro e três no segundo, aborda as doenças que podem afetar o ser humano. Capítulos:

  • Doenças da cabeça
  • Doenças da face
  • Doenças do peito
  • Doenças do estômago, intestinos, fígado e rins
  • Doenças do aparelho respiratório
  • Doenças que afetam episodicamente
  • Doenças da epiderme

Embora Rasis (ca. 865–925) seja algumas décadas mais velho, Algizar adota no “Viático” o mesmo estilo do “el Haoui” e “O Continente” de Rasis, mas mais elaborado e mais conciso. Pode questionar-se se não terá tido acesso a esses livros muito cedo, o que é pouco provável, pois não separa o sarampo da varíola, a inovação de Rasis, e entre os médicos a que se refere com frequência, como Cláudio Galeno, Hipócrates, Dioscórides, Tridon, Fergorius, Aristóteles e Isaac Israeli, não cita Rasis.

No total são-lhe atribuídas cerca de quarenta obras, entre as quais:

  • Viático do Viajante ou Provisão do viajante e alimentação do sedentário (Zād al moussāfir wa tuhfatu elqādim), traduzido em latim por Constantino, o Africano (1020–1087) com o título Viaticum peregrinorum
  • Livro do estômago, suas doenças e seus tratamentos, traduzido em latim por Constantino, o Africano com o título Liber de stomacho
  • Livro dos medicamentos simples, traduzido em latim por Constantino, o Africano com o título Liber de Gradibus Simpleium
  • Livro da amnésia e das formas de fortificar a memória
  • Livro dos perfumes
  • Livro das propriedade
  • A educação das crianças
  • A geriatria
  • A medicina dos pobres
  • Dissertação sobre a urina

A maior parte dos livros citados pelo seu biógrafo ibn Abi Usaybi'a, ele próprio também médico, são essencialmente dissertações.

Notas e bibliografia

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