Metaxo (em grego: μεταξύ, transl.: metaxy ou metaxú), por vezes referido como metaxia, é um termo frequentemente utilizado na filosofia de Platão para denotar algo com local ou função de meio, intermediário ou conectivo, tendo sido emprestado na contemporaneidade por alguns pensadores, principalmente Simone Weil e Eric Voegelin; William Desmond também cunhou o termo "metaxologia".[1]

Relaciona-se em meio a, mas não se confunde com o ato de metéxis (participação).

Em Platão

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Diversas qualificações do metaxo são fornecidas por Platão em sua ontologia, cosmologia e epistemologia: a realidade intermediária entre o mundo inteligível e o mundo sensível, chamada khôra, "terceiro tipo" (triton genos) entre o ser e o não-ser; os espíritos (daemones) que intermedeiam os deuses aos humanos; o demiurgo; a Alma do Mundo;[2] a alma (psyche);[3] a encruzilhada neutra da opinião (doxa) em meio a ignorância e conhecimento (episteme); bem como a diánoia (entendimento) e logos entre a inteligência (noun) e a opinião:[4]

"se aparecesse algo que ao mesmo tempo é e não é, tal coisa ficaria em posição intermédia (metaxy) entre o ser puro e o que de todo modo não é"
A República 478d

"Parece que descobrimos, então, que as muitas convenções sobre o múltiplo, daquilo que é belo e honrado e outras coisas, são relegadas à região intermediária a circular entre o não ser e o ser puros. ... Mas concordamos com antecedência que, se algo desse tipo for descoberto, deve ser denominado opinável, não conhecível, o viajante entre o ser captado pela faculdade que está entre."
A República 479d[5]

No diálogo Parmênides 156d, ele aparece para descrever o "repentino" (exaíphnes), que entremeia a alternância de estados (devir, geração e corrupção) no tempo:[6]

"o súbito (exaíphnes) parece significar algo como uma mudança a partir de uma coisa em direção a outra. Com efeito, não é do que está em repouso quando ainda em repouso que surge a mudança [para o movimento], nem do movimento enquanto ainda se move surge a mudança [para o repouso]. Mas o próprio súbito, essa estranha natureza, é um intermediário (metaxy) entre o movimento e o repouso, não sendo em tempo algum, e é para ele e a partir dele que o móvel muda para o repouso e o que está em repouso para o que se move"

Mas o exemplo mais notório é o de Eros, em O Banquete, definido através da sacerdotisa Diotima como intermediário de contrários, que não é divino, nem belo, nem feio, nem mau, mas:[7]

"Como eu sugerira, ele [Eros, o Amor] é entre o mortal e o imortal. ... Um grande espírito (daemon), Sócrates: pois todos os espirituais são mediadores entre o divino e o mortal. ... Ele interpreta e transporta coisas humanas aos Theoí (Deuses), e coisas divinas aos homens; preces e sacrifícios de baixo, e ordenanças e retribuições de cima: e [o Amor] preenchendo em meio a eles, o todo se interliga. Por meio dEle se transmitem toda profecia e sacerdócio em relação a sacrifício e rito e cantos, e os oraculares todos e encantamento. Theós (Deus) não se mistura com o homem; mas toda comunhão e conversação dos deuses com os homens, sejam despertos ou dormentes, é levada por intermédio dEle. Aquele que é sábio em alguma dessas maneiras é um homem espiritual; enquanto que aquele que é sábio em qualquer outra maneira, em uma profissão ou qualquer trabalho manual, é meramente um mecânico (bánausos). Muitos e diversos são esses espíritos, e um deles é o Amor."[8][9]
O Banquete, 203

Diotima, ensinando a Sócrates, usa o termo para mostrar como a tradição oral pode ser percebida por diferentes pessoas de diferentes maneiras. No poema de Sócrates, ela descreve Eros como não um extremo; antes, como espírito, Eros está entre o divino e a humanidade. Diotima expõe, assim, as falhas da tradição oral; usa contrastes fortes para expressar a verdade, revelando vulnerabilidade ao sofisma. Essa parte do diálogo aponta para a ideia de que a realidade é perceptível apenas através do caráter (que inclui desejos e preconceitos e compreensão limitada da lógica). O homem se move através do mundo do tornar-se, o mundo em constante mudança da percepção sensorial, para o mundo do ser - o mundo das formas, dos absolutos e da transcendência. O homem transcende seu lugar no devir através de Eros, em que o homem alcança o Bem Maior, um estado de consciência intuitivo e místico. Amor (Eros) também aparece no diálogo como intermediária ou filha da Pobreza (Penia) e Posse (Poros).[10] Mais tarde, neoplatonistas como Plotino usaram o conceito para expressar uma colocação ontológica do homem entre os deuses e os animais.[11]

Uso contemporâneo

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O filósofo político contemporâneo Eric Voegelin usou o termo para significar o lugar permanente onde o homem está entre dois pólos de existência. Tais como a realidade infinita (Ápeiron) e finita (a mente divina ou Nous) da existência ou entre o início da existência (Apeiron) e a existência do Além (ἐπέκεινα epekeina). Como uso técnico, Voegelin definiu metaxo como a conexão da mente ou nous com o mundo material e o reverso da conexão do mundo material com a mente como "consciência do ser". Sob Voegelin, também pode ser interpretado como uma forma de percepção, em contraste com a consciência, um modelo da mente (ou nous), em contraste com o fluxo dinâmico e não ordenado da consciência experiencial. Como uma forma de reflexão entre dois pólos de experiência (finito e infinito ou imanente e transcendente); toda a existência sendo expressa como o cosmos. Sendo o metaxo a conexão do homem com o mundo material, este é o fundamento do ser. Voegelin ensinou que aqueles que buscavam poder político para seu próprio fim eram sofistas e aqueles que buscavam significado e verdade na vida ou união com o conhecível e verdadeiro, eram filósofos.[12] Cada uma dessas posições manifesta uma visão diferente sobre o devir e o ser de Platão; novamente o lugar entre cada um desses pólos de experiência é o metaxo.

O conceito também é usado por Simone Weil, sob a forma "metaxu". Ela acreditava que a compaixão deve agir na área da metaxia.[13]

Ver também

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Referências

  1. Veldsman, Daniël P.; Steenkamp, Yolande (31 de dezembro de 2018). Debating Otherness with Richard Kearney: Perspectives from South Africa (em inglês). [S.l.]: AOSIS 
  2. Vimercati, Emmanuele (2006). "Metaxy". Enciclopedia filosofica. 8. Milano: Bompiani. p. 7384-7385. Citado em Duraj, Jarosław. (2017). "The Hermeneutics of Metaxy in the Philosophy of Plato". Studia Bobolanum. 28 (4).
  3. Araújo, Hugo Filgueiras de. Caminha, Iraquitan de Oliveira. (julho-dezembro de 2014). "A natureza da alma como um intermediário". Argumentos, 6 (12).
  4. Pereira, M. H. Rocha. (trad.) (1993). Lisboa: Calouste Gulbenkian. In Filho, Francisco de Assis Vale Cavalcante. (2016). Os Problemas da Opinião Falsa e da Predicação no Diálogo Sofista de Platão. João Pessoa: Editora da UFPB. p. 38
  5. «Plato, Republic, Book 5, section 479d». www.perseus.tufts.edu. Consultado em 25 de junho de 2020 
  6. Puente, Fernando Rey (1 de outubro de 2012). Ensaios sobre o tempo na filosofia antiga. [S.l.]: Imprensa da Universidade de Coimbra / Coimbra University Press 
  7. Bispo, Gláucia Luciana Drumond. (dezembro de 2017). Movimento, Relação e Geração: Uma Análise das Potências de Eros No “Banquete” de Platão. Monografia. Rio de Janeiro: PUC-RIO
  8. Platão (1 de maio de 1997). Plato: Complete Works (em inglês). [S.l.]: Hackett Publishing 
  9. «Plato, Symposium, section 203a». www.perseus.tufts.edu. Consultado em 30 de maio de 2020 
  10. Platão, O Banquete 203b-c
  11. Enéadas 3, verso 8, linha 4: "Mas a humanidade, na realidade, está posicionada no meio do caminho entre deuses e bestas, e se inclina ora para uma ordem, ora para a outra; alguns homens crescem semelhantes ao divino, outros ao bruto, o maior número permanece neutro." Citado em Temporini, Hildegard. Haase, Wolfgang. Rise and Decline of the Roman World p.706
  12. Eric Voegelin, “Reason: The Classic Experience,” in Voegelin, Published Essays, 1966-1985, vol. 12 of The Collected Works of Eric Voegelin, ed. Ellis Sandoz (Baton Rouge: Louisiana State University Press, 1990), 289-90; Order and History, Volume IV: The Ecumenic Age, vol. 17 of The Collected Works of Eric Voegelin, ed. Michael Franz (Columbia, MO: University of Missouri Press, 2000), 408.
  13. Moulakis, Athanasios. (1998). Simone Weil and the Politics of Self-denial. University of Missouri Press. p. 141.

Bibliografia

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  • Vimercati, Emmanuele (2006). "Metaxy". Enciclopedia filosofica. 8. Milano: Bompiani. p. 7384-7385.
  • Hagen, W. (2008). Metaxy: Eine historiosemantische Fußnote zum Medienbegriff', in S. Münker and A. Roesler (eds), Was Ist Ein Medium. Frankfurt am Main: Suhrkamp.
  • Hoffmann, Ernst (1919). "Methexis und Metaxy bei Platon” In Sokrates. Zeitschrift für das Gymnasialwesen, Neue Folge. 7 (73). Jahresberichte des Philologischen Vereins zu Berlin. 45. p. 48-70
  • Navia, Luis E., Socrates, the man and his philosophy, pp. 30, 171. University Press of America ISBN 0-8191-4854-7.
  • Cooper, John M. & Hutchinson, D. S. (Eds.) (1997). Plato: Complete Works, Hackett Publishing Co., Inc. ISBN 0-87220-349-2ISBN 0-87220-349-2.
  • Micael P. Federici, Eric Voegelin The Restoration of Order (2002) ISI Books ISBN 1-882926-74-9
  • Steel, Sean. (2014). The Pursuit of Wisdom and Happiness in Education: Historical Sources and Contemplative Practices. New York: SUNY Press. ISBN 978-1-4384-5213-5ISBN 978-1-4384-5213-5

Leitura adicional

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